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Prevenção faz toda a diferença na cura do câncer de mama

Chances de cura chegam a 95% com o diagnóstico precoce e despencam para 50%, se tumor demorar a ser descoberto

Amanda Ferreira - Especial para o Correio, Marília Padovan - Especial para o Correio , Renata Rusky
postado em 29/10/2017 08:00
O mês de outubro chega ao fim, mas os alertas quanto ao diagnóstico precoce do câncer de mama prevalecem. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), trata-se do tipo de tumor mais comum entre as mulheres no mundo e no Brasil, ficando atrás somente do câncer de pele não melanoma. O número de casos cresce de 5% a 10% ao ano. Quando diagnosticado precocemente, a chance de cura é de 95%, mas, se descoberto mais tarde, a taxa cai para 50%.

Todo câncer é caracterizado pelo crescimento rápido e desordenado das células. O de mama é um tumor maligno que se desenvolve nos seios. Relativamente raro antes dos 35 anos, acima desta idade a incidência cresce progressivamente, especialmente após os 50. Por isso, quando a mulher atinge os 40 anos, aconselha-se que exames de rotina, como a mamografia, sejam realizados pelo menos uma vez ao ano.

De acordo com a oncologista Lorena Amaral, do Laboratório Exame, o câncer de mama é altamente curável, em 90% dos casos, se for descoberto no início. ;Quando o tumor é pequeno, existe a possibilidade do tratamento menos agressivo, no qual a mulher não precisa retirar a mama toda, somente o quadrante específico.; Apesar do autoexame de toque das mamas ser essencial quando se desconfia da doença, a médica ressalta a importância da mamografia como forma de detectá-la precocemente.

;Muitas vezes, quando o tumor já é palpável, a cura se torna mais difícil e complicada. Dessa forma, o checape é primordial.; Por mais difícil que seja encarar a jornada trazida por um tumor, cercar-se de pessoas queridas pode servir como grande motivação. ;A mulher deve estar confiante na cura e no tratamento que está sendo realizado. O apoio da família é fundamental nesse processo;, orienta Lorena.

Especialista em câncer de mama, o oncologista clínico Eduardo Vissotto, do Centro de Oncologia do Hospital Santa Lúcia, explica que, inicialmente, o câncer de mama é assintomático, mas algumas alterações físicas podem ser indícios do problema. ;Caroços nas mamas ou assimetria das mesmas são alguns exemplos mais comuns, mas secreção mamilar ou gânglios na axila são alguns sinais de alerta.;

O especialista afirma que um nódulo na mama não significa necessariamente a existência do câncer. ;Grande parte dos nódulos mamários são cistos benignos.; As mamas também se modificam naturalmente ao longo do ciclo menstrual. Porém, se notar alterações e sintomas, é essencial consultar um profissional da área.

Vissotto esclarece que antecedentes familiares têm grande influência no surgimento do tumor e que o histórico hormonal da paciente também pode interferir no quadro. ;Menarca precoce, menopausa muito tardia, mulheres que nunca engravidaram ou tiveram a primeira gestação em idade avançada se encaixam nesse perfil.;

Outros fatores de risco estão relacionados ao estilo de vida ; a obesidade e o uso de álcool, por exemplo, são associados ao aumento do risco de desenvolver tumor. Mulheres com risco de ter câncer de mama devem fazer mamografia anualmente, a partir dos 40 anos, recomenda o oncologista clínico João Nunes Neto, do Centro de Câncer de Brasília (Cettro).

Já as mulheres que têm parentes de primeiro grau com histórico de câncer de mama devem começar a fazer mamografias anuais 10 anos antes da idade com que a familiar adquiriu a doença, alerta Neto. Segundo o oncologista, ;o câncer de mama não é passível de prevenção, mas de detecção precoce, que tem uma taxa de cura acima de 98%;.

