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O apoio necessário

O diagnóstico de câncer de próstata costuma ser um baque para a autoestima masculina. Nessas horas, o apoio da mulher e da família é fundamental

postado em 10/06/2011 12:50

O checape anual do auditor Marcos Almeida, 52 anos, trouxe uma surpresa em 2010. Seus níveis de PSA (HIPERTEXTO), ingrediente do semên produzido pela próstata, estavam acima do normal, o que fez o alerta soar. ;Fui ao urologista, mas o exame não encontrou alterações na próstata que indicassem câncer. Tomei durante 15 dias um medicamento contra inflamação, mas os níveis não mudaram;, lembra.

Uma biópsia então comprovou o que era temido: ele estava com câncer. ;Fiquei muito tenso, porque essa doença é o calo de todo homem.; Porém sua tensão foi aplacada pela presença constante da sua esposa, a enfermeira Deborah Tavares, 48 anos, que esteve e está ao lado do marido em todos os estágios da enfermidade. ;Uma tia dele me disse uma vez: ;O bom de envelhecer junto é ter com quem lembrar os bons momentos;. Me apeguei a isso e fiquei com ele o tempo todo, dando apoio;, conta Deborah.

O casal Marcos Almeida e Deborah Tavares discutiu o problema com transparência e cumplicidadeSe um diagnóstico de câncer já assusta qualquer um, o de próstata gera ainda mais insegurança. O tema ainda é tratado como tabu, sobretudo no que se refere à manutenção da potência sexual do paciente. Ter o apoio da esposa nesse momento é de suma importância. ;O câncer de próstata tem de ser encarado como um problema do casal, especialmente por conta desses mitos que envolvem a vida sexual do paciente;, afirma o consultor Ewaldo Endler, presidente da Associação pela Saúde da Próstata.

De acordo com ele, o fantasma da impotência torna a carga emocional do câncer ainda mais aguda. ;Por isso, recomendamos que o casal vá junto a todas as consultas, para que os dois saibam o que é a doença e quais os seus riscos.; No caso de Marcos Almeida, que sempre se preocupou com a saúde e teve um diagnóstico precoce, não houve qualquer consequência. Seu câncer estava localizado, o que justificou a cirurgia para retirar a glândula.

;Terei de fazer algumas sessões de radioterapia, mesmo após a cirurgia, porque o médico acredita que será melhor para que o câncer não volte. Mas tenho fé e o apoio da Deborah;, conta Segundo o coordenador de pesquisa clínica em oncologia do Hospital Israelita Albert Einstein, Oren Smaletz, quando a doença se concentra apenas na próstata, as chances de cura são mais altas. ;Quando eles já chegam com câncer em metástase, a cura é apenas virtual. Entre aqueles que têm câncer de próstata, 30% a 40% terão doença na forma metastática.;

É essa última perspectiva que afeta a autoimagem masculina de forma mais nociva. O tratamento primevo para os que já têm câncer em metástase é a hormonioterapia, que inibe a produção de testosterona e é eficaz em 30% dos pacientes, por mais ou menos dois anos. Apesar de garantir a sobrevida, sem testosterona não há libido, e isso pode ser um agravante no relacionamento. ;Nessa hora é que a mulher precisa ter paciência e um amor especial, já que, em geral, o homem não tem relações sexuais;, diz Antônio Buzaid, chefe geral do Centro Avançado de Oncologia do Hospital São José.

