Pobreza

Lentidão contra o trabalho infantil

IBGE revela uma redução de 16,8% no contingente de crianças em alguma atividade laboral — o país tem ao menos 1,8 milhão de crianças e adolescentes nessa situação. Entretanto, Brasil está longe de erradicar o problema até 2025

Bruna Pauxis* Natália Bosco*
postado em 18/12/2020 00:38
 (crédito: Reprodução/Ministério Público do Trabalho)
(crédito: Reprodução/Ministério Público do Trabalho)

O número de crianças em situação de trabalho infantil diminuiu no Brasil. Entre 2016 e 2019, o país reduziu em 16,8% o contingente de pessoas entre 5 e 17 anos que se encontravam nessa condição. Em 2019, foram registradas 1,8 milhão de crianças que desempenhavam algum tipo de trabalho. Esse contingente é inferior ao detectado em 2016, quando havia 2,1 milhões de crianças em atividades laborais.

A realidade da infância brasileira consta da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (PNAD) Contínua sobre Trabalho de Crianças e Adolescentes, feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Além da redução no contingente de crianças em regime de trabalho, o estudo identificou um recuo em termos proporcionais. A Pnad indica que, em 2016, 5,3% das crianças e adolescentes brasileiros se encontravam em situação de trabalho infantil. Em 2019, essa porcentagem caiu para 4,6%.

Apesar dos avanços, o esforço do Brasil em ajudar as crianças ainda é insuficiente. A lentidão na redução aumenta o tamanho do desafio de erradicar totalmente o trabalho infantil até 2025, conforme o compromisso com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), das Nações Unidas, firmado pelo Brasil. “Se continuar nesse ritmo de queda, o Brasil dificilmente vai conseguir chegar a 2025 com a erradicação”, afirmou Maria Cláudia Falcão, coordenadora do Programa de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, do escritório da Organização Internacional do Trabalho no Brasil.

Os dados do IBGE ainda não captam os efeitos da pandemia, mas o histórico de 2020 torna mais distante o compromisso assumido pelo Brasil. Na avaliação de Isa de Oliveira, secretária executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), a situação se agrava diante de uma tendência de redução de ações de fiscalização pelo governo federal. “O prognóstico é de retrocesso social”, disse.

A especialista ressalta que a redução do trabalho infantil foi concentrada no setor formal da economia, mas persiste no setor informal. Em 2019, havia 772 mil jovens de 16 a 17 anos com ocupações informais, considerados em situação de trabalho infantil. O problema também está associado à pobreza e à vulnerabilidade social das famílias, disse Isa. Em meio à crise causada pela pandemia, o contingente de brasileiros na pobreza diminuiu. A redução foi garantida pelo pagamento do auxílio emergencial para os trabalhadores informais mais pobres. Por isso, economistas consideram a queda transitória e insustentável. Em setembro, mês a partir do qual o auxílio passou de R$ 600 para R$ 300 por mês, a pobreza já voltou a crescer, na comparação com meses anteriores.

O gerente executivo da Fundação Abrinq, Victor Graça, ressalta as políticas públicas disponíveis para retirar as crianças da situação de trabalho. “A principal política que o Brasil tem para alcançar jovens é a Lei da Aprendizagem, onde os jovens adolescentes são chamados para o seu primeiro emprego, normalmente. Eles passam por um treinamento em uma organização e ainda estudam. É um trabalho seguro e de aprendizado que, para frente, vai servir como pontapé inicial na carreira dele”, observa Victor Graça.

Apesar das dificuldades, o especialista lembra que, há 30 anos atrás, o Brasil tinha entre 8 e 9 milhões de pessoas em situação de trabalho infantil. Ele acredita que a mudança decorre de um trabalho consistente. “Isso é fruto de várias políticas públicas e do entendimento de que é melhor a criança estar estudando do que trabalhando, particularmente em trabalhos perigosos. É muito importante manter essas políticas para tirar essas crianças do trabalho infantil”, disse.

Jornada de 40 horas
O retrato do trabalho infantil em 2019 mostra que as crianças entre 5 e 13 anos trabalhavam 14 horas por semana; aquelas entre 14 e 17 anos tinha uma jornada semanal de 15 a 24 horas; e os com idades entre 16 e 17 anos trabalhavam 40 ou mais horas.

Sobre a faixa etária, a pesquisa revela que, dentre a categoria de 5 a 13 anos, (39,2%) atuavam em atividades agrícolas. O percentual diminui nos grupos seguintes: entre 14 e 15 anos, passa a ser 29,3%; e de 16 a 17 anos a estimativa caiu para 19,3%.

Em 2019, o rendimento médio real dos jovens em situação de trabalho escravo foi estimado em R$ 503. Em média, os meninos recebiam R$ 524, enquanto as meninas ficavam com R$ 467, um valor equivalente a 87,9% do recebido pelos meninos. Entre a população branca, o rendimento médio era de R$ 559, ao passo que pretos e pardos recebiam R$ 467.

Também foi observado que as crianças em atividades consideradas perigosas recebiam 13,6% a menos do que aquelas em trabalho inofensivo. O primeiro grupo recebia uma média de R$ 467 e o segundo, por sua vez, uma média de R$ 540. (Com Agência Estado)

* Estagiárias sob supervisão de Carlos Alexandre de Souza

 

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