Recomeço

A check list de Raquel Cordeiro, 42 anos, para os planos de se casar e ter filhos, precisou ser deixada de lado aos 35 anos, depois de um exame de rotina. Na consulta, a ginecologista não identificou nada nos seios dela. Mesmo assim, por curiosidade, a servidora pública insistiu com a médica para que solicitasse uma mamografia. ;Logo no primeiro exame notamos uma alteração, com microcalcificações agrupadas, o que já caracteriza o câncer. Naquele momento, quase não acreditei. Nunca achamos que vai acontecer com a gente;, conta Raquel.

Ela teve sorte. Descoberto no início, o câncer tinha chances de cura elevadas. Foram 15 dias até que Raquel fizesse a cirurgia de remoção e reconstrução da mama esquerda ; em procedimentos seguidos. Ainda assim, a aceitação não foi nada fácil: a moça se viu na obrigação de abrir mão de planos e sonhos para cuidar da saúde. ;Quando descobri, negava e não entendia por que estava acontecendo comigo. No momento em que aceitei, vi que o susto e a insegurança fazem parte de todos nós. Comecei a agradecer pela forma como havia sido e pela oportunidade de poder lutar contra a doença.;

O apoio da família e de amigos foi fundamental. Bons profissionais também acompanharam a caminhada de Raquel. Cirurgia feita, o próximo passo seriam as 28 sessões de radioterapia. Mas o sonho da maternidade não poderia ficar de lado. Ela e o marido ; na época, namorados ;, decidiram, então, começar o tratamento de reprodução assistida e congelamento dos óvulos, que poderiam ficar mais sensíveis e prejudicados após a radiação. O tratamento do câncer terminou em menos de um ano. E, depois de seis anos e duas tentativas, já recuperada, chegou o presente que tanto esperava: ser mãe.

Raquel descongelou os óvulos em 2016 e engravidou. ;O processo não foi fácil, mas a batalha me trouxe a realização do que tanto imaginava.; Hoje, junto às pequenas Carolina e Mariana, de 7 meses, a servidora conta sua história com a alegria na voz de quem superou, com muita fé, o câncer que veio no susto. ;Sempre falo sobre a importância do diagnóstico precoce, ainda mais quando temos algum caso na família. Precisamos pensar mais à frente.;

Quem também teve que lidar com o susto durante um exame de rotina foi Micheli Amorim, 40. O tumor, na mama direita, já estava bastante avançado, em grau 3. Em uma avaliação na outra mama, os médicos constataram que havia muitos nódulos e que a probabilidade de a doença se espalhar seria grande. Em dezembro do ano passado, a supervisora de lojas foi submetida à retirada completa das mamas. ;Na época, morava sozinha com minha filha. Isso me deu forças. Falava para os médicos que não poderia falecer, porque ela precisava de mim.;

A vontade de lutar não deu espaço para a falta de confiança. Micheli se cercou de pessoas boas, energias positivas e apoio de conhecidos. ;Tenho muita história para contar nessa vida. Confesso que hoje encaro a situação com tranquilidade;, diz. Ela reconstruiu os seios e a vida. Hoje, ainda em tratamento, acredita que nada é por acaso. ;Já passei pela quimioterapia e agora tomo vacinas a cada 20 dias para evitar que meu corpo produza proteínas condutoras das células cancerígenas. Sei que é um processo longo, mas tento me manter forte.;

Atenção aos cuidados

A Sociedade Brasileira de Cancerologia dá dicas para a prevenção:
- Realizar pelo menos 15 minutos de atividade física por dia (caminhar, subir e descer escadas são ações simples e benéficas).
- Manter uma boa hidratação (ingerir pelo menos 1,5 litro de água por dia).
- Dar preferência às carnes brancas (peixes são mais recomendados).
- Consumir vegetais de todas as cores.
- Dar preferência ao consumo de vegetais crucíferos, que ajudam na prevenção (couve-flor e de Bruxelas, espinafre, rúcula, brócolis, agrião, por exemplo).
- Abandonar o cigarro e não exagerar no consumo de álcool.

