Jornal Correio Braziliense

Turismo

Uma viagem no tempo na zona rural de Itatiba (SP): hospede-se nas montanhas

Num cenário histórico, próximo a São Paulo, com quase 145 anos de idade, uma antiga fazenda de café foi transformada em um aconchegante hotel fazenda, perfeito para casais que apreciam o clima rural


Um jardim em zigue-zague ornado por flores onde, ao centro, uma fonte é cercada por bancos para espiar os pássaros. Foi esse o presente que o cafeicultor José Alves Cardoso ofereceu à esposa, Carolina. Muito mais jovem que ele, nesse jardim, ela não iria caminhar para tão longe nas tardes em que ele trabalhava dentro da fazenda. Por isso, da janela, o fazendeiro podia acompanhar ; marido ciumento que era ; o esticar das pernas da amada, bem ao alcance de seus olhos.

Sem saber, José Alves criou uma das paisagens mais bonitas da então Fazenda Jaboticabal. Erguida em 1872, a propriedade foi uma das mais importantes produtoras de café do estado de São Paulo, na época em que o grão valia ouro. Hoje, o jardim ainda é bem cuidado na fazenda que se transformou, há pouco mais de 20 anos, em um hotel na cidade de Itatiba, a 90 quilômetros da capital paulista.

É no jardim-labirinto de Dona Carolina que são feitos casamentos e pedidos de noivado. O cenário bucólico só disputa atenção com a arquitetura colonial portuguesa de dois séculos. Quem se hospeda na Fazenda Dona Carolina se dá, de fato, ao luxo de desfrutar da estrutura do hotel histórico que oferece 90 quartos e diárias que podem variar de R$ 955 a R$ 2.315, incluindo todas as refeições e bebidas (exceto as alcoólicas), além da maior parte dos serviços.

São quatro restaurantes que, a cada almoço e jantar, abrem para atender diferentes cardápios e gostos. No café da manhã, frutas, pães artesanais, queijos e frios, além de outros pratos quentes, são servidos em um salão exclusivo iluminado por painéis de vidro que deixam o verde e a luz entrarem para acordar os visitantes.


Descansar e degustar


Para relaxar, há opções como a piscina aquecida ou um espaço zen para massagens, sauna e uma jacuzzi, que pode ser reservada para o casal. Aqueles que preferem atividades ao ar livre podem escolher uma entre as nove trilhas que percorrem a reserva de Mata Atlântica totalmente preservada. Bem sinalizados, os percursos variam de 1,6km até pouco mais de 7km. Ainda é possível fazer os passeios de bicicleta ou a cavalo.

Há, inclusive, passeios noturnos para cavalgar em grupo. Mas, se ouvir alguma história de fantasma, não leve a sério. Tampouco os ruídos noturnos. Os causos se remetem à época em que a fazenda foi construída, quando ainda se vivia sob o regime da monarquia escravista. No entanto, Dona Carolina saiu à frente e, antecipando-se à Lei Áurea, já havia libertado os escravos. Além da alforria, lhes concedeu um terreno de 100 alqueires ; mesmo tamanho da propriedade onde viveu até 1919. Tudo isso para garantir condições dignas de trabalho e moradia.

Refeitos de qualquer susto, os hóspedes quedam-se divertidos quando descobrem que, na verdade, aquele barulho na mata era de algum sagui ou capivara que habitam a região. À noite, também é possível tomar um vinho ou conhaque enquanto assiste a uma seresta na casa principal. Um bom programa é sentar-se ao sofá ou em uma das mesas do bar para apreciar uma apresentação no piano de cauda.

O café servido para encerrar a noite é cultivado na fazenda. Reconhecido por importantes produtores nacionais pela qualidade, quem gosta da bebida pode aprender como é a produção em uma visita guiada. À tarde, o tour começa na plantação de café com um guia que hoje também trabalha como consultor para outras fazendas de São Paulo e Minas Gerais. Seu Jair das Chagas é, sem dúvida, um dos funcionários mais antigos da propriedade.


