A anúncio do Ministério do Meio Ambiente (MMA), na tarde desta sexta-feira (28/8), de que interromperia o combate ao desmatamento e às queimadas por conta de um corte orçamentário nos órgãos ambientais provocou atrito entre o ministro da pasta, Ricardo Salles, e o vice-presidente, Hamilton Mourão, coordenador do Conselho da Amazônia. Após desmentidos e rebatidas, o MMA emitiu uma segunda nota, à noite, confirmando a continuidade das operações na Amazônia e no Pantanal, biomas que contabilizam números recordes de devastação e focos de incêndios. O bate-cabeça do governo repercutiu mal entre ambientalistas.
No primeiro comunicado, o MMA anunciou que paralisaria ações de combate ao desmatamento e queimadas na próxima segunda-feira, porque a Secretaria de Orçamento Federal (SOF) do Ministério da Economia teria efetuado um corte de R$ 20,9 milhões em verbas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e de R$ 39,8 milhões do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
A nota expôs nomes e órgãos do governo. “Segundo informado ao MMA pelo secretário Esteves Colnago, do Ministério da Economia, o bloqueio atual, de cerca de R$ 60 milhões para Ibama e ICMBio, foi decidido pela Secretaria de Governo e pela Casa Civil da Presidência da República e vem a se somar à redução de outros R$ 120 milhões já previstos como corte do orçamento na área de meio ambiente para o exercício de 2021”, informou.
Após a repercussão negativa do anúncio, com notas de repúdio de várias organizações ambientalistas, Mourão desmentiu Salles e disse que as operações vão continuar. “Foi precipitação do ministro Ricardo Salles. O governo está buscando recursos para poder pagar o auxílio emergencial. Então, está tirando de todos os ministérios. Cada um oferece o que pode. Mas ,não serão bloqueados os R$ 60 milhões do Ibama e do ICMBio, que são exatamente para o combate ao desmatamento e às queimadas”, relatou.
Segundo o vice-presidente, o ministro Salles teria visto uma planilha de planejamento da SOF. “No Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira), que é o sistema onde realmente se bloqueia o recurso, está em aberto. Não está bloqueado. Então é precipitação”, reforçou.
Depois das declarações de Mourão, Salles rebateu Mourão. “Estava bloqueado e desbloquearam depois da nota”, disse, em entrevista para O Globo. Salles destacou que havia procurado a Casa Civil e o Ministério da Economia e as pastas disseram que a ordem era retirar dinheiro da fiscalização para subsidiar a criação do Pró-Brasil, programa do governo para reestruturação no pós-pandemia. “Conversei com Braga Netto (Casa Civil) e com o Ministério da Economia. É o que estava na nota. Queriam para o Pró-Brasil. Mas não pode tirar do desmatamento. Ia parar tudo na segunda-feira”, afirmou Salles.
Por fim, o MMA voltou atrás e divulgou um segundo comunicado: “O Ministério do Meio Ambiente informa que, na tarde de hoje, houve o desbloqueio financeiro dos recursos do Ibama e ICMBio e que, portanto, as operações de combate ao desmatamento ilegal e às queimadas prosseguirão normalmente.”
Fake news
O secretário executivo do Observatório do Clima (OC), Márcio Astrini, que achou que a primeira nota era fake news de “tão absurda”, levantou a possibilidade de a reviravolta ter sido proposital. “Ficou uma situação ruim para imagem do país. Salles pode ter sido precipitado, mas foi com gosto”, opinou. Conforme ele, não existe tranquilização do Mourão ao garantir recursos. “Ou o cenário é catastrófico, de paralisar as operações, ou é terrível, com uma fiscalização insuficiente que não dá resultado”, ressaltou.
Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (Inpe), entre 1º de agosto de 2019 e 31 de julho de 2020, os alertas de desmatamento na Amazônia Legal atingiram a marca dos 9.205 km², alta de 34% sobre 2019. No Pantanal, foram detectados 8.058 focos de queimadas de 1º de janeiro a 20 de agosto de 2020, aumento de 205% ante o mesmo período do ano passado.
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