postado em 31/10/2011 08:19
Telas sensíveis ao toque extremamente maleáveis, que podem até ser dobradas sem perder suas propriedades. Sensores que, se colocados em regiões específicas do corpo de pessoas que sofreram queimaduras graves ou tiveram membros amputados, podem devolver, ainda que parcialmente, a sensibilidade ; como se fosse uma nova pele. Essas são apenas algumas das possíveis aplicações de um sensor flexível desenvolvido por pesquisadores da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. A criação de especialistas em engenharia química foi publicada recentemente na revista Nature Nanotechnology.
Em entrevista ao Correio, Darren Lipomi, um dos desenvolvedores do sensor, contou que sua criação é composta de películas de nanotubo de carbono, funcionando como condutores elétricos. ;Eles são elásticos, ficam dentro de uma camada de silicone e a região entre os nanotubos é um capacitor, ou seja, um dispositivo de armazenamento de energia. Quando o sensor é pressionado, aumenta-se a capacitância. Esse aumento corresponde à aplicação da pressão;, detalha. As grandes diferenças desse sensor para outros, como o de telas de tablets, são sua maleabilidade, transparência e capacidade de identificar pressão de diferentes intensidades.
;Esse protótipo pode, um dia, ser usado em sistemas de inteligência artificial e em qualquer dispositivo que requeira biofeedback, como para recuperar a sensibilidade ao toque e à pressão em vítimas de amputação;, estima o pesquisador. Ele lembra que a parte mais difícil de desenvolver o sensor foi reduzir seu ruído elétrico ;flutuações aleatórias na capacitância que sobrecarregam o sistema e podem alterar as informações quanto à aplicação de pressão sobre o sensor. ;Isso dificultava distinguir o sinal real do ruído. Resolvemos o problema tornando as películas mais condutoras. Essa alteração as tornou mais grossas e menos sensíveis do que desejávamos;, explica o engenheiro químico.
Lipomi afirma que há dois resultados desse trabalho que são igualmente interessantes. ;O primeiro é a descoberta da película de nanotubos de carbono, um tipo de material muito fino que possui a melhor combinação de transparência, condutividade e elasticidade já vista na literatura;, garante. O segundo resultado é o uso dela como eletrodos no sensor, que, o pesquisador garante, tem textura parecida com a da pele. ;Mas o que mais me surpreendeu foi ver que a condutividade dos nanotubos de carbono aumenta quando o sensor é esticado, já que imaginávamos que o efeito seria exatamente o contrário;, admite.
Novo caminho
O diretor associado do Centro de Componentes Semicondutores (CCS) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Stanislav Moshkalev detalha que materiais como nanotubos de carbono e folhas de grafeno têm atraído, nos últimos anos, a atenção da comunidade científica e tecnológica. ;Os nanotubos têm forma cilíndrica e diâmetros externos variando entre 1 e 3 nanômetros ; 1 nanômetro equivale a um milionésimo de milímetro ; para nanotubos de parede única;, descreve. Ele acrescenta que tais materiais possuem propriedades consideradas interessantes para engenheiros, como alta resistência à deformação.
De acordo com Moshkalev, a combinação das propriedade do silicone, que é maleável e transparente, com as dos nanotubos, em forma de molas, criou um material novo. ;Essas molas são ;elementos de memória; na estrutura do sensor, pois tendem a voltar para a mesma forma depois da aplicação de esforço ou deformação;, comenta. Ele afirma que o trabalho dos pesquisadores de Stanford é muito interessante, pois mostra o alto potencial do uso de novos produtos na área da tecnologia. ;Vale ressaltar ainda que o ciclo de desenvolvimento nessa área é bastante longo, especialmente devido às aplicações biomédicas que estão sendo visadas pelos autores do estudo;, destaca.
Segundo o especialista em engenharia elétrica João Paulo Lustosa, professor da Faculdade de Tecnologia da Universidade de Brasília (UnB), a aplicação desse dispositivo no setor de robótica também seria útil. ;Nesse caso, o sensor pode ser utilizado para revestir a sola dos pés do robôs e, dessa forma, aumentar a estabilidade deles;, assegura. Ele cita que, na UnB, os robôs possuem quatro sensores pontuais nos pés. Se o solo for irregular e um dos sensores não detectar isso, a máquina pode cair. ;Utilizando a prótese proposta em Stanford, se ela se estender por toda a superfície do pé, o robô pode sentir facilmente qualquer irregularidade no solo e balancear a concentração de peso a fim de compensar esse problema e, assim, manter o equilíbrio;, estima o professor.
Lustosa destaca que outra possível aplicação na área de robótica seria revestir o robô todo com o sensor elástico, como se esse fosse uma pele. ;Assim, se alguém tocar nas costas dele, ele pode sentir. Se a equipe dos Estados Unidos conseguir aumentar a sensibilidade do sensor, será possível ter uma melhor precisão nas medições feitas;, diz. O professor universitário acredita que essa pesquisa terá impactos nos setores de ciência e tecnologia como um todo. O engenheiro elétrico comenta que, ao informar aos profissionais do Laboratório de Automação e Robótica (Lara) da UnB sobre a descoberta, a equipe se mostrou muito interessada em obter o dispositivo.
Após o desenvolvimento do sensor, Lipomi conta que pretende entender melhor o mecanismo que faz com que os nanotubos formem estruturas elásticas. ;Minha equipe e eu também queremos aumentar a sensibilidade à pressão do dispositivo e integrá-lo com os neurônios;, completa. O engenheiro norte-americano ressalta que outra futura aplicação dos eletrodos maleáveis é em células solares, para que não deformem mesmo em superfícies que não são planas.