Os problemas psicológicos, como depressão, tornam-se comuns, o que reforça o papel da companheira. O aposentado Edgard Silva Pinto, 58 anos, teve de lidar não só com a notícia do seu problema ; o pai já havia morrido da doença e a perda do irmão ocorreu dois meses antes de receber o próprio diagnóstico. ;Foi uma situação terrível, porque já estava abalado. E tudo parecia bem, até meus níveis de PSA estavam dentro do normal;, conta. Edgard hoje tem certeza: se não fosse a mulher, a administradora Emília Silva Pinto, 54, ele não teria começado o tratamento. ;Talvez nem estivesse vivo. A participação dela é essencial para que eu esteja aqui.;

Emília conta que, desde que as três filhas eram pequenas, todas as decisões da casa surgiam de reuniões familiares. Dessa vez, deu-se o mesmo, só que sem a presença do pai. ;Cheguei para elas e disse: ;Não vamos chorar nem nos desesperar. O mais importante nesse momento é a união da família;;, recorda. Com 35 anos de casados e oito lutando contra o câncer do marido, Emília diz que já viu esposas que não compreendem o problema e deixam de lado uma relação de anos. Em vez disso, a administradora garante que se valeu da dor tornar a família ainda mais unida. ;Foi uma vida que construímos juntos e não será uma doença que vai destruir;, arremata.

Há no mercado medicamentos capazes de melhorar o cotidiano de pacientes em estágio avançado. Em 2004, foi lançado o docetaxel (vendido com o nome fantasia de Taxotere), com a promessa de uma sobrevida de 20% a 24% maior. Neste ano, o tratamento evoluiu, com a chegada do Cazabitaxel (comercializado com o nome fantasia de Jevtana), um inibidor dos microtúbulos responsáveis pela mitose das células cancerígenas e que reduz ainda mais o risco de morte nesses casos. ;Tentamos dar todas as informações aos pacientes, para que eles escolham se querem mudar o tratamento, mostrando os benefícios de cada medicação;, explica o oncologista Fernando Maluf, chefe da Oncologia Clínica do Hospital São José.

Um problema do casal
Um dos efeitos colaterais dos tratamentos contra o câncer de próstata é a impotência sexual. Tanto na cirurgia de retirada, que pode atingir nervos que controlam a ereção, quanto na hormonioterapia, que inibe a produção de testosterona, o paciente acaba não conseguindo mais manter o pênis ereto. Essas disfunções também podem acontecer de outras formas e, nesses casos, a compreensão da esposa é ainda mais necessária.

O urologista João Abdo afirma que as reações da mulher são muito variadas. Assim como o homem, elas também colocam o sexo como parte fundamental da relação e, quando o parceiro apresenta alguma disfunção erétil, muitas se sentem responsáveis, acreditando que deixaram de ser interessantes para seus maridos. ;Algumas também pensam que o companheiro mantém outro relacionamento.; O grande problema é que, nesses momentos, a vergonha dos homens é tamanha que as companheiras acabam não sabendo o que está ocorrendo de fato.

Abdo é enfático: disfunção erétil é um problema do casal e tem de ser enfrentado junto. ;Quando os dois se retraem e não falam sobre o assunto, o homem não divide o sofrimento e isso pode agravar a situação, já que retarda o diagnóstico.; O médico explica que o componente psicológico, nesses casos, pode ser tão perigoso quando o problema físico. Por isso, segundo o urologista, a presença da parceira é imprescindível. ;Ao procurar o médico, ele pode descobrir outras doenças que o fazem ter a disfunção, como diabetes, hipertensão e câncer de próstata. Por isso é necessário discutir.;

De acordo com o estudo Mosaico Brasil, a maior pesquisa sobre sexo e afeto já realizada no país, mais de 50% dos brasileiros acima de 40 anos tem algum grau de disfunção erétil. ;Só é preciso lembrar: falhar eventualmente não significa que o homem esteja impotente;, assegura Abdo.

O teste padrão
O PSA é um ingrediente do semên produzido pela próstata e suas taxas são normais no sangue. Para detectar alterações é feito o teste antígeno prostático. Caso sejam constatadas alterações, quer dizer que a glândula está alterada e o médico deve recomendar mais exames para determinar o tratamento. Em um homem saudável, as taxas normais são:

2.5 mg/ml para homens entre 40-50 anos.
Até 4.0 mg/ml para homens entre 50-60 anos.
Nível de PSA maior que 4.0mg/ml pode indicar câncer de próstata.

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