IMUNIZAÇÃO

Investimento do governo em campanhas de vacinação cai 36% em dois anos

Governo investe menos em campanhas nos últimos anos. Foi veiculada na semana passada primeira publicidade do governo federal em relação à vacinação contra covid-19

Sarah Teófilo
Bruna Lima
Maria Eduarda Cardim
postado em 25/01/2021 11:36 / atualizado em 25/01/2021 11:39
 (crédito: Ministério da Saúde/Reprodução)
(crédito: Ministério da Saúde/Reprodução)

Com vacinas contra covid-19 chegando, campanhas para incentivar a vacinação se tornam cada vez mais importantes. Essa movimentação, entretanto, não tem acontecido no âmbito do governo federal. O investimento em campanhas de imunização por parte da União sofreu redução no país nos últimos anos: dados solicitados por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) pela agência de dados Fiquem Sabendo, especializada no tema, mostram que em 2018, foi investido em campanhas de vacinação R$ 71,5 milhões. Em 2019, este número caiu para R$58 milhões e, no ano passado, foi para R$45,7 milhões — uma redução de 36% em dois anos.

Antes disso, os valores investidos em campanhas de imunização vinham crescendo desde 2015. Especialistas apontam que a mobilização da população aos postos de saúde é essencial para que se alcance uma imunização desejada. O Zé Gotinha, criado para a campanha de vacinação contra o vírus da poliomielite anos atrás, por exemplo, foi um sucesso. No âmbito do governo, entretanto, o presidente Jair Bolsonaro já anunciou que não irá se vacinar. O mandatário já colocou em xeque, por diversas vezes, a segurança e eficácia das vacinas contra a covid-19.

As primeiras veiculações de publicidade no governo federal na vacinação contra covid-19, começaram na semana passada, ainda tímidas, com o lançamento de um vídeo de aproximadamente um minuto cujo mote principal é: “Brasil imunizado. Somos uma só nação”.

O vídeo foi publicado na última quarta-feira, 20 de janeiro, nas redes do Ministério da Saúde, dois dias depois do início da vacinação em vários estados, e três dias depois do início da imunização em São Paulo. A data da publicação era o Dia D anunciado pelo ministro Eduardo Pazuello, como sendo o começo da vacinação.

A gravação ressalta a importância de continuar a usar a máscara e manter a higienização das mãos, enquanto a vacina não chega para todos. “O Brasil é gigante, e o desafio de vacinar os brasileiros, também. Um desafio que vai além da saúde. É uma questão humana e econômica, pois muita gente depende disso. Ninguém pode ficar para trás. É, mas com a união de todas as nossas forças, as vacinas aprovadas pela Anvisa já estão sendo distribuídas em todo o Brasil”, traz um trecho. O vídeo mostra, também, militares transportando imunizantes CoronaVac.

No Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a covid-19, divulgado pelo governo federal no fim do ano passado, constam informações sobre elaboração de campanha publicitária, pontuando que o início teria “mensagens de antecipação e preparação, passando em seguida para a próxima fase de informação à população com clareza: como, quando, onde e para quem será a primeira etapa e demais etapas”, o que não ocorreu.

“Baseada nestas premissas a campanha de Comunicação está sendo desenvolvida em duas fases: Fase 1 — Campanha de informação sobre o processo de produção e aprovação de uma vacina, com vistas a dar segurança à população em relação a eficácia do(s) imunizante(s) que o país vier a utilizar, bem como da sua capacidade operacional de distribuição. Fase 2 — Campanha de informação sobre a importância da vacinação, públicos prioritários e demais, dosagens, locais etc. Prevista para iniciar assim que tenhamos a definição das vacinas”, traz o documento.

O plano tem ainda ‘slogans’, como: “Vacina segura: é o governo federal cuidando dos brasileiros”. A mensagem principal foi a utilizada na peça publicitária divulgada: “Brasil imunizado, somos uma só nação!”

Sem incentivo

Antes da aprovação da Anvisa, o presidente vinha dizendo que fazia "pesquisas" informais na praia, na rua, que apontavam que poucas pessoas tinham a intenção de se vacinar. "Pelo que eu sei, menos da metade vai tomar vacina. E essa pesquisa que eu faço, faço na praia, faço na rua, faço em tudo quanto é lugar", afirmou no último dia 7. Diferentemente do que foi dito por ele, pesquisa Datafolha divulgada em 12 de dezembro de 2020 mostrou que 22% dos entrevistados não pretendem ser imunizados.

Apesar de bastante diferente do percentual apresentado pelo presidente, é possível perceber uma diminuição na adesão. De agosto a dezembro, o percentual de rejeição da vacina cresceu de 9% para 22%, enquanto o número de brasileiros dispostos a se vacinar caiu de 89% para 73%. Há ainda 5% que preferiram não opinar. Entre os apoiadores de Bolsonaro, a resistência é maior: 30%. O impacto disso pode ocasionar uma campanha vacinal frustrada, ainda que haja doses suficientes.

"O presidente representa um poder de enorme referenciamento no Brasil. Até nas pessoas que têm bastante confiança nas vacinas, (as falas do presidente) criam uma insegurança. Imagina o peso que tem em uma população mais frágil essa postura do presidente da República", diz o diretor científico da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, José Davi Urbaez.

O diretor frisa que as campanhas são extremamente importantes quando se pensa em vacinação, e que o governo já deveria estar promovendo-as desde o ano passado - com slogans e orientações para que as pessoas ficassem atentas para quando as vacinas fossem aprovadas.

Mesmo com os problemas, o gestor de saúde Jonas Brant acredita que, pela ampla noticiabilidade do tema, ainda há saída para uma campanha de sucesso.

"A falha foi em ter acesso às vacinas e aos insumos necessários, com perda de tempo na área de planejamento, tecnologia e relações internacionais. Mas, de maneira geral, o PNI não deve ter dificuldade em fazer a imunização da covid porque a população brasileira tem um histórico de confiança. Se tivéssemos vacinas disponíveis em quantidades desejadas, acho que o Brasil, em termos de velocidade para atingir cobertura, seria o primeiro país a conseguir fazer isso", afirma.

Professor do Departamento de Ecologia da Universidade Federal de Goiás (UFG), José Alexandre Diniz Filho frisa que a adesão popular é essencial em uma campanha para se adquirir uma imunidade de rebanho, ainda mais considerando que, com as novas variantes do vírus, será necessário que um percentual ainda maior da população se vacine.

"Sob um ponto de vista geral, o problema que estamos vendo com as vacinas é uma campanha de negacionismo e anti-vacina, em certo sentido, pelo próprio governo federal. Isso é bem estranho, para dizer o mínimo", opina.

O plano nacional prevê oferta de 354 milhões de doses de vacinas garantidas, para 2021, por meio dos acordos com a Fiocruz (254 milhões de doses), Butantan (100 milhões de doses) e Covax Facility (42,5 milhões de doses). Por enquanto, apenas 12,8 milhões de doses estão disponíveis e liberadas pela agência reguladora.

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