Azulejos são a cara de Brasília. Espalhados por aí, os padrões modernistas de Athos Bulcão se tornaram parte da identidade da cidade. O artista acreditava que a arte devia se integrar à arquitetura e ao cotidiano da capital. Foi nesse ambiente que cresceu o artista plástico João Henrique Cunha Rego, 32 anos. O trabalho inicial era feito em papel, mas, em 2008, um amigo que construía uma casa sugeriu que João Henrique criasse um painel de azulejos. ;Nunca tinha me passado pela cabeça trabalhar com isso de forma profissional, mas aceitei mesmo assim. A partir disso, começaram a surgir encomendas, mas sempre de forma pontual;, conta.
Quando o artista plástico se mudou para um prédio em reforma, teve a ideia de oferecer um painel de azulejos que tivesse mais relação com a cidade. Algo que combinasse com os pilotis e tivesse a ideia de restauração. Assim, a paixão pelos azulejos engrenou. ;Fiz cursos, me profissionalizei e, de 2012 para cá, as coisas começaram a acontecer. A proposta do trabalho é fazer um resgate dessa Brasília antiga, em que o traço da arquitetura e do urbanismo fala alto, e o azulejo funciona como uma moldura, sempre conectado à memória afetiva;, explica. Para João Henrique, a azulejaria não é só um elemento do revestimento, é algo visual, que orna e une arte, arquitetura e decoração.
Ele conta que a relação de Brasília com os azulejos, apesar de bastante próxima, mudou com o passar dos anos. ;Principalmente no comecinho, a ligação era muito forte. Até os anos 1970, era uma azulejaria mais pensada, havia uma preocupação maior com o acabamento e com o resultado final nos projetos. Depois dessa época, virou apenas um revestimento. Muitos pilotis brasilienses têm azulejos que não dizem nada, não têm um suporte artístico. Caiu um pouco no esquecimento;, afirma. João avalia que, felizmente, há uma nova geração de artistas disposta a resgatar o lado artístico do azulejo.
Uma diretriz do trabalho de João Henrique é que um painel nunca vai ser igual ao outro. Ele desenha um azulejo, e o responsável por assentar é quem vai escolher uma disposição aleatória, sem fechar formas ou repetir padrões, como Athos orientava seus projetos. ;É essa capacidade de mudar que dá uma pegada mais artística, uma coisa mais autoral ao meu trabalho;, afirma. No site do artista (jhenrique.art.br), podemos conhecer os 42 modelos desenvolvidos até agora. As inspirações vão desde um dinossauro modernista a uma brincadeira com o número de filhos da mãe e a inicial de seu nome.
A comparação com Athos Bulcão é quase instantânea, e João Henrique não se incomoda desde que fique claro que seu trabalho é um resgate e uma continuação dos clássicos azulejos. ;Acho interessante a comparação, mas não é uma cópia. Não quero ser Athos Bulcão. Meu trabalho é bem mais ingênuo, não tenho a pretensão de ser, pelo menos por enquanto, um artista em um pedestal. A ideia é resgatar a arquitetura da Brasília antiga. Athos era elaborado e refinado, sou mais simples;, explica. A simplicidade dos azulejos de João Henrique pode ser apreciada em dois blocos da Asa Sul. O primeiro, no Bloco F da 203, e o mais recente, no Bloco K da 204.