Tecnologia

Desafio é unificar os serviços online do governo, diz secretário

Em entrevista ao Correio, Virgílio de Almeida, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, reconhece: "No caso do Brasil há vários serviços. Mas às vezes você não os tem de uma maneira unificada. E muitos países hoje estão avançando nessa direção"

Roberta Machado
postado em 23/04/2015 19:43
Em entrevista ao Correio, Virgílio de Almeida, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, reconhece: Na semana em que o Marco Civil da Internet completa um ano, a internet brasileira é tema de debate no Brasil e no mundo. O assunto foi destaque em um evento internacional, o Global Conference on Cyberspace 2015, evento organizado na Holanda na semana passada. O secretário de Política de Informática do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Virgílio Almeida, foi o representante brasileiro nesse encontro que reuniu palestrantes de mais de 50 países, e mostrou importantes conquistas brasileiras na área de governança da internet, como o Marco Civil e o Comitê Gestor da Internet (CGI.br), grupo multissetorial coordenado pelo próprio secretário.

Em entrevista ao Correio Braziliense, Virgílio Almeida fala sobre o interesse internacional pelas iniciativas brasileiras de regulação da rede, aborda a preocupação do país em criar uma aliança internacional em favor da cybersegurança e explica os planos de unificar os serviços online do governo. "No caso do Brasil há vários serviços. Mas às vezes você não os tem de uma maneira unificada. E muitos países, hoje, estão avançando nessa direção de unificar tudo num único serviço, onde se tem acesso a tudo o que o governo oferece", adianta o secretário.

O assunto é o tema principal do Seminário Internacional Brasil 100% Digital, evento que reúne especialistas de diversos países com experiências bem sucedidas na área de governo eletrônico, e que se encerra na sexta-feira (24/4) aqui em Brasília. Por meio do evento e do site do MCTI, o público é convidado a participar desse debate e contribuir para a construção da Agenda para o Brasil Digital, o documento que vai reunir as futuras diretrizes do uso de tecnologias digitais no país.

O secretário Virgílio Almeida adianta ainda que o governo também deve fechar nesta sexta-feira (24/4) um acordo com a Coreia do Sul para cooperação na área de economia digital e empreendedorismo. O pacto, que engloba as áreas de ciência, tecnologia e inovação, prevê uma transferência de conhecimento e intercâmbios entre entidades de empreendedorismo do Brasil e da Coreia do Sul na área de econômica criativa e a empresa Samsung. "A Coreia do Sul, que é hoje um país extremamente avançado nessa questão do uso das redes, da parte digital, talvez seja um dos países mais avançados no uso das tecnologias digitais", avalia Almeida.

Que pontos foram apresentados no Global Conference on Cyberspace? Que aspectos da internet brasileira se destacam no mundo?

A conferência tinha aproximadamente 700 pessoas, com representantes de mais de 50 países e 40 ministros de diversas áreas. A conferência tem uma importância grande porque ela tem o foco de discutir questões de crime e segurança cibernética. Eu falei na abertura, numa sessão sobre governança da internet. O modelo de governança da internet brasileiro é tido e falado por várias pessoas de outros países como o modelo mais avançado que existe, um modelo multissetorial. Ele é implementado no Brasil através do CGI, que é o Comitê Gestor da Internet. Ele é multissetorial porque tem representantes da sociedade civil, representantes do setor privado, da academia e do governo. As políticas para o uso, a governança da internet no Brasil são propostas e feitas por esse comitê. Isso chama a atenção no mundo inteiro, primeiro porque no Brasil isso já existe há 20 anos. E agora o resto do mundo está falando que esse é o modelo mais adequado para a evolução da internet, porque todos participam.

Além desse modelo, algum outro aspecto sobre a internet no Brasil foi discutido no evento?

