Enviar uma mensagem utilizando o celular ou escrever um simples e-mail pode parecer uma tarefa simples para muitos usuários, mas para uma parcela considerável de consumidores ; inseridos na economia e cada vez com mais participação no país(1) ; esse tipo de atividade pode ser bem dispendiosa e difícil. Teclas pequenas, menus complicados e a necessidade de se realizar longas operações até atingir um simples objetivo fazem com que um número grande de idosos se afaste das novas tecnologias e não desfrute dos benefícios oferecidos por elas. No entanto, como esses aparelhos e ferramentas de comunicação se tornando cada vez mais presentes em nosso dia a dia, cresce também a necessidade da indústria de oferecer aparelhos e soluções práticas voltadas para as características específicas dos consumidores da terceira idade.
Entre as áreas que crescem em importância nesse novo cenário estão a do design e a de engenharia, já que características como usabilidade e praticidade devem nortear os desenhos de novos produtos desenvolvidos pela indústria de eletrônicos. De acordo com um estudo realizado pela Universidade Estadual da Flórida, nos Estados Unidos, tanto a postura (muitas vezes retraída), quanto a falta de habilidade de pessoas com mais idade atuam como barreiras à adoção de diversas tecnologias.
Segundo os pesquisadores, um fosso que separa as pessoas que sabem manusear um computador ou um celular daquelas que não têm familiaridade com esses produtos começa a se abrir na sociedade, ameaçando transformar membros da terceira idade em pessoas de segunda categoria. ;Esse fosso é um problema, já que a tecnologia, particularmente os computadores e a internet, vem se tornando onipresente no mundo atual, e a plena participação da sociedade com essas ferramentas fica difícil para as pessoas sem acesso;, aponta Neil Charness, pesquisador da Universidade Estadual da Flórida.
Exclusão
O estudo apontou que, apesar de pessoas adultas poderem se beneficiar das vantagens advindas da vida online, como fazer reservas de passagens aéreas ou realizar serviços de e-banking, os idosos tendem a ser excluídos dessas possibilidades. Aproximadamente 85% das pessoas entre 18 e 44 anos ouvidas pela pesquisa afirmaram utilizar regularmente a internet. No entanto, quando o grupo analisado foi o de 65 a 74 anos, esse número caiu para 39%. Ao considerar as pessoas que têm entre 75 a 84 anos, o percentual cai ainda mais, ficando em 24%.
Processos de declínio cognitivo, diminuição da capacidade de memória e dificuldade em manter a atenção ; tudo parte do processo natural do envelhecimento ; podem tornar mais difícil para a terceira idade aprender novas habilidades. ;Os adultos mais velhos podem levar duas vezes mais tempo para aprender um comando em informática que os jovens. Eles têm seu ritmo próprio de aprendizagem;, conta Charness. Ele explica que os idosos veem, literalmente, as novas tecnologias de uma maneira diferente, e as mudanças são sentidas, principalmente, no que diz respeito à identidade visual dos aparelhos como percepção de cores e intensidade de brilho. Sabendo dessas limitações, a indústria tem o dever moral de melhorar a usabilidade dos produtos eletrônicos para os idosos, acrescenta o estudo.
Superação
Para a aposentada Maria Xavier, 64 anos, a aproximação com as novas tecnologias ocorreu lentamente. ;Antes, eu tinha medo de ligar o computador e quebrá-lo;, diz a senhora, que hoje participa do Geração III, um programa do governo destinado a ensinar informática às pessoas da terceira idade. ;Depois que comecei a entender um pouco mais, até comprei um computador para mim;, comenta. O casal Lenir, 63, e Osvaldo Alves, 67, também participa das aulas de informática e aos poucos começa a entender os comandos mais básicos do PC. ;Sempre achei esses eletrônicos muito difíceis de mexer, mas vi que tinha mesmo que aprender a usar computador quando começaram a perguntar qual era o meu e-mail e eu dizia que não tinha;, comenta Lenir. Mesmo dando os primeiros passos no mundo da internet, a dona de casa ainda sofre com outros aparelhos. ;O celular, por exemplo, é muito difícil. Apesar de ter um bem básico, só sei ligar e desligar. Mandar mensagens, nem pensar;, assume.
O designer e pesquisador da UnB André Barreto acredita que o mercado de eletrônico exclui esses consumidores. ;Toda a publicidade, por exemplo, é pensada para agradar aos jovens e aos adultos. Os idosos ficam marginalizados no uso desses aparelhos;, comenta. Para ele, essa é uma questão histórica e cultural, uma vez que as pessoas mais idosas fazem parte de uma geração que sofreu um abismo referente à transição da tecnologia e até de costumes. ;A geração de 1980, por exemplo, conseguiu acompanhar bem essas mudanças, mas nossos avós não. E isso ajuda a aumentar ainda mais a exclusão, e acaba influenciando na forma como os aparelhos são feitos;, aponta.
Ele explica que há uma série de questões que devem ser buscadas para atender melhor as necessidades da terceira idade. ;A questão da leitura, por exemplo, deve ser clara e objetiva. Não adianta a pessoa conseguir enxergar uma frase se ela não entende o que ela quer dizer;, explica, citando também outros pontos, como visibilidade, cores, contraste, tamanho de fontes e luminosidade. ;O designer e o engenheiro devem sempre ter o usuário como base para o início de qualquer projeto, já que os objetos é que foram feitos para as pessoas, e não as pessoas para os objetos;, analisa.
1- População que cresce
De acordo com a Síntese dos Indicadores Sociais, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre 1998 e 2008 a proporção da população idosa (60 anos ou mais) no país aumentou de 8% para 11%, atingindo 21 milhões de habitantes. Durante esse período, a expectativa de vida do brasileiro cresceu 3,3 anos, chegando a 73 anos. Em todos os estados pesquisados, os brasilienses são os que têm o maior indicador: 75,6 anos.
Ouça entrevista com o designer André Barreto
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