O segredo da longevidade dos povos banhados pelo Mediterrâneo, em especial dos italianos, que têm a terceira maior expectativa de vida no mundo, vem despertando curiosidade. Para pesquisadores, a resposta pode estar na mesa. Mais do que apenas uma forma de comer, a dieta adotada nessa região é um estilo de vida, que tem como pilares harmonia, inclusão e diversificação.
Entre os inúmeros benefícios apontados por pesquisadores está a prevenção de doenças cardiovasculares. Estudo publicado pela The New England of Medicine mostrou que pacientes com alto potencial de desenvolver problemas cardíacos reduziram significatimente o risco após serem submetidos à alimentação do Mediterrâneo, mesmo que tardiamente.
De acordo com o Professor Daniele Del Rio, da Escola de Estudos Avançados da Universidade de Parma, na Itália, existe uma relação direta entre o comportamento alimentar nocivo ; que inclui, além de produtos industrializados, o uso de tabaco e álcool ; com a perda de anos de qualidade de vida. ;O comportamento mediterrâneo é uma estratégia para balancear essa perda, com o consumo elevado de frutas, aves e peixes, e reduzido de carne vermelha, atuando de forma preventiva contra doenças cardiovasculares, por exemplo;, explica.
Del Rio acrescenta que o fato de a dieta focar na variedade de produtos faz com que ela, além de ter bons resultados, seja mais fácil de seguir. ;Os alimentos funcionais estão muito na moda; porém, nenhum alimento sozinho nos faz ter um aumento de expectativa de vida. Não existem superalimentos, mas, sim, forma de se alimentar saudavelmente.;
Nesse tipo de alimentação, o consumo de nutrientes é feito em porções, havendo cotas diárias, semanais e até mensais, como explica o professor Hugo Ribeiro, do Departamento de Pediatria da Universidade Federal da Bahia. ;Há uma tendência de querer um prato completo, com tudo que é necessário, e isso não é possível. Às vezes, podemos levar dias para conseguir ingerir todos os nutrientes necessários.;
A restrição não se aplica na forma de comer mediterrânea. O lema dela é incluir a maior variedade de alimentos, com ênfase naqueles com maior valor nutricional. Segundo a nutricionista Bianca Neves, esta é uma forma de conseguir levar em consideração as individualidades e as questões culturais. ;Tem a ver com respeitar nosso corpo, honrar nossos sentimentos. E entender os sinais: o que é fome, apetite, saciedade. E descobrir a satisfação.;
De acordo como ela, o brasileiro tem todas as condições de se adaptar ao modo de comer mediterrâneo, mas, para isso, é necessário desatrelar o comer de forma saudável do deixar de comer aquilo que se gosta. ;Nós somos, todos os dias, bombardeados de informações, e vivemos em uma dicotomia entre o saudável e o não saudável. Nós sabemos o que devemos comer, mas precisamos mudar a mensagem. Devemos trabalhar o porquê comer, nos conectar com o alimento;, diz Bianca.
Andrea Poli, diretor científico da Fundação de Nutrição da Itália (FNI), chama a atenção para o fato de que deixar de comer algo pode fazer tão mal quanto fazer consumos exagerados. ;Teremos mais danos se eliminarmos totalmente algum produto. No âmbito de um consumo normal de açúcar, por exemplo, se o retirarmos radicalmente da dieta causará mais danos.;
Além de produtos ricos em nutrientes, a pirâmide alimentar mediterrânea recomenda a incorporação de outros aspectos, como a socialização. ;Comer não é apenas se nutrir. O ato da alimentação tem um importante papel social e cultural. Ao redor da mesa, vivemos momentos de integração social;, reforça Hugo Ribeiro.
Educação alimentar
Apesar de ser um dos maiores exportadores de frutas e verduras, o brasileiro ainda consome apenas 10% do recomendado desses produtos, segundo Bianca Neves. ;Apesar dos dados, é notável que a população vem se preocupando mais com o que vem consumindo, mas é preciso mais. É necessário o apoio da indústria, dos governos e da aplicação de políticas públicas;, defende. ;Hoje, existem pouquíssimas escolas que têm aulas de educação alimentar. É preciso difundir a informação e educar a população;, aponta.
