postado em 10/08/2014 08:00
O investimento em capacitação é um dos maiores aliados nessa empreitada familiar. O empresário Wilson Amaral, 62 anos, relata que o filho ajudava no empreendimento desde a adolescência, mas foi o curso de administração que deu base teórica e ideias para o xará do pai, de 26 anos. Juntos, eles conduzem uma rede de lojas de cosméticos e dizem que o parentesco ajudou a criar uma sintonia maior para desenvolver as atividades. "É uma parceria que deu muito certo, unir a energia dele e a minha experiência. Enquanto eu queria pisar no freio, ele queria inovar. Se não fosse isso, nós, dificilmente, teríamos aumentado as lojas", avalia o pai.
Também formada em administração, Helena Peres, 25 anos, trabalha em uma empresa de construção civil que foi fundada pelo avô, ainda no começo de Brasília, em 1961. O pai, Julio Cesar Peres, 59 anos, é diretor-presidente e engenheiro. Ele considerou que a filha estava apta a se tornar diretora administrativa-financeira após ela ter passado por um treinamento em liderança empresarial. Cada um se dedica às funções de preferência. Ela cuida da rotina no escritório e ele pode fazer o que mais gosta: ir para as obras e acompanhar as construções. No entanto, a condição tem algumas desvantagens e uma delas é a desconfiança em relação à capacidade profissional. "Sempre tem muito preconceito", admite Helena. "Principalmente no começo, você tem que provar a todo momento o profissionalismo, mostrar que é tão boa quanto os outros e que não está lá só porque é filha do chefe."
Mas há ocasiões em que as dúvidas são justificadas. Quando a consanguinidade é o único pré-requisito para conquistar um posto de trabalho, o risco é grande e os negócios costumam enfrentar prejuízos. "São pessoas que têm cargos-chave, mas sem preparo técnico nem comportamental. Assim, a empresa se desenvolve menos", alerta o consultor empresarial Evandro Santos. Ele diz que o problema pode causar retrocessos. "O profissional que não tem parentesco percebe que, por mais que esteja correto, não vai conseguir mudar uma situação ao ir contra o filho do dono e desiste de trazer melhorias."
Os filhos também precisam lidar com as esperanças dos outros. "Meus pais me incentivaram, me deixando livre para escolher. Mas a cobrança, a expectativa é sempre maior", explica Samara de Carvalho, 28 anos, que é violinista e professora do instrumento. "Desde pequena, eu tive contato com o mundo da música. Meu pai é meu grande exemplo." Ela se refere ao maestro Manoel Carvalho, 66 anos, que é saxofonista e clarinetista e atua na Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro e na orquestra de jazz da qual é fundador, a Brasília Popular Orquestra (Brapo).
Samara tem a oportunidade de conviver também com a mãe no trabalho. Por vezes, ela atua como convidada na Orquestra Sinfônica e dá aulas na Escola de Música de Brasília, na qual a mãe, Lilian, trabalha. Foi com ela que Samara aprendeu a tocar piano aos 6 anos de idade. Aos 11, ela conheceu o violino e se apaixonou. A jovem reconhece que teve dúvidas sobre a profissão e chegou a cursar três semestres de estatística. "Eu quis ser diferente, mas, no começo do curso, já estava me formando na Escola de Música e estudando mais sobre o assunto. Percebi que era o que eu gostava mesmo", conta.
A convivência com a mentalidade de diferentes épocas também traz outros desafios. "Tem aquele velho conflito de gerações. Às vezes, é difícil aceitar uma nova maneira para algo que você fez de um jeito a vida inteira", comenta Hilton Medeiros, 59 anos. O pai, de 78 anos, João Eugênio Medeiros, veio para Brasília em 1966, atraído pelas oportunidades da capital. Ele ajudou a montar o serviço de oftalmologia do Hospital de Base e criou a própria clínica, na qual trabalha até hoje com o filho. A proximidade permite que eles discutam os casos difíceis e comemorem juntos o sucesso de pacientes.
Hilton Medeiros frequenta o consultório do pai desde pequeno e admira a vontade dele de se manter atualizado ao estudar diariamente. O filho Felipe, de 20 anos, decidiu também estudar medicina, área que o impressionou. "Para tomar uma decisão simples, é preciso ter uma quantidade de conhecimento muito grande", pondera. Só não aprova a correria da profissão. "Eu quero trabalhar, mas ficar menos estressado." Para o avô, é uma realização ver os descendentes dando continuidade ao trabalho. Na hora das divergências, Hilton Medeiros aponta a solução. "Diálogo é a chave de tudo. Não podemos pensar que somos donos da verdade, temos que estar dispostos a aprender."
O consultor Marlon Amaral acredita que a falta de disposição para ceder e compreender o outro é um dos principais focos de conflitos. "Quanto mais se exercer as artes de conversar e respeitar as diferenças, maiores serão as chances de ter sucesso", indica. O consultor também afirma que a centralização de decisões pode ser a maior força ou fraqueza das empresas familiares. O poder concentrado nos membros da família garante maior agilidade na tomada de decisões, principalmente nos momentos de crise. Mas a centralização excessiva dos controles pelos proprietários pode ser prejudicial, pois é possível haver funcionários mais capacitados para determinadas ações. "A mesma característica que ajuda uma empresa familiar a crescer e a se sobressair é a que a impede de expandir e prosperar no mercado", afirma Marlon. Cabe aos pais e filhos decidirem qual rumo tomar.