Renata Rusky, Silvana Sousa*
postado em 13/05/2019 17:25
Na casa dos 20 anos, os planos de carreira de Elisiane deram lugar às mamadeiras. A faculdade de Kethely foi colocada de lado em nome das fraldas. E May decidiu abrir mão do tempo livre para colecionar chupetas. Aos olhos de muitas mulheres, o cenário poderia representar a perda de uma importante parcela da juventude, mas, para essas mulheres, foi a escolha que deu início à realização de um sonho.
Apesar da crescente tendência em adiar a maternidade, muitas mulheres ainda planejam ter filhos mais cedo. Seja para ter mais tempo com a criança e mais disposição para acompanhar as brincadeiras, seja, simplesmente, porque o sonho de ser mãe é maior que todos os outros, o fato é que a opção ainda está em alta. Segundo dados da Estatística do Registro Civil, realizada pelo IBGE, as mulheres que têm o primeiro filho entre 20 e 24 anos representam a maior parcela de mães de primeira viagem do país.
Além dos benefícios quanto à disposição, optar por ter filhos mais cedo é interessante do ponto de vista fisiológico, como explica o médico especialista em reprodução humana Vinicius Medina Lopes. ;A melhor idade para uma gestação é na casa dos 20 anos, pois a mulher geralmente apresenta uma melhor condição física. Após os 30, é comum aumentarem os índices de abortamento, malformações do feto e infertilidade dos embriões;, explica.
O médico argumenta ainda que, mais do que o fator idade, o que importa mesmo é que o casal planeje a gestação. ;Deve existir todo um preparo, que não é apenas emocional ou financeiro. A mulher tem que adequar o peso dela, por exemplo. Além disso, é interessante o uso de ácido fólico antes da gestação;, enumera.
Para a master coach Cristiane Sousa, não há uma regra geral e única para todas as mulheres. Ela reitera que a questão central é planejar. ;Não existe uma idade ideal para ter filhos, mas, sim, o momento ideal. Independentemente da idade, ser mãe é uma missão e um sonho de grande parte das mulheres. Acredito que a palavra aqui seja maturidade material, física e emocional, atrelados à vontade de ser mãe. Quando esses pré-requisitos são atendidos, podemos dizer que a mulher está ;pronta; para a maternidade.;
Sonho realizado
No caso de Elisiane Couto, 28 anos, a vontade de ser mãe sempre ultrapassou qualquer outro objetivo profissional ou acadêmico. Assim que se casou, a empresária já começou a planejar a gestação, mas a chegada do filho só veio mesmo aos 24 anos. ;Chegamos a procurar um médico na época e ele nos informou que era normal essa demora. Meu marido até suspeitou que era algum problema com ele, pois eu estava com a saúde em dia. Mas, na viagem de férias, veio a notícia da gravidez;, conta.
Quando João Pedro nasceu, faltava apenas um ano para que a empresária concluísse a graduação em administração. Apesar de ainda não ter conseguido voltar à faculdade para terminar o curso, a mãe garante que isso nunca foi um arrependimento. ;Quando veio a notícia de que eu consegui engravidar, queria tanto ser mãe, que não me importei. Para mim, ele sempre foi uma vantagem, um amigo, um companheiro. Quando o João Pedro veio, foi a realização de um sonho;, emociona-se.
Atualmente, Elisiane trabalha na administração da oficina que toca com o marido e conta que pretende voltar à faculdade em um futuro próximo. ;Minha meta é me formar, primeiramente. Como meu filho está um pouco maior, é mais fácil deixá-lo em casa, ir trabalhar e ainda ajudar meu marido nas horas vagas. Encerrando a faculdade de administração, eu penso em fazer contabilidade também, acho que seria um bom complemento. Além disso, poderia deixar de pagar um contador na oficina, já que saberia fazer o serviço;, planeja.
