Revista

Um saco cheio de generosidade

A gestora de eventos Ana Flávia Coelho enfrentou duas vezes o câncer de mama e cria um projeto para ajudar outras mulheres com a mesma doença e menos sorte que ela, diagnosticada precocemente

postado em 26/03/2017 08:00
Perfil

Um saco cheio de generosidade

A gestora de eventos Ana Flávia Coelho enfrentou duas vezes o câncer de mama e cria um projeto para ajudar outras mulheres com a mesma doença e menos sorte que ela, diagnosticada precocemente

Por Marília Padovan *
A gestora de eventos Ana Flávia Coelho enfrentou duas vezes o câncer de mama e cria um projeto para ajudar outras mulheres com a mesma doença e menos sorte que ela, diagnosticada precocemente
Ela trabalhava demais, com prazer de quem faz o que ama. Vida agitada, marido, dois filhos; Mas sempre com um sorriso no rosto. Essa era a rotina da gaúcha e gestora de eventos Ana Flávia Coelho, 53 anos, antes da reviravolta que mudou sua vida. Foi em 2008, em uma sessão de massagem, que surgiu a estranheza: um caroço na mama. Apesar da displasia mamária, ela investiu em exames que não apontaram qualquer coisa errada. Poucos meses depois, o tal carocinho começou a aumentar de tamanho e, após quatro meses, na terceira ou quarta etapa de exames, foi possível notar um excesso de vascularização na área. Seu médico, então, pediu que uma biópsia fosse feita e o resultado foi confirmado: câncer de mama.

Mesmo assustada com a notícia, Ana Flávia ficou calma e decidiu manter em segredo a descoberta da doença até a proximidade da cirurgia de retirada do seio. O marido foi o único que acompanhou, desde o início, a caminhada dela. Os filhos, João e Nina, na época com 15 e 14 anos, respectivamente, só souberam da gravidade do problema na semana da operação. Muito forte e durona, ela quis poupar a família para que não se abalasse com a situação. Mas o que Ana Flávia não imaginava era que a família poderia ser uma grande aliada nos momentos de desamparo. ;Você quer poupar as pessoas porque acha que dá conta sozinha, mas não dá. É um processo de solidão e você precisa do apoio de quem te ama.;

Casados há quase 32 anos, o advogado Luiz Filipe Coelho conta que a mulher sempre muito tranquila e alegre, lidou com a situação de maneira firme e digna, o que facilitou também o papel da família. ;Apesar do medo, ela quase não se deixava abater. Tínhamos em mente que o desfecho ruim não chegaria. Era somente uma fase que teríamos que superar.;

Para ter mais segurança, as duas mamas foram retiradas, mas, dois meses depois, o resultado da biópsia apontava uma margem comprometida, ou seja, o câncer poderia não ter sido retirado por inteiro e seria feita uma segunda cirurgia. Nesse momento, o medo atacava novamente. Ana Flávia confiava firmemente no médico que realizou o procedimento, o mesmo que tinha feito uma grande raspagem.

Assim, ela seguiu recuperando a força dos braços que, durante a cirurgia, foram afetados devido aos dois tendões dos ombros terem sido rompidos, em consequência das nove horas com os braços, levantados na mesa cirúrgica. Após três anos de fisioterapia, a conquista esperada ; Ana Flávia poderia voltar às quadras de tênis, uma de suas grandes paixões.

Depois de se recuperar totalmente, sempre feliz e amante de viagens, a gestora de eventos foi a Nova York a turismo e, durante um passeio de bicicleta, sentiu uma dor horrível no quadril. Quando voltou ao Brasil, descobriu a osteonecrose (suprimento interrompido de sangue para o osso, ocasionando a queda da cabeça femoral). A doença, que é característica de idosos, pegou todos de surpresa novamente, mas Ana Flávia estava pronta para operar a perna e voltar a sua vida normal novamente.

Com a cirurgia marcada para maio de 2015, ela pediu para que seu médico acrescentasse um pedido de mamografia na bateria de exames pré-cirúrgicos, já que havia alguns meses que não a fazia. Nesse exame, o choque: foram descobertos três novos tumores minúsculos na mama de Ana Flávia. A cirurgia para reparar a osteonecrose foi cancelada e, naquele momento, surgiu uma maneira diferente de encarar a doença.

Tranquila por já ter passado pela mesma situação anteriormente, o pensamento se manteve sempre positivo. ;Eu tinha em mente que achamos o câncer no início, o que faz total diferença, e assim seria possível operar e ficar tudo bem de novo;, comenta. Na visita ao oncologista, Ana Flávia e o marido receberam a notícia de que o câncer era superinvasivo e perigoso. O encaminhamento para a quimioterapia foi imediato para evitar a metástase, mas, mesmo arrasada com a descoberta, a família teve forças e esperança para superar mais essa etapa. ;Por mais que não seja algo legal, é bom pensar que há tratamento. É ali que fica aquela pontinha de esperança, de energia positiva que a gente tira o ânimo para o tratamento e todo o resto;, relembra.

