Você pode delirar, ter alucinações, ataques de pânico, náuseas e vômitos. Você pode desenvolver transtornos alimentares, como a anorexia. Pode ter convulsões, alterações de humor, crises de ansiedade. Em casos extremos, a depender do comprometimento dos órgãos, você pode até morrer. Você também será privado de um prazer momentâneo, que, por vezes, é o único conhecido e reconhecido, e isso causa dores, inclusive físicas. Se você sofre de alcoolismo e tem plena consciência disso, já sabe: parar de beber não é apenas uma decisão dificílima a ser tomada; é também uma prova de resistência.
Todos os sintomas listados aí nesse primeiro parágrafo são apenas alguns dos diagnosticados durante o período de abstinência, que muitas vezes, em maior ou menor grau, se segue à escolha consciente de desintoxicar o corpo. Normalmente, esse momento chega depois de duros embates e traumas que se prolongam por anos a fio. O dependente de álcool adoece o corpo e o espírito; também arrasta consigo a própria família. Por vezes, causa danos irreparáveis. Não é mensurável o tamanho desse sofrimento, apesar de haver estatísticas que permitem medir o tamanho do problema.
O Ministério da Saúde contabilizou, no ano passado, 60.901 internações hospitalares no Sistema Único de Saúde (SUS) por transtornos decorrentes do uso de álcool. A boa notícia é que está caindo, numa média de 5% ao ano. O governo credita essa redução à expansão da Rede de Atenção Psicossocial, sobretudo ao aumento da cobertura da atenção básica e aos atendimentos nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs). Mas, nos últimos 10 anos, a média anual de procedimentos ambulatoriais por problemas associados ao álcool foi de 906 mil. Não é pouca coisa.
Quem consegue vencer as intercorrências e ficar definitivamente longe do álcool sabe a diferença entre estar abstêmio e ser, finalmente, sóbrio. Entende que o vício é uma coisa, e a doença, outra. Que a bebida levava ao prazer, ainda que durasse pouco. Mas a falta dela pode levar à felicidade. O diretor vice-presidente do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), Odacir Klein, ex-ministro dos Transportes, é uma dessas pessoas. Há 12 anos, parou de beber. Ainda é pouco se comparado aos 20 anos, entre os 40 e os 60 anos, em que viveu regido pelo álcool. Começou a beber ainda adolescente, mas foi nessa fase da vida que a situação se agravou. O que ocorreu nessas duas décadas foi tão devastador que hoje prefere manter no passado, uma forma de aliviar as dores, sobretudo da família.
![Os piores momentos de quem abandona o vício em álcool estão associados à abstinência. Porém, quem persevera tende a ingressar em um novo patamar de autocontrole, sem as dolorosas ânsias. Estamos falando de sobriedade](https://imgsapp2.correiobraziliense.com.br/app/noticia_127983242361/2016/06/21/537174/20160621153111845080e.jpg)
Foi dispensado da terapia há alguns anos. Mas tem seus apoios. "A religião me faz ter a certeza de que, como não posso recuperar os prejuízos que causei aos meus semelhantes quando bebia, preciso ser solidário e generoso em grande escala para, na contabilidade da minha vida, compensar os débitos daquele período." Nesta reportagem, ele, outras pessoas que sofrem de alcoolismo e médicos nos ajudam a entender melhor a sobriedade, que é diferente do ato de parar de beber.