O Windows Vista chegou ao mercado, há três anos, com a difícil tarefa de ser o sucessor do popular sistema operacional XP ; num momento em que a Microsoft dominava 95% dos computadores (de acordo com dados da consultoria Net Applications). No entanto, as dificuldades encontradas pela atual plataforma foram além do esperado e esbarraram em tortuosas questões de compatibilidade de drivers e alto poder de processamento, numa época em que os chips de núcleo duplo ainda chegavam timidamente ao setor.
Porém, confiando justamente na colheita dos frutos obtidos durante esse difícil período ; em que o sistema foi duramente criticado por usuários e analistas do segmento ; é que a Microsoft espera encontrar um terreno mais amigável para a chegada do novo Windows 7, previsto para ser lançado no mercado mundial em 22 de outubro. ;Com o Vista, os computadores tiveram que se adaptar e receber mais processamento e memória. Hoje vemos um parque computacional mais maduro;, conta o presidente da Microsoft Brasil, Michel Levy.
Firmemente crente nas melhorias alcançadas pela nova versão do sistema operacional mais utilizado do mundo, o chefe regional da maior companhia mundial de tecnologia de informação espera recuperar a imagem (trincada com o fiasco do Vista) entre os usuários e manter a larga hegemonia no segmento. No ano em que a empresa completa duas décadas de presença no Brasil, Levy recebeu o Correio para uma entrevista exclusiva, em que comenta não só o esperado lançamento, mas também outras questões, como o recente anúncio da união com a empresa Yahoo, a batalha com o Google e o potencial do mercado brasileiro.
Qual o balanço que o senhor faz desses 20 anos da empresa no Brasil?
Quando olhamos a evolução da tecnologia, 20 anos é um tempo bastante representativo. O que aconteceu nos últimos 20, 30 anos foi, de fato, uma revolução. Vale lembrar que, nesses últimos 15 anos, o país é outro, pela estabilização econômica e pela valorização da tecnologia. A Microsoft se desenvolveu junto com o país e, acredito eu, causando um impacto significativo no desenvolvimento do Brasil. Estamos muito satisfeitos em chegar nesses 20 anos tendo criado uma economia forte em torno da Microsoft, já que nosso modelo de negócio é completamente baseado em parceiros. Aqui no Brasil não vendemos um alfinete sequer diretamente (ao consumidor). Então temos um ecossistema enorme, de quase 20 mil empresas que, de uma forma ou de outra, estão relacionadas com a gente. Desde pequenos desenvolvedores de ferramentas até grandes corporações.
Steve Ballmer, CEO da empresa, esteve no Brasil no fim do ano passado. Que impressão ele teve do país e do mercado nacional?
A decisão de vir para o Brasil, há 20 anos, era porque o país já estava no mapa dos principais mercados de TI. Essa percepção foi crescendo e, hoje, eu diria, o país está entre os cinco principais mercados para a Microsoft, com uma grande importância estratégica. A presença do Steve Ballmer no país só fez refletir ainda mais isso.
O Google declarou que a recente união da Microsoft com o Yahoo! pode gerar um monopólio no setor de buscas. Como a empresa viu essa declaração? Como essa união afeta o Brasil?
Com a parceria com o Yahoo, estamos buscando imprimir mais inovações ao nosso buscador. Pudemos ver, inclusive, que o Bing foi lançado com um conjunto muito grande de novidades. Com isso, temos a intenção de trazer uma escala maior de negócios para que isso seja mais relevante, inclusive para os usuários.
Falando no Bing, quando vamos ter a ferramenta em português?
As inovações que ocorreram nesse primeiro momento no Bing atingiram apenas a língua inglesa. Como os Estados Unidos são o maior mercado, é lá que a gente precisa competir primeiro, para depois levar essas inovações para o resto do mundo. Nesse momento, estamos focados no mercado norte-americano e em alguns outros poucos países. A gente ainda não tem nenhuma data para falar quando o Bing vai estar em português, mas certamente isso vai acontecer.
A Microsoft vem de uma experiência não muito exitosa com o Windows Vista. No entanto, agora há uma expectativa muito boa para a chegada do Windows 7. O senhor acredita que a empresa está mais confiante agora do que na época do lançamento do Vista?
Há três anos, estávamos muito confiantes com as inovações que o Vista trazia. Aliás, o sucesso do Windows 7 só existe porque a Microsoft passou pelo Vista. Pagamos o preço da inovação. Muitos dos problemas que o Vista teve foram superados rapidamente. Mas é óbvio que ficou essa percepção. Acho que o Windows 7 traz todas os benefícios de tecnologia que estão embutidos no Vista e resolve uma série de questões que foram levantadas, como a necessidade de um sistema operacional mais leve. Naquele momento do Windows Vista, tivemos que fazer uma série de decisões em prol do usuário ; relacionadas à segurança e a uma série de coisas que mudavam a arquitetura do produto ; e isso fez com que houvesse uma adaptação de todo o ecossistema ; os fornecedores de hardware e softwares. Por isso, durante o lançamento do Vista, o sistema não estava 100% pronto. Então houve esse problema de percepção. Mas, ao longo dos primeiros meses, os drivers foram aparecendo, os produtos foram atualizados e quem depois comprou uma máquina com o Vista teve um índice de satisfação muito grande.
Um outro dado interessante é que, naquela época, quando o Vista foi lançado, as máquinas que eram vendidas não tinham as configurações adequadas para utilizar o sistema. Então a gente ingressou com um produto na ponta de um mercado. Hoje, o Windows 7 tem requisitos de hardware iguais aos do Vista, com uma performance melhor, e o parque de máquinas foi atualizado com as novas tecnologias. Então o novo sistema vai poder rodar na grande maioria de máquinas que é vendida hoje. O cliente vai sentir imediatamente os benefícios do novo sistema.