Chances de cura chegam a 95% com o diagnóstico precoce e despencam para 50%, se tumor demorar a ser descoberto Quando o apoio da família não pode faltar

Andrea Garcia, 44 anos, professora de educação física, comemorou o aniversário ontem. No ano passado, deixou passar sem festas. Acabara de descobrir um câncer de mama. Agora, já não é mais a mesma. ;Eu era uma pessoa muito imediatista, queria tudo na hora, era muito certinha, as coisas tinham que ser perfeitas. Estou mais calma, deixo as coisas acontecerem, eu era estressada;, avalia. Ela não decidiu mudar. Aconteceu. A doença lhe deixou a lição de que nenhum aborrecimento vale a pena.

As duas avós de Andrea morreram de câncer de mama. Ela teve melhor sorte. Em julho do ano passado, fez um auto-exame e sentiu um caroço. Pensou que pudesse ser por conta da menstruação e adiou a investigação. ;Sempre fui saudável, me exercitei, nunca arranquei nem um dente. Não esperava por isso;, conta. Além disso, havia feito um checape no ano anterior. Descobriu alguns nódulos, mas, de acordo com o médico, eram todos benignos.

Três meses depois, em outubro, em nova ida ao médico, a doença foi diagnosticada. Não havia metástase, mas o tumor na mama esquerda não era pequeno. Era mais agressivo. A mama direita também tinha células cancerígenas. ;No dia em que a gente descobre, fica muito mal, não sabe o que fazer, é um estresse muito grande. Mas a minha médica, do mesmo jeito que deu a notícia, já trouxe a solução, o que ajudou muito;, relembra.

O apoio psicológico é um fator importante, tanto na descoberta da doença quanto durante o tratamento, afirma a psico-oncologista do Cettro Isabella Gontijo. ;O paciente é encaminhado para avaliação após o diagnóstico, pois é um tratamento em conjunto;, explica. ;Por meio de um ;termômetro de distress; com indicadores como ansiedade, depressão e qualidade de vida, é possível medir o impacto emocional, como o paciente percebe a doença. Dependendo, é orientado a um tratamento psicológico e fazemos um cuidado individualizado.;

Exaustão emocional

De acordo com Isabella, quando a paciente recebe o diagnóstico de câncer, passa por uma sensação emocional desagradável. O distress acontece quando a notícia excede os recursos pessoais para administrar a situação, causando sobrecarga e exaustão emocional. Aparece quando o organismo não consegue se adaptar a uma nova situação. ;Com o devido acompanhamento, com conhecimento e compreensão, ela aprende a superar o estresse e a gerenciar essas emoções;, assegura.

Foi o caso de Andrea, que se mudou para a casa da mãe. Os irmãos se mobilizaram para cuidar dela, uma tia enfermeira veio de São Paulo. ;Muitas mulheres são abandonadas quando descobrem o câncer, e faz muita diferença ter esse apoio. Foi um ano em que muita gente se envolveu e me ajudou;, conta.

Menos de um mês depois do diagnóstico, ela fez a primeira sessão de quimioterapia, e o cabelo, que alcançava a cintura, começou a cair. O intervalo entre as sessões era de 21 dias. Mas, depois de cada uma delas, eram 10 dias passando mal. Acordava vomitando. ;A quimio me castigou muito. Perdi muito peso. Passei por todo o sofrimento que faz a gente querer desistir;, revela. Diante disso, a perda de cabelo pode parecer superficial, mas ela diz que também é uma parte difícil e lembra como os seus alunos se chocaram com a mudança.

Em fevereiro, Andrea passou pela cirurgia e já saiu do centro cirúrgico com as mamas reconstruídas. Só a mama esquerda precisou da radioterapia. Depois, são cinco anos de hormonoterapia, tratamento mais leve. Aos poucos, ela recupera a força física e os cabelos. Na semana passada, fez a primeira aula de natação. Ainda tem dia que não consegue reunir força para abrir uma garrafa. ;Eu achava que ia dar tudo certo, tinha muita fé. Agora, vem a ansiedade para as coisas voltarem ao normal e o medo de ter de novo;, admite.

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