A vida moderna nos deixa estressados, sedentários e, muitas vezes, solitários. Temos a nosso favor a ciência, sempre promovendo novas formas de bem-estar. Os animais domésticos, nossos grandes companheiros, não costumam ter a mesma sorte. Cães e gatos do século 21 vivem trancados em apartamentos, sem espaço para se exercitar e cada vez mais sozinhos. Esse quadro leva os bichinhos à obesidade, à depressão, à agressividade e ao envelhecimento precoce.
Segundo pesquisa realizada pela Purina, empresa fabricante de ração, a obesidade está diretamente associada a uma menor expectativa de vida entre cães. O estudo Life Plan acompanhou 48 labradores retrievers durante 14 anos. Aqueles alimentados corretamente e submetidos a uma rotina de exercícios viveram até dois anos a mais. Esses dados indicam que a longevidade canina não tem segredo: basta que o dono consciente proporcione um dia a dia saudável para o pet.
O fato é que os animais andam muito paradões. Não brincam na natureza e até saem por aí em carrinhos, em vez de colocar as patas no chão. Esse tipo de comportamento não é do instinto deles. ;Isso é culpa dos humanos, que não garantem aos cães espaço suficiente para correr;, aponta Mauro Lantzman, professor do curso de psicologia da PUC-SP e médico veterinário especialista em comportamento animal. Ele destaca que atividade física e dieta equilibrada são mesmo essenciais para a saúde deles.
Quem tem um animal deve ter em mente que ele precisa de atenção e, por isso, deve separar um tempo exclusivo para ele. ;É mais fácil do que os donos imaginam: basta incluir o pet nas atividades do dia a dia;, explica Rachel Rubin, autora do livro Bicho magro, da Panda Books. ;E se você não pratica exercícios, deveria usar o seu bichinho como desculpa: vinte minutos de passeio, dia sim, dia não, já bastam;, conclui Rubin.
Dependendo do nível de agitação do seu mascote, uma brincadeira já preenche a cota mínima de atividades. Jogar bola e lançar frisbee são coisas simples e que não demandam muito tempo. Essas atividades também ajudam na interação social entre donos e bichos. ;Estar em contato com pessoas e o toque humano são superimportantes para o desenvolvimento dos cachorros;, explica Mauro Lantzman. Cães e gatos isolados tendem a desenvolver comportamentos compulsivos, como morder as próprias caudas, e atitudes agressivas.
A decisão de qual atividade física adotar deve ser um balanço perfeito entre os hábitos da família e a raça/índole do cão. Não existe receita pronta. Quem tem uma vida corrida, por exemplo, pode matricular o pet em uma aula de natação. Idosos, os típicos donos de cães obesos, devem escolher algo que se encaixe em suas limitações. Pessoas que moram em apartamento devem levar os mascotes para passear diariamente. Os que moram em casa devem estimulá-los a correr no jardim. Não tenha pudores: entre na onda e perca uns quilinhos ao lado do melhor amigo ; tudo em nome de uma vida mais longínqua.
Kotler, o intrépido velejador
Se tem duas coisas que a servidora pública Patrícia Gatti gosta, elas são esportes e cachorros. Mas eram duas paixões independentes, que nunca se misturaram. O Lago Paranoá, que banha sua casa, é o palco usual das atividades físicas. Barcos, veleiros e pranchas de windsurf são parte da decoração do jardim. Os cachorros, por sua vez, eram companheiros mais caseiros, que alegravam o lar. Isso mudou com a chegada do golden retriever Kotler. O cão dourado de um ano e meio passou a acompanhar Patrícia em suas aventuras como nenhum outro animal havia feito.
Ele começou implicando com os passarinhos que ficam ciscando na grama. Corria atrás deles até saírem voando em direção ao lago. A cena se repetiu muitas vezes. ;Eles faziam a brincadeira para implicar com o Kotler e ele sempre caía;, diverte-se Patrícia. Por isso, ela resolveu ensinar o cão a nadar. Jogava pedaços de pau na água para ele buscar. Não demorou para o golden virar especialista no assunto e ir tão longe da margem que deixava Patrícia preocupada. Ela resolveu presenteá-lo com um colete salva-vidas. O aparato elevou a autoestima bicho, que passou a nadar sozinho mesmo sem estar sendo observado. ;Tive que ficar mais atenta. Quando não estou por perto tenho, tenho que prendê-lo, senão ele pula na água;, conta.
