Juliana Contaifer
postado em 02/12/2012 08:00
Já não somos mais assim tão jovens. Se as contas dos especialistas estiverem certas, em poucas décadas os idosos serão maioria. Nos últimos anos, o país absorveu avanços importantes da medicina e os casais passaram a optar por uma prole menor. O resultado ficou estampado na nossa pirâmide demográfica: os jovens diminuíram em proporção e o número de idosos mais que dobrou entre 1960 e 2010, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Hoje, são 20 milhões de pessoas com mais de 60 anos, o equivalente a 10% da população. Em 2050, serão 64 milhões, oficialmente a maioria: 29,7% do total, taxa próxima à do país com a maior parcela de idosos do mundo atualmente, o Japão.O Brasil está, sim, caminhando rumo à velhice. Mas será que os nossos velhos ; têm ou terão ; a qualidade de vida que merecem? Se a expectativa de vida, que hoje, é de 73,2 anos aumentar, estaremos preparados? Especialistas acreditam que o Brasil poderia estar olhando com lupa a experiência de vida de outros países, que já viveram essa transição de uma população mais jovem para uma mais velha, para garantir que as respostas a essas perguntas sejam positivas.
"Mas a verdade é que ninguém ainda superou essa transição", avalia o demógrafo Kaizô Iwakami Beltrão, professor e pesquisador da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (FGV). "Existem algumas medidas, como aumentar o tempo de contribuição das pessoas para que o impacto na Previdência seja menor, mas elas também não são permanentes. O fato é que o Brasil já deveria ter começado a agir. Quanto mais tarde se tomarem medidas, pior", avisa.
Se o país não analisa o cenário com a profundidade necessária, há quem o faça. Os próprios idosos insistem em fazer seu dia a dia melhor. Aqui, no Distrito Federal, 197.613 pessoas ultrapassaram a barreira da chamada terceira idade. Mais de 15% delas são chefes de família e quase 30% estão ativas e ocupadas, segundo dados da Companhia de Planejamento do Distrito Federal e da Secretaria Especial do Idoso do Distrito Federal. Outros entregaram-se a hobbies, viagens e à convivência com família e amigos para ter uma rotina mais prazerosa, mesmo que tenham lidado com o sofrimento em diversos momentos da vida. Gente como dona Lozinha, Joana, João e Inauri, exemplos que destacamos hoje.
Pé de valsa
Para João Gonçalves, 73 anos, a graça da vida está em dançar. Funcionário público aposentado, sempre gostou muito de ir a bailes. E, há nove anos, resolveu começar a frequentar aulas de dança, de segunda a sábado. "Só folgo aos domingos. Eleva o ego da pessoa, é só alegria, a gente se sente bem demais. Dança é tudo", afirma. João faz aulas de samba de gafieira, forró, soltinho, bolero e zouk, apesar de não se entender muito bem com a última modalidade. Não por falta de treino, só acredita que não leva jeito pra dança sensual.
A família tem grande influência no balanço do corpo de seu João. Os quatro filhos e quatro netos dão o maior apoio às noites dançantes do chefe da família. A mulher, dona Geralda, de 71 anos, não tem condições físicas para acompanhar a dança, mas não reclama das saídas do marido. "Ela não tem ciúme não", garante. Se as aulas de dança não fossem à noite, seu João iria caminhando. A saúde está perfeita e a disposição também. Por conta do perigo de andar no escuro, vai dirigindo seu carro. Em noites de baile, sacoleja na pista até as três da manhã.
Para não perder as aulas, evita até viajar. A dança mudou sua vida. "Eu tinha problemas no coração, câncer de próstata e um problema na perna, que a deixou dura, quase não conseguia dobrar. O médico recomendou que eu fizesse dança ou natação, e eu achei que ninguém ia querer dançar comigo, com a perna dura. Mas no primeiro dia de aula, uma moça me convenceu, deixei a vergonha de lado e, hoje, danço até frevo", lembra. A perna está recuperada. "Não consigo pensar no dia em que terei de parar. Não sou ninguém sem a dança. Foi por causa dela que fiz muitas amizades e melhorei minha saúde. Quando eu estou dançando, não me sinto um senhor de 73 anos. Me sinto um jovem."
Mudança brusca
Segundo dados de 2009 do National Institutes of Health, um instituto ligado ao Departamento de Saúde e Serviços Humanos do Estados Unidos, enquanto a França, por exemplo, levou mais de um século para aumentar sua população com mais de 65 anos de 7% para 14%, o mesmo crescimento deverá levar algo em torno de duas décadas no Brasil, entre 2011 e 2031. A Austrália levou 73 anos, e os EUA, 69 anos até 2013, quando devem finalmente chegar aos 14% de idosos. Na prática, isso significa que o tempo de pensar em soluções e medidas que garantam qualidade de vida e sustentem os sistemas de saúde e Previdência ; que serão mais requisitados ; para essa nova leva de pessoas é escasso. "Estamos vivendo hoje uma situação bomba-relógio. Ainda dá tempo? Dá. Mas já é complicado. O governo precisa ter uma discussão menos ideológica da coisa e olhar para os números. Se começarmos a fazer hoje, talvez a gente ainda consiga se preparar", pondera o economista Gilberto Braga, professor da Ibmec.
Leia esta matéria na íntegra na edição n; 394 da Revista do Correio.