Correio Braziliense
postado em 26/01/2020 04:10
A senhora vem me reclamar da falta de educação do rapaz que lhe tomou a vaga no estacionamento, enfiando o carro na frente; um amigo se queixa dos filhos cheios de vontade e que não tomam rumo na vida, num estado de dependência que parece epidêmico; no bar, o camarada fala do absurdo que é a atitude dos jovens com tantas reivindicações esdrúxulas.
Espera lá! Quem foi que educou ou deixou de educar esses meninos e meninas — e que agora nem querem ser chamados assim? Não fomos nós? O mundo está nesta mixórdia não por culpa deles, mas das gerações anteriores que foram afrouxando ao ponto de não deixar um pai dar sequer uma palmadinha no filho. Ou não é isso?
Uma amiga reclamou que não tem conseguido nem conversar com o filho mais, sem ser chamada de repressora ou coisa pior. O caldo entornou no dia que a mãe entrou no quarto do rapazinho para arrumar a cama e foi acusada de estar cerceando a liberdade dele, que come, dorme e se veste com o suor dela.
Não era fácil ser jovem antes, nunca foi; mas esses métodos moderninhos, permissivos, que apostam na liberdade total, criaram um problema na cabeça dos pais que sonhavam participar da primeira mudança geracional sem conflito. Mas filhos nunca querem ser iguais aos pais.
Se alguma geração se perdeu foi a nossa. Talvez pela culpa de ter pouco tempo com as crianças ou pela decisão de oferecer uma educação sem tantos limites, como a que veio dos pais. O fato é que alguns valores e responsabilidades fundamentais até para o civismo, a convivência social, se perderam.
Os jovens de hoje já vêm conectados à rede mundial de computadores, quase equipamentos periféricos; com isso, há um excesso de informação sem filtro e um desprezo pelo conhecimento anterior, que de alguma forma é personificado por pais e professores. Quem precisa entender aquele complicado índice da Enciclopédia Britânica se basta um clique para ter o básico que basta?
É uma geração que só quer o básico, até porque ninguém mais quer saber tudo, até porque sabe que o tudo muda a toda hora. Pelo menos substituíram a angústia existencial pelo prazer imediato, que cabe numa música sertaneja, numa selfie, postagem ou exibição qualquer. De modo geral, não há muito espaço para pudor ou arrependimento.
Alan Walker x A$AP Rocky lançou uma canção em meados do ano passado que retrata essa urgência: “Viva rápido o momento/ Continue queimando nas duas pontas/ Eu tenho que sair antes que morra”, diz a letra de Live fast. E conclui: “2013 fui à loucura pela noite/ Em 2019 vou sair antes que morra” – seis anos de distância!
Nossa geração perdeu. Não apenas porque não entendeu o que querem os mais novos, mas porque não se conforma com isso. Éramos tão descolados, que esquecemos que a vida é assim. Mas mesmo com toda essa revolta dos maduros, entre um trago e outro no boteco, quando ouve uma história sobre os mais jovens, Leonel suspira:
— Que inveja!
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.