postado em 09/07/2018 10:00
Sob a suave iluminação dos candelabros, o impressionante mosaico em âmbar assume diferentes tonalidades, do mel ao dourado. O esplêndido degradê é intercalado por pedras preciosas, esculturas e arabescos folheados a ouro. Todo o conjunto de bordados reverbera nos espelhos do ambiente, batizado ;Sala de Âmbar;, também apelidada de a ;Oitava Maravilha do Mundo;.
A obra de arte de inestimável valor no Palácio de Catarina, na cidade que hoje se chama Pushkin, a 25 quilômetros de São Petersburgo, foi a mais valiosa carga roubada por nazistas, depois da invasão da União Soviética na Segunda Guerra Mundial. Embora russos tenham tentado camuflá-la, os alemães sabiam onde encontrá-la. A que vemos hoje é uma réplica, reconstruída entre 1979 e 2003.
Os painéis dessa espetacular sala vestida em âmbar foram imaginados e bordados por alemães, dinamarqueses e poloneses, mestres na arte de moldar a resina fossilizada, derivada de árvores extintas, encontradas, principalmente, na costa do mar Báltico, na região de Kalingrado, cuja formação levou entre 30 e 90 milhões de anos. Foram destinados, a princípio, para o Charlottemburg Palace, em Berlim, residência de Friedrich I, primeiro rei da Prússia. No contexto da aliança forjada em 1716, entre o Império Russo e a Prússia na Grande Guerra do Norte (1700-1721), a obra de arte foi oferecida por Frederick William I (reinado entre 1713 e 1740) a Pedro, o Grande da Rússia.
Ao fim do conflito, ao mesmo tempo em que a Suécia perderia para a Prússia (futura Alemanha) o protagonismo no Ocidente, a Rússia se fez Império e conquistou, em definitivo, o acesso ao Ocidente pelo mar Báltico.
Quando despachada da Prússia a São Petersburgo, a Sala de Âmbar foi instalada no Palácio de Inverno, que hoje integra o complexo de edificações do Museu Hermitage. Mas, em 1755, a czarina Isabel I (reinado de 1741 a 1762) a transferiu para o Palácio de Catarina, em Pushkin, onde o arquiteto Bartolomeo Grancesco Rastrelli a redesenhou e ampliou, acrescentando 600 toneladas de âmbar.
O esplendor desse palácio do barroco tardio traz a marca de três grandes mulheres, duas delas, Catarinas. Como os palácios de reis e imperadores, o poder também se impunha pelo luxo e bom gosto. Foi iniciado por Catarina I, mas desenvolvido por sua filha, Elizabeth ; que reinou entre 1741 e 1762. Muitas foram as intervenções comandadas por Catarina II, a Grande, que assumiu o poder em 1762, depois de golpe de estado em que seu marido, o fraco Pedro III, foi assassinado.
O Palácio de Catarina foi mais um a se rivalizar a Versallhes: em seu quilômetro de circunferência e na sua fachada de 325 metros em tom predominantemente azul. Ao gosto de Isabel e Catarina II, atlantes e cariátides que ornamentam essa fachada chegaram a ser bordados em 100 quilos de ouro. Não menos suntuosos são os jardins, que também marcam a glória militar. Vitórias bélicas, arrancadas pelo império em diferentes momentos históricos, foram celebradas, como o pavilhão em formato de mesquita, o chamado Banho Turco, erigido por ordem de Nicolas I para humilhar os adversários derrotados em guerra (1828-1829). Assim como todo o palácio, esse monumento foi duramente atingido por bombardeios na Segunda Guerra Mundial.
A cidade de Pushin, chamou-se durante o período imperial Tsarskoe Selo, a Vila do Czar. Foi rebatizada pela segunda vez em 1937, ocasião do centenário da morte de Alexander Pushkin, que, em sua jornada infinita, é um dos mais celebrados poetas russos. Esse gigante construtor de palavras, que rivalizou-se às grandes obras de imperadores e imperatrizes, deixou a sua marca no tempo: ;... Os anos são fugazes, e, ainda que muitos deles estejam por vir, todos seremos submetidos ao abrigo eterno e, neste momento, já é a hora de alguém entre nós;. Como teria protagonizado o próprio Pushkin, ao longo do caminho, antes de seu desfecho, jamais poupou a vida em mil sonhos que, talvez, nunca se concretizassem, preferindo-os sempre a uma existência sem jamais tê-los sonhado.