Inicialmente, nem mesmo a Microsoft planejava lançar o Windows 7 ainda em 2009. A antecipação do sistema operacional se deve mais às qualidades do produto ou aos problemas tidos com o Vista?
Quando lançamos o Windows Vista, o nosso compromisso era que, em até três anos, lançaríamos uma nova versão e, de fato, vamos cumprir isso. Isso é intrínseco da tecnologia. Temos que estar sempre renovando.
[SAIBAMAIS] Mas o Windows XP teve um período mais longo até sair uma nova versão do sistema operacional;
Sim, mas isso foi porque o Vista atrasou um pouco mais para chegar ao mercado. Mas o ciclo que a gente espera ter é mais parecido com esse que estamos vendo agora (diferença de três anos a cada lançamento) com o Windows 7.
Hoje, a oferta de serviços grátis cresce cada vez mais no mercado. É difícil para uma empresa que optou, historicamente, pela venda de licenças proprietárias de seus produtos lidar com esse período de transição?
O conceito do ;grátis; não existe. No final, alguém sempre vai pagar a conta. A forma de remunerar aquele serviço em que o usuário não está pagando é feita por meio do anunciante, que arca com o custo. Nesse negócio, a Microsoft está agindo intensamente, monetizando os serviços online por meio da publicidade online. Estamos nesse negócios há 10 anos, tendo uma participação expressiva no mercado mundial. Isso é cada vez mais reforçado, principalmente neste momento em que fizemos o acordo com o Yahoo! e definimos o search (pesquisa) como uma de nossas prioridades. Não tenha dúvida de que a publicidade online é uma das grandes estratégias de crescimento da Microsoft. Olha, isso funciona muito bem para o usuário final, mas não imaginamos uma corporação usando produtos de softwares baseados na publicidade. Muitas vezes o usuário final não sente porque não é ele quem coloca a mão no bolso para pagar. E normalmente ele não paga até um certo ponto, porque se ele quiser se aprofundar e desejar mais serviços, uma hora ele vai ter que pagar por isso.
Agora tem a questão do software livre. Uma coisa é o modelo de venda de licenças de softwares comerciais e outra coisa é o conceito do código aberto. São dois modelos diferentes. Um que cobra pela licença e outro que dá o código aberto, mas que cobra pela manutenção, pela assistência técnica e que, no fim da história, acaba cobrando uma mensalidade. Então, em vez de o cliente pagar licença, vai pagar serviço. Então, o grátis não existe, é só uma forma de você conseguir uma outra remuneração.
Com o que é mais difícil lidar: com a pirataria ou com os altos encargos fiscais que incidem sobre os produtos de TI?
Nós não consideramos esses fatores como entraves. A parte fiscal faz parte da regra do jogo e cada país tem a sua. Cabe a nós adaptar o nosso modelo de negócio para jogar dentro das regras (legais, tributárias e regulatórias). Quanto à pirataria, não a considero um empecilho, mas é um câncer para o mercado como um todo, não só para a Microsoft. Quando falamos de pirataria estamos falando desde de falsificação de música e roubo de propriedade intelectual, por trás dos quais age o crime organizado, até invasão de impostos. Então estamos falando de uma coisa que prejudica a cadeia como um todo. Para nós, obviamente, isso também tem um impacto. Afinal, são 58% dos computadores rodando cópias piratas, ou seja, todo um mercado que não está sendo atendido, que não está comprando, que não está gerando impostos ou emprego.
E o brasileiro já está mais maduro para perceber as diferenças de se comprar um produto original ou não?
Eu acho que sim. Mesmo que lentamente, estamos avançando nessa área. Tanto que a pirataria caiu de 65% para 58% nos últimos cinco anos. É um longo processo. Nós temos várias ações em conjunto com o Ministério da Justiça, com a Polícia Federal, com a Polícia Civil para colaborar nesta questão, é claro, cada uma no seu papel.
A crise econômica mexeu profundamente com a indústria de TI. No entanto, o Brasil sofreu menos que outras potências. Como a Microsoft está vendo este momento, em que a crise parece estar ficando para trás? Com cautela ou como um momento de oportunidade?
Vemos esse momento além da crise. A crise talvez seja apenas um dos sintomas através do qual essa grande transformação na economia se fez sentir. Sem dúvida, o Brasil estava mais preparado para esse novo momento da economia mundial e conseguiu fazer essa transição de uma forma mais suave, e também saiu mais fortalecido do que encontrou. De fato, os negócios deram uma retraída durante alguns meses, acho que muito mais fruto da cautela do mercado, que não sabia o que poderia acontecer. Companhias como a Microsoft conseguiram se posicionar muito bem nesse momento, sendo uma excelente alternativa para empresas melhorarem sua produtividade e reduzirem seu custo. Então, houve um período de baixa de vendas? Houve, para todo mundo, e nós não fomos exceção.
Que papel tem o Centro de Inovação da Microsoft no Senac de Brasília?
O centro de inovação tem um papel muito grande naquilo que a gente chama de interoperabilidade, que é a forma que a gente trata a necessidade do cliente de conviver com mais de uma plataforma. Se o governo opta por ter uma plataforma de software aberto, nós vamos lá e o ajudamos a se integrar com os clientes privados. O centro de inovação do Senac tem essa tarefa de pesquisar e criar tecnologias que permitam essa conversa. Esse centro já existe, mas faremos uma reinauguração, ainda neste mês, focando apenas essa questão, atendendo as necessidades do mercado.
"Quanto à pirataria, não a considero um empecilho, mas ela é um câncer para o mercado como um todo"
"O conceito do grátis não existe. No final, alguém sempre vai pagar a conta"