Obstetra da UnB aponta educação sexual para evitar gravidez na adolescência

No Brasil, mais de 450 mil adolescentes se tornam mães a cada ano. Médica do Hospital Universitário de Brasília explica riscos dessas gestações e caminhos para mudar essa realidade

Maíra Nunes
postado em 18/08/2020 18:06
 (crédito: Monique Renne/Esp. CB/D.A Press)
(crédito: Monique Renne/Esp. CB/D.A Press)

O caminho mais eficaz para evitar gravidez na adolescência é educação sexual", é o que defende a ginecologista e obstetra Silandia Amaral da Silva Freitas, do Hospital Universitário de Brasília (HUB). O tema ganhou destaque após a repercssão que a gravidez de uma menina de 10 anos no Espírito Santo, fruto de um estupro que ela disse sofrer do tio, se tornou público. Apesar de a interrupção da gravidez, autorizada pela Justiça, ter ganhado contornos ideológicos, a gravidez na infância e adolescência ocorre com uma frequência assustadora no Brasil.


Em 2018, 21.172 bebês nasceram de mães entre 10 e 14 anos; e 434.956 de mães entre 15 e 19 anos. Essas mais de 450 mil mães adolescentes sofrem maior risco de vida e de desenvolverem complicações durante a gravidez, assim como os seus bebês, além de terem tido de lidar com todas as mudanças físicas, psicológicas e de rotina que trazem a chegada de uma criança. Para esclarecer pontos como esses e apontar medidas para começar a mudar essa realidade do país, o Correio conversou com a médica Silandia, que atua com adolescentes e na área de gestação de alto risco.


Existe um risco maior para a mãe quando ela engravida na infância ou na adolescência?

Apesar de, teoricamente o corpo feminino estar pronto para uma gestação a partir de quando ela começa a menstruar, esta menina, ao engravidar, ela tem sérias condições que pode acometê-la durante o período gestacional. Há o maior risco de doenças hipertensivas gestacionais, que é a principal causa de morte materna no mundo, maior risco de diabetes gestacional, de parto prematuro, de procedimentos ilegais para provocar aborto ou, em decorrência de partos mal assistidos, um risco maior de infecção e, consequentemente, maior taxa de mortalidade materna.


Uma gravidez na infância ou adolescência também envolve um risco maior à saúde do bebê em gestações de mães entre 10 e 19 anos?


As complicações fetais mais comuns é o nascimento prematuro e a restrição de crescimento desses bebês, pois não conseguem crescer de forma tão adequada intra-útero como na população em geral. Por grande parte dessas gestações na adolescência não serem planejadas, não serem aceitas e apoiadas pela famílias, essas meninas acabam escondendo a gravidez por muito tempo, começam o pré-natal tardio e, portanto, têm um acompanhamento mais precário da gestação. Isso coloca em risco maior a mãe e a criança.


Quais são as possíveis complicações psicológicas para adolescentes grávidas?


Uma gestão não planejada, independente de ser na adolescência ou na vida adulta, traz consequências emocionais e estruturais para uma família. Com uma gestação, as meninas ou mulheres precisam, muitas vezes, interromper os estudos e os projetos profissionais, além da mudança intensa no estilo de vida após a chegada do bebê. Quando isso ocorre sem um planejamento gestacional, a mãe acaba sendo mais acometida da responsabilidade e dos impactos da gravidez e, sobretudo, do pós-parto. Pode vir a depressão pós-parto, um sentimento de rejeição em relação ao filho e de que tudo está perdido, além de uma mudança física muito grande.


Existem medidas e políticas públicas que podem diminuir a quantidade de gravidez na infância e adolescência no Brasil?


Para mudar essa realidade o caminho mais eficaz é o acesso à educação sexual, facilitando que esse conhecimento ocorra dentro das escolas e que as orientações também cheguem às famílias para saber como conversar com esses adolescentes, além de ampliar e facilitar ainda mais a disponibilidade de métodos contraceptivos. Precisamos de políticas educacionais, sem entrar no mérito de qual o momento. Tendo educação sexual, a menina vai ser capaz de compreender qual o melhor momento para ela começar a se relacionar sexualmente e fazer um planejamento familiar, além de a própria família estar junto nesse processo.


Além de tentar ampliar a prevenção da gravidez não planejada na adolescência, quais os cuidados e alertas quando ela acontece?

Nem todas as gestações de adolescentes são sem planejamentos ou elas não têm suporte da família. Pelo contrário, a gente acompanha muitas adolescentes que se envolvem muito lindamente com a gestação, com os filhos, que são abraçadas por essas famílias. Isso deve ser enfatizado também. Como é importante, quando uma criança chega ao seio de uma família, que ela seja acolhida, abraçada e que essa adolescente possa receber todo esse suporte para que tenha ganho com a chegada dessa criança, ou seja, que a criança seja um estímulo para que ela continue estudando e se projetando, para se tornar uma pessoa cada vez melhor. Por isso, deixo o meu apelo para que as adolescentes busquem o pré-natal o mais cedo possível e sigam as orientações da equipe de saúde.

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