Em um dia de sol, Patrícia resolveu levar algumas visitas para velejar. Primeiro, foi um primo. Que subiu no barco sob o olhar atento de Kotler. Patrícia deu uma volta e estacionou no jardim de casa novamente. Depois, foi a fez de um amigo. Antes de ele ir adiante, o cão cruzou o caminho, deu um pulo e tentou embarcar. ;Resolvi fazer graça e coloquei ele pra dentro. Nós três demos uma bela volta no lago;, relata a dona. Kotler se sentiu à vontade, deixando o vento bater no rosto e observando a paisagem. ;Não mostrou o menor sinal de medo.;
Depois desse primeiro passeio, virou um hábito o cão ir atrás de Patrícia. ;Se ele quer vir, eu deixo. Não vou ficar negando a companhia dele;, diz. O episódio mais impressionante ocorreu no mês passado. A servidora montou a prancha de windsurf e foi velejar. Já muito distante do deck de sua casa é que percebeu a presença inusitada. ;Eu só vi a cabecinha dele saindo da água. Tive que chegar mais perto para ter certeza que era ele. Acabei voltando para casa, porque não consegui colocar ele em cima da prancha;, recorda. É bom ficar de olho, porque, se depender do cão, ele pilota até jet-ski.
Zeus, de sedentário a inveterado nadador
É no espaço estreito da piscina de 1,60m de largura e 1,70m de profundidade que o labrador de sete anos, Zeus, se diverte. Durante o período candango de sol quente e umidade baixa, os banhos e as aulas de natação são um alívio para o cão manso e brincalhão. Mas houve um tempo em que Zeus vivia jururu. ;Depois que ele foi castrado, ficou muito lerdo;, conta o coronel do exército Cláudio Werneck, 82 anos. Sem vontade de sair para passear, ficava boa parte do tempo deitado. Com a falta dos exercícios, Zeus engordou.
À procura de atividades que se adequassem à rotina da família, Carlos colocou o pet na natação, e depois de três meses, é só elogios. ;Além do emagrecimento, melhorou o comportamento, melhorou a agilidade e ele está mais sociável;, conta. Desde então, o dono acredita que o fato de o cão não ficar mais doente pode ser atribuído às aulas.
;Os exercícios contribuem para o bom funcionamento do aparelho cardiorrespiratório e fortalecem a musculatura e as articulações. Na água, não há impacto, evitando os traumatismos;, explica o médico veterinário João Carlos Colombo, dono de um estabelecimento que oferece natação para cães. Além disso, a amizade entre o pet e o dono só tem a ganhar. ;Essas brincadeiras na piscina aumentam a relação de carinho e amizade entre os cães e seus proprietários e ajudam na socialização com outros cães;, enfatiza o especialista.
Qualquer raça, a partir dos quatro meses de idade, pode participar da natação, mas é essencial o acompanhamento para que ele não se afogue ou fique assustado com o novo ambiente. A agitação ao entrar na água, geralmente ocorre nas primeiras visitas, como no caso do labrador Rex, de seis meses. Jogando água para todos os lados, parecia querer ir embora, mas bastaram alguns minutos na companhia da treinadora Roberta Salvador Rosa para que o pet se tranquilizasse. Roberta também acredita que os cães mudam quando saem da natação: ;Eles saem bem relaxados, bem felizes;.
Para aqueles casos em que o animal sofreu algum trauma na água, um afogamento, por exemplo, o médico veterinário João Carlos Colombo dá algumas dicas para afastar a experiência negativa. ;Devemos fazer com que a piscina se torne um local de brincadeiras agradáveis. Com a piscina vazia, vamos atrair os cães com petiscos e brinquedos, preenchendo a mente do animal com lembranças agradáveis dentro da piscina. Lentamente, ele esquecerá as recordações negativas. Assim, vamos lentamente, adicionando água na piscina;, detalha.
As aulas podem variar de 50 a 60 minutos, mas são os sinais que o animal dá durante os exercícios que indicam qual o tempo adequado. ;Além de cachorros, gatos também podem praticar natação, mas com a água ligeiramente aquecida;, esclarece Colombo. As brincadeiras dentro da água também podem dar lugar à fisioterapia, indicada para quando o bichinho já está mais velho e precisa fortalecer a musculatura ou, ainda, quando ele precisa se recuperar de alguma cirurgia ou lesão. Depois de tantos resultados positivos, Carlos Werneck pensa em trazer outro cão para a modalidade, e alegra-se com a nova disposição de Zeus. ;Ele mudou. É outro cachorro.;
Na edição impressa, leia a íntegra da matéria, conhela a história de outros pets que mudaram a vida por meio dos exercícios e saiba como iniciá-los na vida fitness.