Tecnologia

ONGs levam acesso à internet a regiões mais remotas do Brasil

postado em 31/08/2009 11:55 / atualizado em 11/09/2020 13:47

Num ponto remoto do país, os moradores da comunidade Maguari - localizada na Floresta Nacional do Tapajós, município de Belterra, no Pará - se movimentam para receber os visitantes. O motivo de tanta agitação é natural. As cerca de 70 famílias que vivem no vilarejo dependem basicamente da venda do artesanato local para sobreviver. Como boas comerciantes, elas correm para divulgar os seus produtos. "Estes dias foram muito intensos para os artesãos da comunidade. Eles prepararam seus artesanatos com muita qualidade para que eles sejam bastante vendidos. Convidamos todas as pessoas que tenham vontade de visitar a nossa bela comunidade."

O recado, que visa atingir as comunidades vizinhas, foi postado no blog da Maguari (http://maguari.redemocoronga.org.br) por Wellington Rocha, um morador da região. Blog? Sim, no meio da selva amazônica, há pessoas que se conectam à internet, escrevem posts, trocam e-mails e até utilizam VoiP (voz sobre IP).

Organizações não governamentais, com o apoio de instituições privadas e públicas, estão rompendo a barreira do isolamento geográfico para levar, até as regiões mais remotas do país, telecentros que possibilitam acesso à web a comunidades, muitas vezes, até sem energia elétrica. Um exemplo é o Saúde & Alegria, um projeto que atua em três municípios do oeste do Pará (Belterra, Aveiro e Santarém) e atende 30 mil pessoas. A organização conta com um programa de inclusão digital que chega a sete comunidades ribeirinhas. Em cada uma delas foi criada uma estação digital, com computadores movidos a energia solar, com softwares livres e acesso à internet via satélite.

Direitos básicos

A partir deles, as comunidades, que vivem a quilômetros de distância umas das outras, podem se comunicar. "Com a internet, as pessoas têm direitos básicos de um cidadão, a começar pelo acesso à informação. Os nativos podem verificar serviços de governo eletrônico, e-banking, além de saber qual o preço cobrado por determinado produto produzido na comunidade, sem que um atravessador o prejudique. Com a web, podemos educar os extrativistas", diz o coordenador do núcleo de inclusão digital do Saúde & Alegria, Paulo Lima, lembrando de uma história que ilustra bem a importância de estar conectado nessas regiões. "Uma vez, encontramos uma menina que havia acabado de ser picada por uma (cobra) surucucu. Pesquisei na internet, fui no site do Instituto Butantan e vi como deveria proceder naquela situação. Como estava conectado, consegui pedir para mandarem um carro nos esperar à margem do rio. Depois, a levamos para o hospital e ela sobreviveu", conta.

No entanto, ele lembra que apenas dar o peixe não é o suficiente. "A nossa intenção não é só levar as máquinas para as vilas. Também nos preocupamos em preparar as pessoas para usar da melhor maneira possível essas ferramentas", conta, salientando que o projeto capacita professores e monitores para o novo mundo virtual.

Índios conectados

A Rede Povos da Floresta (www.redepovosdafloresta.org.br) também investe em ações que buscam levar a internet até áreas indígenas, quilombolas, ribeirinhas e extrativistas. Criado em 2003, o movimento conta com o apoio dos ministérios do Meio Ambiente e das Comunicações para implantar uma malha digital que conecta 15 comunidades nos estados do Acre, Amapá, Minas Gerais e Rio de Janeiro, levando ações de educação ambiental e serviços públicos online.

A conexão via satélite chega, por exemplo, às margens do Rio Amonia, onde vive a comunidade indígena Axanica, no Acre. "Certa vez, madereiros peruanos ilegais chegaram à região, mas bastaram cinco e-mails para eles mobilizarem a Polícia Federal e expulsarem os invasores", conta a coordenadora da rede, Virgínia Gandres, explicando os benefícios do programa. "A inclusão digital é apenas um instrumento que ajuda a atingir alguns objetivos, como registrar a identidade cultural dessas comunidades e proteger a biodiversidade da floresta", explica.

"Eles já até gravaram vídeos de exposição de pinturas e de danças e postaram no YouTube. Nossos índios são pop", argumenta Virgínia, defendendo que a introdução de novas tecnologias em locais remotos não deve ser vista como uma ameaça à cultura local. "Ninguém vai deixar de ser índio por entrar num site. Com a internet, podemos incluir essas comunidades na sociedade da informação."

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