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Desfiles internacionais: tudo sobre a temporada prêt-à-porter

Paris encerra a maratona, que inclui Nova York, Londres e Milão, com bela homenagem a Karl Lagerfeld

Rachel Sabino *
postado em 10/03/2019 07:00

Paris encerra a maratona, que inclui Nova York, Londres e Milão, com bela homenagem a Karl Lagerfeld

Duas vezes por ano, as semanas de prêt-à-porter internacionais pautam o mundo da moda com o que acreditam ser verdade ; seja ela absoluta ou não. Cada uma dessas semanas, em algum lugar do globo, tem seu contexto e função. Nova York está sempre de olho no mercado e coloca novos talentos no mapa. Londres é espaço de experimentação e explora criações conceituais. Milão mantém a tradição ; ou rompe com ela. E Paris enfatiza todo o glamour da moda com os desfiles mais disputados da indústria.

Essa temporada também teve clima de despedida. Dois dias antes do início da semana de Milão, o estilista alemão Karl Lagerfeld morreu, aos 85 anos. Cultuado no mundo fashion, ele recebeu homenagens tanto na Itália quanto em Paris, que encerrou os desfiles na última terça-feira. Veja o que as quatro cidades que ditam a moda do planeta planejam para o próximo inverno.

Nova York, a comercial

A semana de moda americana tem cunho comercial: o objetivo é dar destaque para marcas que estão em busca de um lugar no mercado. Para a próxima estação fria, os americanos apostaram, aparentemente, apenas nisso ; deixaram de lado a oportunidade de se posicionarem, política ou socialmente, em meio a tantos acontecimentos recentes.

Para a maioria, Nova York foi morna, sem muitas novidades. Exceto pela estreia das brasileiras John John e Rosa Chá no line-up de desfiles. As duas marcas, em atual expansão internacional, apresentaram coleções com pegada jovem e esportiva ; tendência que não vai sair de moda tão cedo.

Com o jeans como carro-chefe, a John John (esquerda) apresentou propostas que revisitaram o caráter jovial da marca. O tie-dye é uma delas. Já em clima futurístico, a Rosa Chá (direita) sugeriu o sportswear chique no branco total: monocromia que virou regra para a próxima estação.

Londres, a experimental

Pelo olhar geopolítico, a Inglaterra tem passado por momentos inglórios. Em meio à efervescência das decisões governamentais sobre o Brexit (saída do Reino Unido da União Europeia), a moda inglesa resolveu ir para o lado oposto. Afinal, às vezes, é melhor sonhar do que viver em inquietação.

Os estilistas Richard Queen e Mary Katrantzou soltaram o lápis da imaginação e propuseram coleções escapistas e fantasiosas. Pouco apelo comercial, mas muita consolidação de identidade de marca.

À esquerda, Richard Queen retratou sua paixão por flores e jardins em vestidos românticos e esculturais. Um pouco distante da realidade, criou um clima bucólico para toda a coleção e levou o público a sonhar %u2014 mesmo que por alguns instantes. Mary Katrantzou (direita) teve os quatro elementos %u2014 água, fogo, ar e terra %u2014 como base para criar a coleção. O decorativismo escolhido pela estilista ficou por conta das incontáveis plumas. Assim como Queen, peças irreais, mas sonhadoras.

Milão, a tradicional

A semana de moda de Milão é mundialmente conhecida pela tradicionalidade. As passarelas italianas são carregadas de herança, com um certo quê de inovação. Nesta temporada invernal, a Prada resgatou sua história por meio das peças esportivas. Sob o conceito de dualismo e contrapontos que permearam a coleção inteira, a grife reinventou a Linea Rossa ; sua linha esportiva lançada em 1997. O nylon, material que entrou na Prada em 1984, chegou cobrindo bolsas e casacos altamente utilitários com mood militar. Esse militarismo aparente traduz o que Miuccia Prada quis dizer: em tempos de ódio, corajoso é quem vai à luta defender o amor.

Prada: jaquetas militares se contrapuseram a saias delicadas de renda.

Gucci

Reconhecer a tradição de uma marca também é trazer novos olhares sobre ela. Diferentemente de tudo o que a Gucci estava acostumada a fazer, Alessandro Michele, diretor-criativo da grife, tem transformado o mercado de luxo em seu modo de ver o mundo. Para ele, o futuro é agênero, maximalista e esportivo.

O total white da Gucci não é nada óbvio e inteiramente agênero.

A inspiração para o outono/inverno 2020 veio com ares ingleses, com referências punk (vide os maxicolares com spikes) e com uma alfaiataria repaginada, influenciada pelo streetwear. As máscaras usadas no styling do desfile reforçou o ideal genderless (moda sem gênero) que a marca tem aderido e representou o que Michele argumenta: seja o personagem que você quiser ser e performe no palco que é o mundo.

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Paris, a glamourosa

A semana de moda de Paris é puro glamour. Não à toa, é a mais disputada do circuito. Por lá passam grandes nomes do mundo fashion, como Louis Vuitton, Balenciaga, Givenchy, Valentino e Chanel. Há duas temporadas, a Celine sofreu um baque. Sob a direção de Hedi Slimane, perdeu o acento (antes, Céline), mudou a estética e, para muitos críticos, perdeu o rumo. Contudo, Slimane esteve a postos para ouvir a crítica e, nesta temporada, resgatou o que a Celine sempre buscou.

Em clima vintage, ele revisitou a tendência do óculos aviador, do xadrez (estampa obrigatória para o próximo inverno) e da bota de couro acima do joelho. Tudo muito comercial e de desejo absoluto. Já Pierpaolo Piccioli, da Valentino, quis falar sobre o amor ; e nada mais. Em coleção ultrarromântica e poética (poesias eram citadas na trilha sonora do desfile e trechos foram bordados em barras e mangas de várias peças), o estilista explorou imagens greco-romanas e estampou-as em vestidos.

A mulher que desfilou na Celine (esquerda) tinha caráter setentista: jovem, livre, elegante e contemporânea ao mesmo tempo. Por meio de jacquards romantizados, volumes espertos e peças desejáveis para usar dia e noite, a Valentino (direita) leva ao próximo inverno emoção e leveza.

O adeus do kaiser

Em 19 de fevereiro, a moda ; e o mundo ; perdeu um dos estilistas mais brilhantes e consagrados da história. O alemão Karl Lagerfeld partiu aos 85 anos, 36 deles à frente da grife Chanel. Dois dias depois de sua morte, a Fendi desfilou em Milão em clima saudosista, já que o kaiser (como era chamado) também liderava a grife italiana.


No fechamento da semana de moda parisiense, foi a vez da Chanel prestar homenagem a Lagerfeld. Em um cenário que reproduziu uma vila de esqui, no alto das montanhas, as modelos desfilaram, sobre a neve alta, looks volumosos com inspirações dandistas (em referência ao estilista, que era um dândi por si só), inúmeras peças texturizadas pelo clássico tweed da marca e padronagens xadrezes de todos os formatos e tamanhos.

No bloco final do desfile, visuais todos brancos: um deles vestindo Penelope Cruz, amiga íntima de Lagerfeld, que carregou uma rosa branca enquanto atravessava a passarela fria. Karl Lagerfeld ocupou um lugar de peso, que sem dúvidas Gabrielle Chanel teria orgulho. Quem fica é Virginie Viard, braço-direito do estilista por mais de três décadas e nova diretora-criativa da maison.

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*Estagiária sob supervisão de Sibele Negromonte

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