Antes de começar a ler esta matéria, pare e tente enumerar quantas contas, logins e senhas você usa todos os dias para acessar algum serviço na internet. Numa época em que as pessoas se reúnem cada vez mais em torno de comunidades e ferramentas oferecidas na rede, é comum criarmos perfis em redes de relacionamento, sites de bate-papo, caixas postais de webmails, blogs e uma dezena de outros serviços que nos permitem interagir com pessoas ao redor do mundo. Alguma vez, porém, você já parou para pensar no que vai acontecer com as informações armazenadas nessas contas no dia em que ficarmos offline para sempre? O que será de nossas fotos no Flickr, nossas mensagens no e-mail ou nossos contatos no Orkut? Como as famílias ou amigos devem proceder para apagar ou resgatar algum dado de alguém que morrer quando esse momento inevitável chegar?
Mesmo o tema sendo um tanto quanto mórbido, trata-se de um processo com o qual muitas pessoas acabam se deparando, de uma hora para outra, tendo que enfrentar a questão de resgatar ou apagar os rastros virtuais de um conhecido que se foi. Porém, saiba que, mesmo o caminho sendo muitas vezes burocrático, é possível, sim, ter acesso a uma conta de uma pessoa que não está mais entre nós. Na maioria dos casos, as empresas onde os serviços são hospedados exigem o envio de uma solicitação informando o caso e alguns documentos que comprovem o grau de parentesco com o proprietário, além da certidão de óbito. Dependendo do serviço, isso pode ser feito por e-mail ou via fax (veja quadro).
Alice Andrade Frerichs, especialista em direito digital do Patrícia Peck Pinheiro Advogados, conta que o recomendável, nessas ocasiões, é sempre procurar o site responsável, ler as cláusulas indicadas nos termos de uso do serviço e solicitar a exclusão do perfil. ;Na maioria dos casos, vemos que as empresas têm atendido os pedidos extrajudicialmente. Mesmo porque é uma situação comum. Caso as redes sociais não apaguem os dados, contudo, os parentes podem procurar a Justiça e pedir que isso seja feito por ordem judicial;, diz. Caso o internauta queira poupar a família dos desgastes que esses tipos de processo podem gerar, ele pode se precaver e até deixar os seus acessos registrados num documento. ;Se houver interesse, é possível deixar uma declaração, que é inclusa no próprio testamento da pessoa, com senhas e logins dos serviços utilizados pelo usuário;, conta Frerichs.
No entanto, não são todas as pessoas que desejam deletar aquilo que foi criado por um ente querido na web. A estudante Fernanda Araújo de Souza, por exemplo, preferiu manter ativo o perfil no Orkut do noivo, morto em um acidente de carro há quatro anos. ;A gente tinha uma senha em comum, então entrávamos na conta um do outro. Acho que é uma forma de relembrar as coisas boas que vivemos com ele;, sustenta, contando que a atitude gerou uma polêmica entre os amigos e familiares. ;Alguns gostaram, outros não. É normal. Essa foi a maneira que os amigos e eu encontramos de aliviar um pouco a dor da perda. Assim podemos, de alguma forma, conversar com ele, mesmo ele não estando mais aqui;, diz.
Testamentos virtuais
Para quem não confia nem mesmo na própria sombra e não quer arriscar delegar a alguém a ;guarda; das suas senhas de serviços do mundo online, uma opção é recorrer a alguns sites que agem como uma espécie de testamento virtual. Sim, existem páginas na internet em que o usuário pode guardar dados confidenciais e selecionar quais pessoas mais próximas e de confiança poderão ver as informações.
Um dos mais completos é o YouDeparted (http://www.youdeparted.com), um serviço que permite armazenar senhas, logins e outros dados confidenciais, além de guardar cópias digitais de documentos e fotos. O serviço, que custa anualmente entre US$ 10 e US$ 80 (de R$ 17 a R$ 152), dependendo do plano que oferece mais ou menos memória de armazenamento, chega ao extremo de replicar uma mensagem de despedida para os conhecidos e ainda permitir planejar detalhes do ;funeral;, como as flores que deverão ser utilizadas ou a trilha sonora que acompanhará o ritual. ;Faça com que a transição seja fácil para todos;, estampa o site. Nele, o usuário pode indicar até 99 pessoas que poderão notificar o site no momento em que ele falecer e, assim, ter acesso aos dados armazenados.