Em Parma, comuna italiana, por exemplo, há todo um modelo educacional voltado para a alimentação, que começa desde o ensino fundamental. ;Nós enviamos formadores para as escolas para difundir os conhecimentos da dieta. Na universidade, há um programa de pesquisa e formação em nutrição aplicada voltados para isso;, explica Daniele Del Rio.
Degustação completa
Degustação completa
Ligia d;Andretta Karazawa está à frente do Restaurante Brace, tradicional em São Paulo. Formada em administração, sua verdadeira paixão sempre foi a cozinha. Tanto que, aos 18 anos, saiu do país para aperfeiçoar seus conhecimentos na gastronomia, passando por países como França, Espanha e Itália. Ela mostra como montar uma refeição com aspectos da dieta mediterrânea.
;Além da abordagem mediterrânea, o menu é pensado levando em consideração a questão pessoal. Eu, por exemplo, por ter morado muitos anos fora, acabo fazendo uma associação da dieta com aquilo que realmente acabo comendo no dia a dia;, explica.
Para ela, uma das coisas mais interessantes da dieta mediterrânea é que ela não tem padrões muito clássicos, como no Brasil. ;Aqui, temos que comer, todo dia, arroz, uma proteína, salada, feijão. No Mediterrâneo, não há esse padrão. Varia muito, intercalando verduras, leguminosas e carnes leves;, explica. Confira o menu.
Entrada
Pão rústico de fermentação natural com recheio de salmão defumado, batata de búfala e ragu bolonhesa. ;Pensamos em incorporar um alimento de mar, no caso o peixe, frutos secos, um pouco de fermentação natural, carne e queijo fresco, muito presente na dieta mediterrânea.;
Prato principal
Peixe fresco, legumes da estação grelhados, molho pesto de manjericão e rúcula. ;Como prato principal, escolhemos o peixe. Por ser um almoço, é preferível uma coisa mais leve, de fácil digestão, mas que, ao mesmo tempo, sacie. Os legumes na brasa e o molho pesto para acrescentarem sabor.;
Sobremesa
Pêssego na brasa com mel de tomilho e sorvete cremoso de baunilha. ;Na sobremesa, propus uma fruta assada, pois aqui no Brasil temos muitas frutas frescas, mas ela podem ser frescas e preparadas de forma diferente. Ou seja, um prato simples, com cozinha simples, para se sentir bem e saudável.;
Inclua nas refeições
Frutas e hortaliças: esses produtos têm uma grande quantidade de vitaminas, minerais, fibras e antioxidantes, que ajudam na prevenção do câncer.
Cereais: fonte de carboidratos, são um excelente fornecedor de energia para o organismo, além de fonte de fibras, nutrientes, minerais (zinco, fósforo, magnésio) e vitaminas.
Leguminosas: ricos em fibras e proteínas vegetais, vagens, ervilhas e feijões ajudam a combater a constipação, evitando o câncer de intestino, e diminuem o nível do colesterol ruim (LDL), prevenindo o aparecimento das doenças cardiovasculares.
Oleaginosas: fonte de gorduras boas, ajudam a reduzir o colesterol. Possuem Vitamina E Selênio, que apresentam importante ação antioxidante.
Peixes: ricos em ômega 3, proporcionam diversos benefícios à saúde, como diminuição dos riscos de doenças cardiovasculares e acidente vascular cerebral, ação anti-inflamatória, redução da pressão arterial e diminuição das taxas de triglicérides e colesterol total no sangue.
Leite e derivados: são fontes de cálcio, o que contribui para a prevenção da osteoporose.
Vinho tinto: com alta quantidade de flavonoides (antioxidantes), o vinho tinto evita a formação de placas de gorduras na parte interna dos vasos sanguíneos, diminuindo, assim, o risco de doenças cardiovasculares.
Azeite de oliva: é rico em ácido graxo monoinsaturado, o que auxilia no aumento do colesterol bom (HDL), favorecendo o coração.
*Estagiária sob supervisão de Sibele Negromonte