Falei sobre o Marco Civil, que desperta uma atenção imensa dos outros países, porque o Brasil também é pioneiro nisso, não só por ter o Marco Civil, mas também por duas razões particulares: pelo processo com que o Marco Civil foi construído, por meio de consultas públicas. Isso desperta um interesse muito grande. O país abre para a sociedade falar o que acha da proposta. A questão da neutralidade da rede também desperta atenção, embora a Holanda tenha neutralidade de rede e alguns outros poucos países agora que estão implementando neutralidade de rede. Mas no Brasil isso já é uma realidade desde a aprovação do Marco Civil.

Recentemente o embaixador Christopher Painter, coordenador de Cyber Issues dos EUA visitou o CGI.

Ele disse o seguinte, e essa é a declaração que eu estou traduzindo para você: ;Hoje é um dia para mim muito especial, porque eu vim conhecer o mítico CGI;. Mítico no sentido de um mito. Ele vinha conhecer esse mítico CGI de que tudo mundo fala no mundo inteiro. E ele é o embaixador americano para essas questões de cyberespaço.

Vocês chegaram a debater a questão da segurança digital? Há pouco houve o debate a respeito da proteção dos dados brasileiros, inclusive do governo norte-americano. Como o comitê pode trabalhar em conjunto com outros países como os EUA nessa questão?

O primeiro ponto é que, quando a gente fala de cyberespaço, nós estamos falando de algo que é completamente conectado, onde tudo está conectado por meio da rede. Então, não adianta falar de um país sozinho em termos de segurança, em termos de crime. Aonde o crime ocorre, aonde há invasão de privacidade, isso tudo ocorre além das fronteiras dos países. Então, isso leva a um ponto importante que foi muito enfatizado, é que todas essas questões de cybersegurança e cybercrime têm de ser resolvidas por meio da colaboração de todos os países. Não é possível separar um do outro. Estamos falando de algo onde os dados fluem de um lado para o outro com muita facilidade.

O senhor acredita que é possível um acordo, considerando que o ponto de vista das duas políticas é tão diferente?

Pois é, nós não discutimos nenhuma possibilidade de acordo. Não houve nenhuma discussão sobre isso com os Estados Unidos. A discussão é sobre como os países podem colaborar. Aqui nessa conferência onde teve mais de 40 ministros, a discussão foi o que é necessário para tornar o cyberespaço mais seguro. O ministro holandês disse que, por ano, os prejuízos devidos aos crimes cibernéticos no mundo inteiro estão na casa de US$ 400 bilhões por ano.

E no Brasil há uma medida específica quanto a essa questão da proteção de dados?


O Ministério da Justiça abriu consulta pública sobre a Lei de Proteção de Dados. No que se refere à internet, o Brasil tem uma posição muito privilegiada e muito positiva, porque ele avançou muito em relação ao Marco Civil, o Comitê Gestor da Internet, a Lei de Proteção a Dados Pessoais, que está aberta para consulta pública. O Brasil tem uma legislação que dá a garantia para o Brasil se desenvolver nessa área cibernética. O Brasil tem também o centro de defesa cibernética, que é um órgão do exército, do Ministério da Defesa.

O Marco Civil também está em consulta até o dia 30 de abril. Podemos esperar alguma mudança no texto original?


Não. A consulta não é sobre mudanças no Marco Civil. Essa é uma lei aprovada. A consulta é sobre a regulamentação de alguns itens do Marco Civil.

Um item muito debatido é a questão da neutralidade da rede. Há alguma preocupação sobre esse tema?

A consulta não muda a neutralidade da rede. Ela pede apenas para explicar quais são os casos de exceção da neutralidade da rede.

Justamente sobre essa questão, há o recente acordo que a Presidente Dilma Rousseff fez com o Facebook para dar acesso gratuito à internet aos moradores da favela de Heliópolis. Mas há um debate sobre se essa medida fere a neutralidade da rede, considerando que o acesso não é irrestrito, que ele oferece apenas sites e serviços determinados pelo Facebook e pelo governo.

Quanto a essa notícia, nós ainda não temos, o Comitê Gestor da Internet, ainda não temos nenhum texto do acordo. Então não dá, portanto, para emitir nenhuma opinião porque não sabemos ainda que tipo de acordo é.

