postado em 30/07/2010 10:09
Imagine correr em um asfalto quente ou andar em um gramado molhado em pleno inverno sem ter a temperatura dos pés alterada. É isso que promete um novo tênis desenvolvido por pesquisadores do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) de Franca, no interior de São Paulo. A novidade, batizada de Hybrid Thermic Shoes, um sistema elétrico abastecido por pilhas comuns do tipo AA, aquece ou resfria os pés segundo o interesse do usuário. A invenção, segundo seus criadores, pode ser útil tanto para atletas ; profissionais ou de fim de semana, quanto para pessoas que costumam ter problemas com o controle da temperatura dos pés, como diabéticos e idosos.De acordo com Alberto Lima, orientador do projeto, todas as partes do tênis foram pensadas para garantir que ele seja o mais confortável possível. ;O material que a parte externa é feita é o mesmo de roupas de mergulhador, o que garante a impermeabilidade. Já a parte interna é de uma lycra especial, que se adapta a todos os formatos de pé;, afirma Alberto. ;Assim, se uma pessoa tem o pé torto, calo, ou qualquer problema, ela poderá utilizar o tênis com o mesmo conforto;, conta.
Para manter a temperatura próxima do ideal, o calçado possui um pequeno circuito que mantém o interior do sapato entre 29;C e 35;C, considerada por especialistas a ideal para os pés . ;Embaixo da palmilha existe uma pequena chave, que a pessoa pode ajustar para aquecer ou resfriar a parte interna do tênis. Mesmo assim ela não ultrapassa esses limites de temperatura, o que garante a segurança do calçado;, afirma Alberto. ;Isso só é possível devido ao uso de umas placas de cerâmica localizadas na parte de cima do tênis, que retiram ou fornecem calor para a tênis;, afirma.
Fenômeno
Este duplo funcionamento é possível graças a um efeito conhecido como Peltier (1). Quando a corrente elétrica que aquece o tênis passa pelo interior dessas placas, uma face se aquece e a outra se resfria. ;Isso garante que o calor da parte interna seja ;jogado para fora;, deixando a parte de dentro mais fria;, explica Alberto. ;Quando o sentido dessa corrente se inverte, a placa usa o calor da área externa para aquecer a parte interna do sapato, deixando quentinho;, completa o pesquisador.
Esportistas que precisam se exercitar em quadras e terrenos muito quentes serão alguns dos beneficiados pela tecnologia desenvolvida em Franca. Este é o caso do fisioterapeuta Diogo Pena, 23 anos. ;Quando vou jogar futebol sinto especialmente esse problema. A quadra, e às vezes o campo de futebol, estão muito quentes e acabam esquentando muito os pés;, conta Diogo. ;Com certeza ter uma ferramenta que minimizasse esse problema seria bastante útil; afirma.
Para ele, no entanto, existem alguns outros aspectos que devem ser observados neste caso. ;É importante que o amortecimento não seja comprometido. Não adianta um tênis que deixe seus pés frescos, mas que não amortece os impactos;, afirma, como corredor e como fisioterapeuta. ;Outro aspecto que não deve ser deixado de lado é o peso. Para nós que praticamos esporte é importante que o calçado não pese muito e não atrapalhe na corrida;, completa Diogo.
Quem concorda com o fisioterapeuta esportista é o dermatologista Gilvan Alves. Para ele, este tipo de trabalho seria especialmente útil para quem mora ou visita regiões muito frias. ;Acho que esse tipo de invenção pode ser interessante para locais cujas temperaturas durante o inverno chegam a abaixo de zero;, afirma o médico. ;Nesses casos uma temperatura muito baixa realmente poderia comprometer a circulação e causar até mesmo problemas mais sérios, como gangrenas e amputações;, explica.
Apoio
Ele lembra também que é importante que o calçado tenha um peso baixo e que absorva o impacto, como também observou Diogo. ;Não sei como vai funcionar isso neste tênis, mas para que ele tenha algum sentido é essencial que ele seja bem leve e possibilite a respiração e a transpiração dos pés;, afirma Gilvan Alves. ;Do contrário, a relação custo-benefício não seria tão vantajosa;, conclui o especialista.
A invenção foi uma das vencedoras da feira de inovação promovida pelo Senai anualmente, e selecionada para exposição na Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace), realizada pela Universidade de São Paulo (USP), no início do ano.
Segundo os criadores, ainda não há previsão sobre o prazo para o produto chegar aos consumidores. ;Estamos trabalhando para melhorar o projeto, tanto nos materiais quanto nos custos de produção, para que ele seja viável comercialmente;, explica Alberto. ;Também estamos esperando o interesse de alguma indústria de calçados para criarmos uma parceria para o desenvolvimento do produto;, completa seu criador.
1 - Dupla energia
O efeito Peltier é a produção de um gradiente de temperatura em duas junções de dois condutores feitos de materiais diferentes quando submetidos a uma corrente elétrica. Foi observado pela primeira vez em 1834 pelo físico francês Jean Charles Athanase Peltier. Na verdade, o fenômeno termelétrico resulta em dois efeitos que podem ser considerados como diferentes manifestações do mesmo fenômeno físico.