Você pode passar a vida inteira sem se preocupar com a tireoide, caso ela seja saudável. Mas a discreta glândula, localizada no pescoço, logo abaixo da saliência conhecida como pomo de adão ou gogó, é da maior importância. Ela produz dois hormônios ; T3 (triiodotironina) e T4 (tiroxina) ;, responsáveis pelo metabolismo do corpo, ou seja, pela forma como o organismo armazena e gasta energia.
Nos últimos anos, o órgão tem sido objeto frequente de estudos ; uma consequência do número crescente de casos de tireoidismo. ;O envelhecimento da população e a maior exposição à radiação e a ondas eletromagnéticas podem ser a causa dessa maior ocorrência. A facilidade de diagnóstico também contribuiu para o aumento de casos;, explica a endocrinologista Laura Ward, professora da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Campinas (Unicamp).
Segundo ela, o uso frequente de produtos químicos, o consumo em excesso de alimentos industrializados, a falta de exercícios físicos e o pouco consumo de iodo (no Brasil, presente no sal de cozinha) são hábitos que contribuem para desenvolver problemas de tireoide. ;Pequenos nódulos na glândula, porém, são comuns com o envelhecimento. Devem ser investigados, mas, geralmente, são benignos;, diz Laura. Uma pesquisa coordenada pela sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolismo (SBEM) revela que 60% da população brasileira apresentam esse tipo de alteração, porém apenas 5% têm tumores malignos. O tratamento consiste no monitoramento do distúrbio e uso de medicamentos.
Diagnóstico subdimensionado
No Brasil, estudo realizado em 2007 pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e publicado na revista Clinical Endocrinology mostrou que 12,3% das mulheres brasileiras com mais de 35 anos têm hipotireoidismo. Outro dado preocupante é a falta de diagnóstico: estima-se que cerca de 5 milhões tenham o problema e não saibam (cálculo com base em compilação de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A apresentadora Sabrina Sato, por exemplo, descobriu por acaso que possuia um distúrbio na tireoide. Chegou-se a falar em nódulo, em cirurgia, mas ao final a assessoria dela informou que a ex-BBB é portadora de hipotireoidismo.
A funcionária pública Leila Maria da Silveira, 52 anos, convive com uma glândula preguiçosa, com baixa produção de hormônio, desde 2002. Ao voltar das férias de verão, depois de uma temporada na praia, Leila passou a sentir cansaço, indisposição, dores pelo corpo todo. ;Fiz uma maratona indo a oito médicos. Cheguei a receber até um diagnóstico de fibromialgia;, conta a moradora da Asa Sul.
A professora adjunta de endocrinologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Gisah Amaral de Carvalho, explica que, na fase inicial do hipotireoidismo, os sintomas são inespecíficos e aparecem de forma insidiosa, ou seja, os sintomas são discretos. ;Por isso, na maioria dos casos é de diagnóstico contraditório. Porém, um teste simples de sangue, o de TSH, é capaz de medir os níveis de hormônios tireoidianos e detectar a doença;, esclarece a médica. Leila só descobriu o distúrbio ao fazer o exame.
Gisah também alerta que metade dos pacientes com hipotireoidismo também apresentam sintomas depressivos. Segundo ela, os hormônios T3 e T4 agem nos sistemas noradrenérgico e serotoninérgico, que são importantes para o humor e também para memória, raciocínio, libido, sono-vigília, entre outros.
Ainda segundo a médica, o hipotireoidismo resseca a pele e torna os cabelos secos, com queda acentuada, as unhas fracas e irregulares. ;O intestino fica preguiçoso, assim como todo organismo: os movimentos, os pensamentos e os reflexos ficam mais lentos, o coração bate mais devagar. Há tendência a ganho de peso porque o paciente se movimenta menos e pode reter líquido. Ao contrário, existe também o hipertireoidismo, que acelera todo metabolismo;, afirma a endocrinologista.
A endocrinologista Laura Ward, da Unicamp, informa que o hipotireoidismo é até cinco vezes mais frequente na mulher do que no homem. Isso ocorre por causa das alterações hormonais causadas na gestação e no período da menopausa. A médica reforça que o impacto do hipotireoidismo na vida do indivíduo está associado também com o aumento de colesterol e lipídios sanguíneos que levam à doença coronariana isquêmica e, daí, o maior número de infartos, acidentes vasculares cerebrais e outras doenças.
Apesar da gravidade, a pessoa com hipotireoidismo consegue normalizar os índices de hormônios e levar a vida normalmente, sem nenhum sintoma, fazendo uso de medicação contínua que faz a reposição do hormônio T4. Gisah salienta que, apesar de simples, a adesão ao tratamento ainda é um complicador. ;As pacientes se sentem mal por depender de alguma coisa para a vida toda;, afirma. A dosagem varia de acordo com o peso e o nível de TSH, indicada pelo endocrinologista.
Leila, por exemplo, ingere diariamente 75ml do hormônio tireoidiano e mantêm o hipotiroidismo sob controle. A executiva Luciana Cavalhero segue o caminho inverso: não toma nenhum medicamento para controlar os níveis de T4. Ela é portadora da síndrome de Hashimoto, uma doença autoimune, ou seja: provocada pelo próprio organismo. Pela manhã, a tireoide produz hormônios em excesso. À noite, a produção baixa. Ao longo do dia, a média sempre está abaixo do nível normal, levando aos sintomas do hipotireoidismo.
;Sinto muito cansaço e sonolência durante o dia;, conta Luciana, que desistiu da medicação depois de várias tentativas de acerto de dosagem. Além da indisposição, ela também paga o preço de estar acima do peso: 106 quilos para 1m76 de altura. O cabelos e as unhas também exigem cuidado redobrado. ;Nos finais de semana, aproveito para dormir e ir à manicure;, brinca Luciana. ;Meu sonho é fazer tudo à noite, quando o meu corpo funciona a todo vapor;, revela.
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