A mãe de João Pedro, que hoje tem 3 anos, conta que, apesar da pouca idade, tira de letra a responsabilidade, e garante que a pouca idade nunca foi um problema. ;Acho que o difícil não é criar uma criança e, sim, educá-la para ser uma boa pessoa. Eu e meu marido sempre conversamos que o João não é uma extensão da gente, é uma pessoa que tem vontades próprias, personalidade. Temos o maior cuidado com isso. Claro que pais erram, mas tentamos ao máximo acertar.;
Além disso, a empresária garante que a idade proporciona uma maior interação com o filho. ;Eu tenho mais disposição para curtir as coisas com ele, para brincar. Não temos a mesma paciência, claro. Por sermos mais novos, tudo parece mais urgente. Mas é muito gratificante ser mãe, é o maior amor do mundo. Ele é uma criança incrível e não poderia ser diferente. Não tenho certeza maior que o meu filho.;
Maternidade antes, faculdade depois
Kethely Vieira Lopo, 20, estudante, adiou o plano do ensino superior para e adiantou o da maternidade. Sem acidente ou impulsividade, ficou grávida aos 18 anos de forma completamente planejada. Um dos principais motivos foi o fato de o marido ser quinze anos mais velho que ela. ;Todos os irmãos dele já tinham filhos e nós queríamos que ele ainda estivesse jovem para curtir o bebê;, explica Kéthely.
Os planos de estudar biomedicina, no entanto, não foram abandonados. Atualmente, ela além de cuidar de Pedro, 1 ano e 7 meses, e de todo o serviço da casa, ainda estuda para o vestibular. Deve começar o curso em agosto. Não é fácil, mas ela tira de letra. ;Não tenho babá, não tenho diarista. É difícil, mas é gratificante;, orgulha-se.
A ordem dos acontecimentos na vida de Kéthely também foi motivada por uma questão financeira. Quando se casaram e decidiram engravidar, a renda do casal não era suficiente para pagar a faculdade. O marido estava na residência médica e só recebia uma pequena bolsa e ela não trabalhava.
Agora, com a especialização dele completa, o investimento no ensino superior é possível e o pequeno Pedro está, aos poucos, cada vez mais independente e não representará obstáculo algum. ;Em agosto eu entro na faculdade. Ele faz dois anos em setembro e já vai estar mais tranquilo, já vai estar falando;, tranquiliza-se.
Para Kethely, não existe jeito ou ordem certa de fazer as coisas. Foi apenas a que se encaixou na vida dela. ;Eu sei que as pessoas pensam em estudar antes, ter uma vida estável, mas, aí depois pode não conseguir e ter que fazer inseminação. Sem contar que sempre aparece alguma outra prioridade: vou formar antes, vou trabalhar antes, vou viajar antes;, enumera.
A mãe não só estimula o filho a todo momento como também se sente estimulada o tempo todo. ;A gente brinca muito. Por eu ser nova, eu faço coisas com ele que, mais velha, talvez dê preguiça. Muitas mulheres mais velhas não têm tanta energia;, acredita. Os dois já são conhecidos no parquinho. Se não conseguem ir de dia, vão à noite. Também gostam de passear no shopping.
E tem mais crianças nos planos do casal. Kéthely programa mais uma para daqui a 5 anos. Não quer vários filhos de idades próximas. ;O Pedro já vai estar com 7 e eu com 25, ainda vou estar nova;, calcula. Até lá, ela já terá conquistado o ensino superior.
Felicidade materna após uma grande perda
Depois de um grande trauma, Mayara de Queiroz Nicolau, 30, quase desistiu da maternidade. A perda de dois bebês gêmeos a desanimou de, um dia, ser mãe. Aos 20 anos, ela teve uma gestação gemelar não planejada e ambos bebês faleceram. Um deles já nasceu morto e o outro sobreviveu por apenas 9 dias. Depois disso, o médico lhe disse que ela teria apenas mais dois anos para engravidar novamente, mas ela desistiu. ;Eu fiquei com medo de acontecer tudo de novo;, relembra.
Mas, como tempo cura todas as feridas, ao longo do tempo, o desejo de viver a maternidade foi voltando. Muitas amigas de Mayara começaram a ter filhos e isso reacendeu nela a vontade. O tempo que o médico havia lhe dado para engravidar já havia expirado, mas isso não a preocupou.
Mayara ficou grávida mais uma vez aos 23 anos e teve Milena, de 7. ;Eu sempre tive contato com a minha mãe, mas fui criada pelo meu pai, então, eu não tive aquela mãe tradicional, que dá carinho, sempre ali pra acolher o filho, então, foi muito bom oferecer pros meus o que eu não tive;, conta.
De uma mulher que quase decidiu por não ter nenhum filho, tornou-se mãe de dois. O segundo é Heitor, de onze meses, fruto de segundo casamento. Ao todo, são quatro crianças, pois o marido tem dois do primeiro casamento. E quando eles estão com a família, Mayara cuida como dos seus.
