postado em 27/11/2011 08:00
Sua casa pode ser totalmente sustentável. Os gastos para tornar isso realidade adicionam meros 7% ao preço final do imóvel pronto. E o investimento rapidamente se paga: com economia de energia elétrica, por exemplo. Para entender essa conta e outras que tornam o lar ecologicamente correto, a Revista conversou com as arquitetas Ana Maria Nicoletti e Darja Kos Braga, da Ambiente Eficiente Consultoria, uma empresa encubada na Universidade de Brasília que trabalha com eficiência energética e conforto ambiental em edificações.O que podemos considerar como uma casa sustentável?
Darja Kos Braga: Uma casa sustentável, no que toca o projeto arquitetônico, é aquela adaptada ao clima de Brasília. Que é de altas temperaturas durante o dia e mais amenas à noite, com época fria, insolação e chuvas muito fortes. Mas o que observamos é que muitas casas não são adaptadas a esse clima. Pegam padrões que vêm de climas temperados, com muito vidro, sem beirais para sombrear as fachadas. Isso origina uma casa que fica mais fria à noite e quente nos dias de calor. O nosso principal foco é o conforto térmico, luminoso e a eficiência energética, que é decorrente disso. Porque, se a casa é muito quente, as pessoas vão pôr ar-condicionado, aumentando o gasto de energia sem precisar.
Brasília, com suas superquadras, é uma cidade arquitetonicamente sustentável?
Darja: O meu tema de mestrado foi o conforto térmico em edifícios residenciais no Plano Piloto. O que descobri é que os edifícios mais antigos são melhores do ponto de vista térmico. Por várias razões. Os edifícios mais antigos normalmente têm paredes mais robustas, o que melhora esse desempenho. Muitos apartamentos são vazados, melhorando a ventilação. Muitos deles tem brises, que são proteções solares que amenizam a entrada de radiação direta e aquecimento. Há também o fato de que, na Asa Sul, há mais vegetação de grande porte, o que melhora o microclima da quadra, algo que não acontece tanto na Asa Norte e menos ainda no Sudoeste.
Há como esses prédios serem adaptados a um padrão mais sustentável?
Ana Maria Nicoletti: Podemos fazer um processo chamado retrofit nos envoltórios das fachadas, dando mais possibilidades de aprimorar o desempenho térmico. Também pode ser feito um estudo para a colocação de brises, películas solares, vidros especiais. Em alguns casos, podemos aumentar a alvenaria, o peitoril por dentro da fachada, de modo a reduzir o percentual de abertura. Isolamento de cobertura também ajuda, já que a carga térmica incide tanto na fachada quando na cobertura, que normalmente não tem isolamento. E também trabalhamos com a vegetação.
As construtoras já sabem que podem lucrar com projetos sustentáveis? Ou elas apenas querem passar a imagem de que estão preocupadas com esse aspecto?
Ana: Já existem políticas públicas que induzem ao uso racional da energia elétrica. E muitos orgãos públicos e construtoras com consciência ambiental, que diversificam seus empreendimentos. Temos o selo Procel, no Brasil, que etiqueta uma edificação da mesma forma que um eletrodoméstico. Com isso, você garante o conforto térmico e a eficiência energética, que pode dar a edifícios novos até 50% de economia de energia elétrica e, nos existentes, em 30%, em relação ao padrão. Temos também selos de sustentabilidade. Nós trabalhamos direto com as construtoras, não com o cliente em si. Mas ele é o mais beneficiado.
Darja: Percebemos que a maioria das pessoas só quer saber se a construção é nascente-poente ou norte-sul. Falta a elas consciência de outros aspectos arquitetônicos do edifício que ajudam ou atrapalham o conforto térmico, como o percentual de vidro na fachada, se há brises, qual a espessura da parede externa. Mas o cliente não tem noção disso.
O que levou vocês a trabalhar com arquitetura sustentável?
Darja: Na UnB, só há um curso de mestrado que trabalha na área de eficiência energética. Vimos que a maioria das pessoas que fazem o curso ficam no âmbito acadêmico. E há uma carência desse conhecimento no mercado. Essa demanda começa a aumentar, tanto por parte dos usuários, que estão ganhando consciência, quanto por parte das construtoras e incorporadoras que querem se destacar e oferecer produtos melhores. Nós nos unimos para oferecer esse conhecimento, que já existe há muito tempo na academia, mas não estava sendo aplicado no mercado. Nosso desafio é mostrar que isso traz benefícios para a sociedade em geral, que vai gastar menos energia e menos água. Todos ganham.
A mão de obra tem qualificação para trabalhar de forma sustentável?
Ana: O mercado está preparado para construir dessa forma, só que eles não sabem como fazer, que tipo de técnica leva à uma economia de energia. Vidros especiais nós já temos no mercado, mas eles são pouco usados ou usados de forma incorreta. Mas a tecnologia construtiva nós já temos.
Quando uma casa sustentável pode ficar mais cara na sua construção? E em quais aspectos uma casa pode ser sustentável?
Ana: No máximo 7% mais cara, quando tudo é colocado.
Darja: Você pode ser sustentável em tudo. Mas, em relação à eficiência energética, é saber trabalhar bem a fachada e a cobertura, assim como os equipamentos internos.
Qual é a consciência ecológica dos construtores?
Darja: Algumas construtoras percebem que têm que adotar algo de sustentabilidade para se destacar no mercado. A maioria não se preocupa com isso, mas aqueles que querem ser líderes do mercado sim, vêem isso como algo fundamental. Mas a gente vê que elas ainda não sabem exatamente todos os aspectos que podem ser trabalhados. Elas se focam muito na questão da obra sustentável, que é importante, mas muitas esquecem que devem dar atenção ao projeto arquitetônico em si para garantir eficiência energética. A maioria, quando se fala em eficiência energética, entende apenas iluminação e ar-condicionado. Falta a noção de que a arquitetura em si é importante. Não percebem que é um contrassenso ter um edifício todo de vidro, que é uma estufa mesmo, e colocar o mais potente aparelho de ar-condicionado. Se você tiver um projeto adaptado para o clima, pode colocar um aparelho menos potente, bem mais sustentável.