As decisões anunciadas, ontem, pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), presidido pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, passaram a ser alvos de questionamentos judiciais assim que foram oficializadas. A Rede Sustentabilidade entrou com ação no Supremo Tribunal Federal (STF), com pedido para que seja declarada a inconstitucionalidade da nova resolução, de número 500. Outras medidas judiciais estão previstas, como alertou a procuradora regional da República, Fátima Aparecida de Souza Borghi, representante do Ministério Público Federal, aos membros do Conama.
Mais cedo, uma ação popular assinada pelos deputados federais Nilto Tatto (PT-SP), Enio Verri (PT-PR) e Gleisi Hoffmann (PR-PR) pedia a suspensão da reunião e de suas decisões. A Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa) também emitiu uma manifestação de repúdio contra a proposta de extinguir as resoluções ambientais. Instituição civil que reúne promotores de Justiça e procuradores da República com atuação na defesa jurídica do meio ambiente, a Abrampa afirmou que a revogação das resoluções afronta os ditames legais e “ofende o princípio do não retrocesso”.
A nova resolução aprovou a extinção de duas resoluções que delimitam as áreas de proteção permanente (APPs) de manguezais e de restingas do litoral brasileiro, o que abre espaço para especulação imobiliária nas faixas de vegetação das praias e ocupação de áreas de mangues para produção de camarão. O Conama revogou, ainda, uma resolução que exigia o licenciamento ambiental para projetos de irrigação, além de aprovar uma nova regra, para permitir que materiais de embalagens e restos de agrotóxicos possam ser queimados em fornos industriais para serem transformados em cimento, substituindo as que determinavam o devido descarte ambiental desse material.
Na ação, a Rede argumenta que houve violação aos parâmetros normativos previstos sobre o licenciamento de empreendimentos de irrigação, sobre os limites de Áreas de Preservação Permanente de reservatórios artificiais e de localidades em geral e sobre a queima de agrotóxicos e outros materiais orgânicos em fornos de cimento. O documento alerta para a “ofensa ao princípio da vedação ao retrocesso institucional e socioambiental”.
Reação na Câmara
Na Câmara, o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ) apresentou um projeto de lei legislativo, no qual também pede que a nova resolução seja sustada, para que os temas sejam analisados. “Como as revogações das referidas resoluções visam atender a setores econômicos e beneficiar empreendimentos imobiliários, faz-se necessário observar que na CF existe um entrelace da ordem econômica com o meio ambiente”.
“Com a conformação do Conama que foi instalada pelo governo Bolsonaro, o governo obteve pleno controle para passar boiadas, reduzir o rigor da legislação ambiental por meio de resoluções do conselho”, disse a ex-presidente do Ibama Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima.
Coordenadora do Movimento Mineiro pelo Direito dos Animais, Adriana Araújo classificou a decisão do Conama de “absurda”. “Assim que Jair Bolsonaro assumiu, falou que ia acabar com o Ministério do Meio Ambiente. Agora, para ter o que nós temos aí, era preferível ter acabado”, lamentou.
Em resposta à decisão do Conama, a assessoria do Greenpeace publicou nota na qual diz que “o ministro Ricardo Salles, mais uma vez, mostra que ao ser inimigo da participação social, o governo é inimigo da coletividade e que governa para os setores que mais se beneficiam em curto prazo da desregulamentação da proteção ambiental”.
Carlos Bocuhy, presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), afirmou que a resolução 303/2002 era o único instrumento jurídico capaz de proteger as restingas da construção desenfreada de resorts no litoral. “Uma vez revogada, perdemos a proteção da faixa dos 300 metros a partir da praia-mar. Isso significa um grande boom imobiliário de resorts, de empreendimentos em todo o Brasil que seriam beneficiados com esse desguarnecimento”, lamentou Bocuhy.
Pedido de afastamento
Por considerar Salles uma ameaça ao meio ambiente e um inimigo dos biomas brasileiros, o Ministério Público Federal (MPF) pediu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), também ontem, que analise um pedido de afastamento do ministro do cargo. A medida tinha sido proposta em uma ação de improbidade administrativa, apresentada em 6 de julho, na 8ª Vara Federal no Distrito Federal. Mas, até ontem, continuava sem ser analisada.
No recurso, os procuradores reforçam que “a permanência do requerido Ricardo de Aquino Salles no cargo de Ministro do Meio Ambiente tem trazido, a cada dia, consequências trágicas à proteção ambiental (...). O cenário exposto é resultado do doloso desmantelamento das estruturas de fiscalização do Ibama e das atividades do MMA, por parte do Ministro do Meio Ambiente”, salientou o MP. (Colaborou Natália Bosco)
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