postado em 28/09/2011 09:24
A noite vai chegando e o Mar Morto, à direita do carro onde estou, transforma-se em uma escuridão salgada, sob o céu salpicado de estrelas. Poucos quilômetros adiante, a paisagem ; antes plana e abaixo do nível dos oceanos ; torna-se montanhosa. Sobre os montes, oliveiras plantadas pela prefeitura. Tornaram-se uma espécie de símbolo da cidade.
Jerusalém: o nome, antes familiar nas leituras diárias de notícias das agências internacionais e dos livros de história, agora ganha forma. A primeira visão que impressiona é a quantidade de judeus ultraortodoxos disputando espaço nos pontos de ônibus. Um viaduto em arquitetura moderna se contorce em um centro nervoso da cidade santa.
No hotel, situado no aprazível bairro de Givat Ram ;perto da Knesset (Parlamento) e dos ministérios ;, o desejo é de não perder tempo. Após um jantar indiano, combino com um colega russo, um sul-coreano e uma espanhola de conhecer o centro. Perdidos, decidimos apostar na Cidade Velha, embora o recepcionista do hotel nos tenha dito que nada funcionava àquela hora da noite.
A caminhada noturna por uma das principais avenidas de Jerusalém, a Jaffa, revela uma metrópole pulsante. Em uma das ruas arteriais, jovens se divertem em pubs, bares e restaurantes. Descendo a via principal, uma das mais extensas de Jerusalém, uma imagem salta aos olhos. Uma imensa muralha, com 4,5km de extensão e entre 5m e 15m de altura, transporta-me para 2 mil anos atrás.
Entro pelo Portão Jaffa, um dos sete pórticos construídos em 1538 sob as ordens do Sultão Suleiman, o Magnífico, líder do Império Otomano muçulmano. Após me informar sobre como chegar à Basílica do Santo Sepulcro, caminho por um dos becos, rasgados entre muralhas da época de Jesus e em meio a poucos comércios ainda abertos. São 23h e um árabe tenta a todo custo me vender um lenço. Negociamos e consigo um desconto de mais de 70%.
Despeço-me com o fruto da pechincha e dobro à direita ao ver a placa com a inscrição Quarteirão Cristão. Uma caminhada de mais uns 20 metros e me deparo com três senhoras russas, com lenço cobrindo a cabeça e terço nas mãos.
Oração
Ao lado da Mesquita de Omar, construída no século 12, o portão que dá acesso a uma das entradas do Santo Sepulcro permanece fechado. Uma das idosas conta que a basílica abriria às 23h30 para uma cerimônia. Na hora exata, as portas cedem e chego a um imenso pátio, diante do templo. Ali, Jesus teria sido pregado na cruz.
Ao ingressar no Santo Sepulcro, percebo que as lágrimas me traem. A Pedra da Unção ; aquela onde o corpo de Cristo teria sido lavado e preparado para o enterro ; está bem diante de meus olhos e sob uma imensa pintura retratando o momento fúnebre. Ajoelho-me, faço uma oração, toco a pedra.
Atrás de mim, no canto direito, uma escadaria leva ao Gólgota, o exato local da crucificação. As passadas são pesadas e silenciosas. E o ambiente no Calvário, de um respeito extremo.
Em silêncio absoluto, mulheres vestidas de preto sentam-se perto dos dois anjos de prata que guardam a marcação junto do chão, indicando o ponto onde a cruz foi erguida. Os sacerdotes ortodoxos controlam o fluxo de fiéis que se agacham diante de um pequeno quadro com a imagem de Jesus e tocam uma espécie de castiçal, entre as duas imagens de anjos.
Após descer pela mesma escada, deparo-me novamente com a Pedra da Unção e viro à direita. O chão de pedra batida e a luz artificial cada vez mais escassa antecipam o que vem pela frente. A edícula erguida sobre o que um dia foi a tumba de Jesus, pela tradição católica, talvez seja o ambiente mais sagrado do Santo Sepulcro.
Peregrinos fazem fila e a entrada no túmulo exige uma boa dose de esforço. É preciso ficar praticamente agachado, diante de uma rocha na qual o corpo inerte de Cristo permaneceu por três dias até a ressurreição. Com frequência, o acesso dos fiéis é impedido para que os sacerdotes purifiquem o ambiente. O barulho do incensário, a imagem de fiéis acendendo velas e o cheiro de um leve perfume no ar me conduzem a um quase êxtase religioso. Aguardo minha vez, atrás de senhoras do Leste Europeu, entro no sepulcro e faço nova oração.
O jornalista viajou a convite da Embaixada de Israel
Leia mais na edição impressa de hoje (28/9) do caderno Turismo