Tecnologia

Cálculo permite classificar o grau de manipulação feita em fotos

Paloma Oliveto
postado em 07/12/2011 09:56
Na ânsia de mostrar força, o Irã fez 
o milagre da Eles são tão perfeitos que não podem ser reais ; e não são mesmo. Desde o início da década de 1990, quando os primeiros softwares de retoque de imagens foram lançados, é possível transformar qualquer Shrek em príncipe encantado. Um ajuste aqui, outro ali, e a ação da natureza e do tempo vai para o lixo, trocada por traços considerados mais formosos. Rugas, manchas, sinais de cansaço: é possível apagar qualquer coisa que acuse em modelos, artistas e celebridades a pecha de simples mortal.

Para a Associação Médica Americana, graças aos efeitos miraculosos do Photoshop, mulheres e homens têm se tornado obcecados pela própria imagem corporal, vítimas de mutilações desnecessárias e distúrbios alimentares, como anorexia e bulimia. A instituição, em guerra recente contra campanhas publicitárias que alteram fotos além da medida, acabou de ganhar um aliado. Sensibilizado por protestos de feministas britânicas, francesas e norueguesas que denunciavam os excessos cometidos pelas propagandas, o cientista da computação Hany Farid, professor da Universidade de Dartmouth, nos Estados Unidos, resolveu desmascarar os artifícios da indústria da beleza.

Farid, um experiente detector de mentiras em fotos ; ele é perito em imagens digitais e já trabalhou com agências federais de Justiça ;, desenvolveu um cálculo que permite classificar, de 1 a 5, o nível de manipulação de uma foto. Quanto maior o número, mais a imagem foi trabalhada no Photoshop. O professor e seu aluno Eric Kee criaram o programa a partir de 450 fotos originais e retocadas. Depois de analisá-las minuciosamente, eles definiram oito parâmetros que caracterizam a alteração de uma imagem. Também contaram com a ajuda de voluntários, que classificaram as fotos na escala, considerando o quão pareciam diferentes do original.

Revista manipulou foto de Britney Spears, retirou 
imperfeições e até mexeu nas dimensões do corpo
;Nos últimos anos, anunciantes e editores têm sido amplamente criticados por retocar fotos digitais ao extremo. Impossíveis níveis de magreza, altura e perfeição de pele são despejados todos os dias em propagandas, outdoors e capas de revistas;, justificam os autores do cálculo, em um estudo publicado na revista especializada Pnas. ;A ubiquidade dessas imagens irreais e altamente idealizadas tem sido ligada a distúrbios alimentares e insatisfação com o próprio corpo em homens, mulheres e crianças;, continuam. Devido a essas questões, eles criaram o programa, que ;pode ser usado para julgar objetivamente o quão uma foto retocada foge à realidade;.

Sem demonização

Em entrevista ao Correio, Farid garante que não se trata de ;demonizar; o Photoshop, primeiro software de correção de imagens, que permitiu a criação de seres perfeitos nas capas de revista. ;Na verdade, nossa intenção é que a manipulação de imagens se torne cada vez mais transparente. As pessoas têm direito de saber que aquilo que estão vendo não é totalmente real;, afirma.

Segundo o fotógrafo Ricardo Crisafulli Rodrigues, especializado em moda pela Universidade de Florença e autor de uma tese de doutorado sobre o discurso da imagem fotográfica, revistas e anunciantes estão começando a reverter a tendência de retoques, fazendo o mínimo de ajustes necessários. Ele reconhece, porém, que a facilidade de manipulação das fotos digitais incentiva o abuso das alterações. ;As fotos destinadas a publicidade, propaganda e doutrinamento tendem a ser mais manipuladas. O ideal é que o nível de manipulação não altere as informações contidas na imagem, mas apenas corrijam, como no tempo da fotografia analógica, distorções técnicas necessárias à melhor visualização e ao melhor entendimento das fotografias;, defende.

Série de
Farid e Kee analisaram imagens impressionantemente manipuladas, como as da ex-modelo britância Twiggy, clicada e alterada para uma campanha publicitária da Oly Difinity, marca de cremes anti-idade. No ano passado, o parlamento britânico proibiu a veiculação dos anúncios por entender que se tratava de propaganda enganosa. Na fotografia, Twiggy aparece com algumas marcas de expressão, mas com um rosto invejável. O problema é que retratos contemporâneos da ex-modelo mostram sua verdadeira face: marcada por fortes linhas e rugas, como ocorre com qualquer mulher de 60 anos.

Algumas fotografias checadas pela dupla não apenas corrigem ;defeitos; estéticos, mas mudam completamente o rosto do retratado. Para amenizar o que consideraram problema no rosto ou no corpo das pessoas, fotógrafos chegaram a descaracterizá-las, trocando narizes, lábios, cinturas, olhos; Farid explica que o Photoshop e outros programas de edição de imagem permitem facilmente alterar a aparência.

;Essas modificações podem afetar a geometria do sujeito e incluem o emagrecimento de pernas, quadris e braços, o alongamento do pescoço, a correção da postura, o aumento dos olhos e a simetria da face;, escreveu o cientista da computação no artigo. ;Outras alterações fotométricas afetam o tom e a textura da pele. Modificações assim incluem qualquer atividade para remover ou reduzir rugas, celulite, olheiras, manchas e sardas.; A combinação de manipulação geométrica e fotométrica é que pode criar os seres de perfeição inatingível.

No meio, à esquerda, imagem retocada da ex-modelo Twiggy. À direita, foto na mesma época Para Farid, o aperfeiçoamento de um sistema que defina o nível de manipulação da imagem depende do interesse da indústria. ;Como em qualquer tecnologia dessa natureza, inevitavelmente haveria um jogo de gato e rato, por isso seria importante rever periodicamente os parâmetros usados para classificar a alteração das fotos.; Ele acredita que, ao mesmo tempo em que as revistas e os anunciantes têm o direito de tornar seus produtos atraentes, o aperfeiçoamento artificial da imagem é algo com o qual os editores precisam se preocupar. ;Esperamos que nosso programa possa encontrar um meio-termo entre esses dois conflitos de interesse;, afirma.

Programa pioneiro
O programa da Adobe foi desenvolvido em 1987 por Thomas Knoll, que o aprimorou com a ajuda do irmão e o vendeu para a empresa. No ano seguinte, o software começou a ser vendido comercialmente. No início, os recursos eram usados mais para pequenos retoques, até ser considerado a ;galinha dos ovos de ouro; da publicidade.

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