Concorrente direto do YouDeparted, o Legacy Locker (http://legacylocker.com) é um serviço relativamente simples, porém bem mais caro. O usuário pode escolher desembolsar US$300 de uma vez e ter o serviço disponível até o momento da morte, ou optar pelo plano anual e pagar US$30 por mês. O site permite que o cliente salve todos os logins e senhas para que elas sejam enviadas aos beneficiários, assim que eles avisarem o serviço sobre o falecimento. Todas as pessoas que estão cadastradas na página devem enviar o certificado de óbito e comprovar as identidades.
Outro serviço que atua nessa área é o Slightly Morbid (www.slightlymorbid.com). No entanto, ao contrário dos outros sites, ele não guarda senhas de e-mails ou acesso a outras ferramentas do cliente, apenas informa a uma lista de contatos cadastrados que algo aconteceu. Depois de criar uma conta, o usuário recebe um certificado com instruções que devem ser repassadas para uma pessoa de confiança. Em caso de morte, o amigo aciona a mensagem previamente escrita pelo usuário para todas as pessoas de sua lista.
; Fim das contas
Veja como proceder para apagar os registros de um falecido em diferentes serviços:
FLICKR E YAHOO!
A família deve entrar em contato com o serviço de atendimento ao consumidor da Yahoo, empresa proprietária do Flickr, e solicitar o término da conta, explicando o motivo da finalização. Para isso, basta entrar na Área de Atendimento Yahoo! Brasil (http://help.yahoo.com/l/br/yahoo/helpcentral) e preencher o formulário. Também deve enviar uma cópia da certidão de óbito do parente para que o departamento jurídico da companhia avalie o caso e apague definitivamente todo o conteúdo desejado. O mesmo procedimento serve para contas de webmail do Yahoo.
GMAIL
De acordo com a assessoria do Google, o procedimento não é burocrático, mas é necessário para garantir que pessoas mal-intencionadas não consigam ter acesso a determinadas contas. A empresa exige que o interessado envie documentos que comprovem o parentesco com o dono da conta, junto com a certidão de óbito, e explique a solicitação. Assim, o departamento responsável investiga a questão e libera a senha para a pessoa que pediu o acesso.
ORKUT
Por ser a maior rede de relacionamentos do país, o Orkut pode ser palco de várias expressões póstumas dos usuários. E isso, muitas vezes, pode incomodar os familiares de um indivíduo falecido. O Google explica que as contas do Orkut podem ficar ativas para sempre, pois elas não se desativam depois de um tempo sem serem acessadas. Caso alguém queira apagar determinado perfil, deve entrar em contato com o Google, explicar a situação e comprovar o parentesco com o proprietário da conta em questão. A empresa verifica a situação do perfil e pode liberar, em até três dias, a senha do proprietário.
TWITTER
Se ninguém souber a senha de algum usuário falecido, não há motivos para se preocupar. O badalado microblog desativa automaticamente as contas que não são logadas depois de seis meses. Ou seja, nenhum rastro da pessoa ficará à tona no mundo dos 140 caracteres.
FACEBOOK
A equipe do Facebook exige que o interessado envie um e-mail, em inglês, para a divisão de privacidade da empresa, anexando, além de documentos que comprovem parentesco, a cópia do atestado de óbito da pessoa falecida. Além de deletar o perfil, o parente pode, se desejar, retirar as informações que lhe interessarem e deixar o perfil visível no modo ;memorial;. Desse jeito, apenas os amigos já adicionados podem tê-lo na rede de amigos. Para isso, basta preencher um formulário (http://migre.me/6pRy). No entanto, a empresa não fornece nenhuma senha.
HOTMAIL
A Microsoft leva à risca a política de privacidade da empresa e restringe ao máximo o acesso às senhas das contas de seus usuários. No entanto, a companhia pode oferecer as informações para o responsável legal pelos bens do falecido. Para isso, é preciso enviar, seja por fax (00 xx 1 425 708 0069) ou carta (1065 La Avenida, Building 4, Mountain View, CA 94043, USA), uma solicitação contendo cópias dos documentos pessoais do requerente, além dos dados da conta do falecido (e-mail, nome, data aproximada do último login, etc.). A resposta da empresa chega por e-mail. No entanto, caso a caixa postal não seja acessada durante um período de 120 dias, a empresa deleta a conta automaticamente.