Neto do seu Oscar, que já foi administrador e conviveu com muitos herdeiros de Dona Carolina, Jair é um bom contador de histórias. Ao longo do passeio, se aprendem os segredos de quem sabe ; do pé à moagem ; como produzir um bom café. Um deles é a paixão pelo ciclo que envolve plantação, colheita, poda, lavagem e moagem até se obter um produto final de alta qualidade. Atentos, presta-se muita atenção a seu Jair, que dá para cada um provar um grão de café no estágio ;cereja;. Docinho, direto do pé, como deve ser colhido para que o resultado na xícara não seja de amargor.

Fruto do cruzamento do grão catuai com o caturra, o tupi é produzido na fazenda há cinco anos, após um largo período de pausa, uma vez que a fazenda era só de plantação de café no século 19. Seu Jair é responsável pela bem-aventurança dos 4 mil pés que dão frutos na fazenda e que rendem grãos e pó vendidos aos hóspedes em embalagens de R$ 25. Uma gostosa recordação.

Feito com amor


De Brasília, o casal Jones Madruga, 29 anos, gerente de relacionamento, e Rafaella Freitas, 29, gerente de projetos, aproveitou esse e outros passeios na fazenda. Depois de se mudarem para São Paulo, há pouco menos de seis meses, eles decidiram dar um tempo da cidade para curtir o primeiro aniversário de casamento na casa de Dona Carolina. ;Amigos nos indicaram esse lugar para comemorarmos e estamos achando tudo maravilhoso;, disse Rafaella. Para Jones, passar um fim de semana tão perto da natureza é um ;respiro; para quem ainda não se acostumou com a poluição de São Paulo. ;Tudo isso com direito a seresta, passeios e, claro, uma boa cachaça;, brinca Jones, ao se referir à bebida produzida no alambique que o hotel construiu há menos de 10 anos.


Por isso, o casal de brasilienses também foi conferir, no último dia da segunda lua de mel, um tour com o mestre cachaceiro Carlos Alexandre Cimino. O simpático mineiro de Barbacena não perde a chance de fazer rir quem lhe lança perguntas sobre a ;bendita; da cana. Em 40 minutos de visita guiada, é possível conhecer desde o alambique, o processo químico de fermentação até o local onde a cachaça é armazenada em barris de carvalho trazidos da Escócia, a fim de renderem diferentes combinações, sabores e qualidades.

De quebra, Carlos Alexandre serve aos visitantes as três variações que a Fazenda Dona Carolina produz: garrafas de três, cinco e de oito anos de cachaça. A mais nova pode ser consumida tanto ;sozinha como bem acompanhada por uma fruta em uma caipirinha;, dá a dica. Por último, a garrafa de 8 anos é, sem dúvida, a mais saborosa. Feitas as honras, o mestre cachaceiro diz sempre responder à pergunta: ;Qual é a melhor temperatura para se armazenar a cachaça;. A qual logo devolve: ;Se estiver gelada, é perigoso. Você acaba bebendo mais;, brinca.

Para degustar as amostras, entre uma bicada e outra, o mestre cachaceiro aconselha comer uma pimenta-biquinho. ;Mas se não tiver em casa, vale um pedacinho de queijo;, simplifica. O preço, da mais jovem à mais velha, varia de R$ 80 a R$ 270.
Prazeres que aos olhos e ao paladar se repetem aos fins de semana. Dias em que casais, como Jones e Rafaella, decidem vir passear pelo jardim de Dona Carolina. O local que no passado serviu a declarações de amor, não perdeu a vocação.

Aventura em um 4X4
O hotel é o único lugar na América Latina onde é possível fazer a Land Rover Experience. Na sede da marca, há a possibilidade de fazer um curso que une prática e teoria. Serviço opcional, o hóspede pode dirigir uma Land Rover, ou ficar de copiloto, e percorrer uma trilha feita especificamente para essa experiência.

O favorito das crianças
Aprender a ordenhar uma vaca, conhecer os animais da fazenda, fazer trilhas, andar a cavalo, construir arco e flecha e slackline, além de brincar no campo, são algumas das atividades oferecidas pelo hotel para que o casal fique à vontade e deixem os filhos com recreadores credenciados.