Mas se debate há muito mais tempo a questão dos provedores de telefonia celular, que também não cobram pelo acesso ao Facebook e a alguns sites. Isso também não é um caso a ser debatido na regulamentação da neutralidade de rede de acordo com o Marco Civil?

Isso não tem uma posição oficial do CGI sobre essa questão ainda.

Mas o Marco Civil já mostra alguns resultados efetivos, como foi no caso da decisão judicial que determinava a suspensão do Whatsapp, não é?


Exatamente. O CGI emitiu uma nota técnica, que está no site do CGI, mostrando que o Marco Civil diz o seguinte o intermediário, no caso a operadora, não é responsável pelo tráfego. Então não deveria ser feito daquela forma. O Marco Civil está em funcionamento. Temos visto, inclusive, notícias nos jornais mostrando, por exemplo, que dados solicitados pela Justiça agora são obtidos justamente por conta do Marco Civil.

O tema vai ser debatido no Seminário Brasil 100% digital, que vai acontecer em Brasília nos dias 24 e 25?

O Brasil 100% Digital é um seminário para conhecer as experiências de outros países que estão muito avançados em termos de governo digital, e para o Brasil mostrar o que já foi feito e discutir possíveis estratégias para acelerar essa implementação do governo digital no Brasil. É o primeiro seminário para ver quais são as experiências internacionais bem-sucedidas, então foram chamados ministros de países como o Reino Unido, o Canadá, os Estados Unidos, a Estônia, a Austrália. Então são países que têm hoje uma estrutura de governo digital muito avançada. O Brasil tem também vários serviços avançados, mas precisa haver uma integração maior.

O que o senhor quer dizer com "uma integração maior"?

No caso do Brasil há vários serviços. Mas às vezes você não os tem de uma maneira unificada. E muitos países hoje estão avançando nessa direção de unificar tudo num único serviço, onde se tem acesso a tudo o que o governo oferece. Então, a estratégia do Brasil daqui para a frente será discutida nesse sentido.

É possível ter uma ideia do que seria essa estratégia? Seria um site onde o cidadão poderia acessar todos os serviços do governo?

Isso tudo será discutido e apresentado. Do lado brasileiro, haverá apresentações do Ministério do Planejamento, responsável pela parte de dentro do governo, do Ministério de Ciência e Tecnologia, que vai apresentar propostas de desenvolvimento tecnológico, do Ministério da Educação, que vai apresentar o que existe em termos de serviços na área de educação. Agora, as estratégias serão apresentadas no seminário. Isso vai acelerar o desenvolvimento de novos serviços digitais, e vai usar a experiência de outros países para, inclusive, discutir essas estratégias.

Como o público poderá se manter atualizado sobre o seminário?

Virão vários especialistas do exterior, será algo interessante. O seminário está aberto ao público em geral que tenha interesse. Naturalmente, os resultados, as discussões, as apresentações, vão ficar disponíveis depois no site, e tudo será transmitido ao vivo pela internet. Depois disso, o governo vai trabalhar para anunciar quais programas serão feitos.

E quanto ao acordo que será assinado com a Coreia do Sul? No que consiste essa parceria?


O MCTI vai assinar acordos com a Coreia do Sul sobre o desenvolvimento tecnológico dessa área, da colaboração da área de segurança. Será um acordo de cooperação. Podemos, por exemplo, fazer programas de pesquisa em conjunto, trocar experiências com a Coreia do Sul, que é hoje um país extremamente avançado nessa questão do uso das redes, da parte digital, e é talvez um dos países mais avançados no uso das tecnologias digitais. (Será) uma troca de conhecimento, de experiência, projetos de colaboração científica em conjunto.

Seminário Brasil 100% Digital
23 e 24 de abril, das 9h às 18h30
Royal Tulip Brasília Alvorada ; Teatro do Centro de Convenções ; SHTN, Trecho 1, Conjunto 1B, Bloco C, s/n, Asa Norte
Acompanhe também a transmissão ao vivo e as notícias do evento pela internet: www.brasildigital.gov.br/

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