Após decidirem que teriam Heitor, o casal não quis esperar. Um dos motivos foi uma experiência pessoal de Mayara, de uma situação que via com a própria avó:;Eu tenho um tio da minha idade e eu observava que ela não conseguia curtir com ele;, considera. Chegou à conclusão de que quanto mais nova ela tivesse todos os filhos que queria, mais energia ela teria para brincar com eles. Já não pretende ter outros.
Em relação a ter um bebê aos 23 anos e aos 30, Mayara compara: ;A paciência vai diminuindo;, admite. Ela, no entanto, também pondera que a questão pode não ter só a ver com a idade, mas com o fato de, agora, serem dois: ;Enquanto arrumo um o outro está fazendo arte e vice-versa;. Milena, no entanto, também ajuda com o irmão mais novo.
Da filha, ela faz questão de ser parceira. Além de disciplinar, dar bronca e muito carinho, ela faz questão de conversar sobre tudo. ;Nos fins de semana, esperamos todo mundo ir dormir para ficarmos juntas sozinha. Faço questão de dedicar esse tempo;, relata. Para ela, ser mãe foi uma grande realização. ;Eu aprendi a não ser egoísta. Não tem mais nada que é só meu. Tudo que eu faço, preciso pensar nas consequências. Boas ou ruins, elas vão vir pra mim e pros meus filhos;, afirma.
* Estagiária sob supervisão de Sibele Negromonte
Três perguntas para Cristiane Sousa, life e business coach
Por que é importante fazer um planejamento familiar?
O planejamento é fundamental em todas as áreas da vida, principalmente quando se trata de formar uma família e colocar vidas no mundo. Ser mãe não é apenas dar à luz um novo ser. É decidir se comprometer com uma criança que não pediu para nascer, mas que precisa intensamente ser cuidada e amada. Sem um planejamento, a mãe não tem ideia das demandas que surgirão. Isso pode trazer surpresas constrangedoras, indesejadas e também traumáticas para ambas as partes. E o que começou com um grande sonho pode se tornar um problema. É imprescindível que a mãe entenda tudo o que está envolvido e o quanto sua vida estará comprometida a partir desse instante, até mesmo para que ela tenha opção de saber realmente se ela quer ou não entrar nessa jornada. Ter opção de escolha e escolher ser mãe fará toda a diferença no relacionamento entre mãe e filho.
Quanto o planejamento familiar pode auxiliar na conciliação da maternidade com a vida acadêmica ou profissional?
Em busca de independência financeira, as mulheres estão cada vez mais cedo buscando a estabilidade ou a segurança que a vida profissional pode trazer. É muito bom as mulheres terem o direito de se posicionar no mercado de trabalho e serem respeitadas por isso. Contudo, diante de uma maternidade, esse direito pode ficar comprometido. Tanto a mãe quanto o filho precisam de um tempo exclusivo de um para com o outro. Não apenas pela amamentação, mas principalmente pela importância emocional que está sendo construída nessa fase. A interação que acontece nesse período fará toda a diferença na formação da crença de identidade, capacidade e merecimento dessa criança. Ter uma maternidade planejada e programada para atender e resolver todos esses quesitos pode fortalecer os laços emocionais dos dois. A mãe saberá e se planejar para voltar ao mercado de trabalho no momento mais adequado, sem a dor nem o sentimento de culpa que hoje é visto em tantas mães/profissionais.
Qual dica você daria para as mulheres que pensam em serem mães?
A primeiro é buscar o autoconhecimento. Não basta apenas querer ter um filho, é imprescindível a mulher entender o real motivo do desejo de ser mãe. Ser mãe pelo motivo errado talvez seja mais prejudicial do que ter um filho na idade ;errada;. O segundo passo é buscar autoconsciência. Dentro do processo de coaching, eu trabalho três aspectos fundamentais para fortalecer as mulheres nessa jornada: a autoimagem (clareza de como ela se vê ou se imagina sendo mãe); autoconfiança (trabalhar sua crença de capacidade e posicionamento); e competência emocional (construir e fortalecer as emoções e sentimentos que proporcionarão condições para ela vivenciar com tranquilidade e harmonia cada etapa da gravidez, do nascimento e da convivência com o novo membro da família).