Jornal Correio Braziliense

Tecnologia

NetMundial estimula internet para todos, sem a hegemonia dos EUA

São Paulo - Uma internet distante da hegemonia de fato dos Estados Unidos e governada de forma multilateral: nesta direção aponta a cúpula NetMundial de São Paulo, que debate até quinta-feira o futuro da web.

Por razões sobretudo históricas, os Estados Unidos abrigam os principais organismos que administram os endereços, domínios, normas e protocolos da web, o que irrita há anos vários governos.

Mas um dos criadores da rede, o matemático e informático americano Vint Cerf, disse em entrevista à AFP que "é um mito" que os Estados Unidos controlem a Internet.

"Os Estados Unidos não controlam a Internet, isso é um mito. Talvez quando começaram a rodar os programas, há 40 anos, sim, mas agora não", afirmou o cientista, lembrando o "papel" chave do seu país na gestão de endereços e domínios na rede.

"A Internet é uma besta incomum devido ao seu caráter transnacional", defendeu Cerf, que defende um sistema multilateral e representativo na gestão da web.

No entanto, da presidente brasileira, Dilma Rousseff, a representantes da sociedade civil e de outros governos têm insistido na importância de uma governança "multilateral" para fortalecer a legitimidade da rede.

Sobretudo depois do escândalo da espionagem maciça dos Estados Unidos contra milhões de cidadãos de vários países e chefes de Estado e governo, como a presidente Dilma e a chanceler alemã, Angela Merkel, denunciado pelo ex-agente de segurança americano, Edward Snowden.

"Ninguém deveria duvidar do nosso compromisso com uma visão multilateral da governança da Internet e nosso apoio à NetMundial", disse o representante americano no encontro, o coordenador de cibersegurança da Casa Branca, Michael Daniel.

- Nenhum país com mais peso do que outro -

Mas Dilma Rousseff pediu que nenhum país tenha mais peso que outro na governança da Internet.

A presidente saudou, ainda, o anúncio recente de que Washington cederá a uma entidade multissetorial o controle da ICANN (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers), corporação internacional encarregada de administrar o sistema mundial de nomes de domínio na Internet.

Com sede na Califórnia, a ICANN tem estado sob a tutela do Departamento de Comércio americano, mas a partir de setembro de 2015, terá um novo sistema de governo através de uma entidade multilateral.

Rodrigo De la Parra, vice-presidente para América Latina da ICANN, celebrou a cúpula de São Paulo, um encontro que pela primeira vez na história dos encontros sobre Internet emitirá um documento de consenso.

Este documento estabelecerá as bases para a governança da Internet, assim como um mapa para o desenvolvimento futuro da rede. Representantes de mais de 80 países estão trabalhando ao lado de membros da sociedade civil, acadêmicos, técnicos e empresas vinculadas à rede.

O primeiro ponto dos princípios de governança é, precisamente, a multilateralidade.

"O desenvolvimento das políticas públicas internacionais e a governança da Internet deveria permitir a participação completa e balanceada de todos os atores ao redor do mundo", diz o fragmento do texto.

Nas discussões desta quinta-feira, as ideias mais apresentadas pela sociedade civil têm a ver com a participação global na governança da Internet, assim como uma representatividade não só dos governos, mas de toda a sociedade, cada vez mais conectada.

E também com a privacidade.

- Zelando pela privacidade -

Pontos como a segurança dos dados dos usuários perante ameaças de espionagem, o direito à privacidade, à liberdade de expressão e ao livre fluxo de informações estão na mesa e devem ter um lugar no documento comum a ser emitido no fim da cúpula.

A "governança" da Internet engloba todos estes assuntos sociais e políticos da rede, além de outros como a qualidade das conexões, o acesso ou a infraestrutura. Uma espécie de regulamentação global que servirá como guia para o desenvolvimento da rede.

Ao final da cúpula, os participantes devem declarar que "os direitos ;offline; das pessoas também devem ser protegidos online, segundo os convênios internacionais sobre os direitos humanos".

Também deve manifestar o direito de proteção "contra toda forma de coleta ilegal ou arbitrária de dados", em clara alusão à espionagem americana e ao crime cibernético.

A cúpula termina esta noite com a emissão do documento.