No início, a espera para saber qual seria o efeito do tratamento. Depois, a surpresa de se enxergar em uma posição diferente, precisando da ajuda dos outros. Aprender a não ter controle da situação foi algo novo para Ana Flávia. Os enjoos e a imunidade baixa a impediam de fazer suas tarefas. Sua nova rotina era ficar em casa esperando a recuperação. ;Nunca soube pedir favor para ninguém e esse era um defeito que eu tinha. Mas, quando você não consegue se levantar da cama para ir ao banheiro ou fazer xixi, por exemplo, você precisa de uma pessoa. Eu me vi em certas situações em que soube enxergar como é bom saber pedir ajuda. O tempo todo, a sensação de gratidão tomava conta de mim.;

O marido ressalta a determinação da mulher, que lutava contra o câncer e convivia também com o problema na perna, que lhe causava muitas dores. ;Ela assumiu muito bem a situação. Sempre firme!” Quando os cabelos começaram a cair, a única parte ruim era imaginar que aquilo estava sendo imposto à Ana Flávia, porque, aos olhos do marido, a beleza da mulher continuava a mesma. ;Ela sempre foi muito bonita e, mesmo careca, continuou lindíssima. Alguns sugeriram que ela usasse turbante ou peruca, mas ela logo dispensou os acessórios. Ser muito destemida e cheia de energia fez com que superasse tudo muito bem;, completa Luiz Filipe emocionado.

A administradora Edilene Gravia é amiga de Ana Flávia desde a adolescência, quando se conheceram na aula de teatro. ;Temos um pequeno grupo de amigas que são muito cúmplices umas das outras. Para mim, ela é uma fonte de inspiração por ser essa pessoa tão corajosa ,que nunca se deixou levar pela doença. Apesar de ter sido uma fase difícil, vimos a Ana Flávia superando tudo de maneira muito forte.; Para ela, Ana Flávia sempre foi uma mulher autêntica e confiante, e os desafios superados ajudaram a fortalecer essas qualidades.

Sempre muito ativa, nos meses parada em casa, Ana Flávia começou a sentir o tédio tomando conta de seus dias. Não conseguia trabalhar nem sair de casa por causa da imunidade baixa. Seu único pensamento era: ;Ai, que saco! Não consigo fazer nada;. Foi assim que surgiu uma ideia para ajudar a passar o tempo. Ela começou desenhar em seu tablet diferentes sacos para organização. Nos dias em que não estava se sentindo mal, desenhava sem parar e conseguiu dar vida a 15 coleções diferentes de saquinhos. Entre eles, os para guardar vinho, para guardar as coisas do cachorro, para levar nas viagens e para fazer ginástica.

A pergunta final era: o que fazer com todos esses sacos de organização? Com o pensamento de empreendedora, Ana Flávia viu a oportunidade de criar um negócio que abriria portas para ajudar uma causa que estará sempre presente em sua vida. Foi quando fez um site para vender os produtos e arrecadar lucros para associações que cuidam da prevenção do câncer de mama em mulheres sem condições financeiras para arcar com os gastos do tratamento.

Assim nasceu, no começo de 2016, a Ai, que saco. Tendo em mente a importância do diagnóstico precoce, o projeto auxilia institutos que atuam na divulgação dos exames preventivos. No início, Ana Flávia doou todo o lucro do seu projeto para a Associação Brasiliense de Apoio ao Paciente com Câncer (ABAC), que paga os exames de imagem (mamografia, ultrassom e biópsias) na rede privada para mulheres carentes. O intuito deles é antecipar o diagnóstico para futuro tratamento ou cirurgia nos hospitais públicos.

Agora, a ideia é ampliar o número de vendas para que a marca Ai que saco! possa pagar pelos próprios gastos de produção e ainda sobrar lucro para ajudar as instituições. Recuperada do câncer e com o mesmo sorriso no rosto, Ana Flávia vibra com a proposta. ;Estou animadíssima! É algo que faço com muito carinho e fico feliz com os resultados. Quanto mais a gente vender, mais vamos ajudar!”

A amiga Edilene é cliente assídua da marca e acredita que, além de ajudar na causa, o projeto ainda se propõe a organizar as coisas de forma divertida e bonita. ;Gosto de tudo muito organizado, então, é algo ótimo para mim. Você tem fácil acesso e é menos tempo perdido procurando algo ou combinando coisas demais.; E completa: ;Tenho presenteado amigos com essas coleções, pois é incrível e completamente útil para várias situações. Além disso, são saquinhos muito elegantes e de muita qualidade também;.

* Estagiária sob a supervisão de Flávia Duarte

SERVIÇO
Para ter acesso aos produtos da Ai que saco! basta acessar a página .
O site está com um bazar e, em março, lança nova coleção.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação