Coronavírus

Covid-19 no Brasil: Média móvel de 1.102 mortes iguala recorde de 2020

Nos dois primeiros meses de 2021, país registra número de óbitos tão alto quanto o verificado no pico da pandemia, em julho do ano passado. Para especialistas, o momento é mais crítico e pode piorar sem medidas para conter a transmissão e uma vacinação rápida

Maria Eduarda Cardim
postado em 15/02/2021 06:05
 (crédito: JACK GUEZ / AFP)
(crédito: JACK GUEZ / AFP)

Após vivenciar um ano de 2020 caótico por causa da pandemia da covid-19, os brasileiros não vivem um 2021 tão diferente assim. O ano, que começou com a falta de oxigênio e o colapso da rede de saúde do estado do Amazonas (AM), continua dando indícios de que a pandemia está longe do fim. Ontem, o país registrou a maior média móvel de mortes, com 1.102 óbitos, igualando a marca atingida em 25 de julho de 2020. Para especialistas, o momento é ainda mais crítico do que o vivido no último ano e pode piorar sem as medidas para conter a transmissão do vírus e uma vacinação rápida.

Segundo levantamento do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass), o Brasil confirma, em média, 1.102 óbitos por dia. A média móvel de mortes é a maior desde o início da pandemia e já foi atingida em 25 de julho do ano passado, quando o país passava pelo pico da pandemia da covid-19. As outras duas maiores médias de óbitos registradas em julho de 2020 também já foram atingidas no início deste ano (veja quadro).

“Essa média móvel de mortes só mostra para a gente que estamos em um momento muito mais crítico do que já estivemos nos últimos 12 meses. A situação é crítica e isso pode até piorar”, avalia a infectologista do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto Anna Christina Tojal. A médica acredita que isso é um reflexo do descontrole que o país apresenta em relação à infecção do novo coronavírus.

“Esse aumento de casos se deve obviamente às aglomerações. A gente não conseguiu parar a disseminação do vírus, as pessoas parecem que não acreditam na infecção e essa taxa de transmissão continua aumentando”, aponta. A última taxa de transmissão (Rt) medida por levantamento do Imperial College de Londres, estava em 1,02, ou seja, um grupo de 100 doentes é capaz de infectar outras 102 pessoas saudáveis. No mapa dos 75 países analisados pelo Imperial College, o Brasil tem a 21ª pior taxa de transmissão. O ideal é que essa taxa fique abaixo de 1.

Esse descontrole é um dos efeitos da acomodação da população com o cenário de pandemia, segundo o epidemiologista e professor em saúde coletiva da Universidade de Brasília (UnB) Jonas Brant. “Esse indicador (média móvel de mortes) mostra que a população vem começando a se acomodar com o cenário de pandemia, voltando às atividades de rotina”, aponta. Para ele, a falta de uma resposta efetiva dos governos influencia diretamente no comportamento da sociedade.

“Temos uma resposta muito pouca efetiva no que diz respeito a rastreamento de contatos, a testagem e a medidas sociais econômicas. Tudo isso leva a essa confusão e dificuldade de entendimento da mensagem pela população”, pontua.

Junto ao cenário de acomodação das pessoas perante as medidas não farmacológicas, surgem as novas variantes, que tendem a ser mais transmissíveis e letais. A lenta detecção das novas cepas pode favorecer ainda mais a transmissão do vírus. “A frequência de detecção dessas variantes, até o momento, ainda é muito limitada. Porém, espera-se que a detecção dessas variantes aumente gradualmente nas próximas semanas e meses”, diz a Organização Pan-Americana da Saúde.

Vacinação lenta

Além disso, para outros especialistas a chegada da vacina contra o novo coronavírus pode ter criado uma falsa sensação de segurança. “O governo vem vendendo a ideia de que com a vacina o problema está resolvido e não está. Porque para estar completamente imunizado você precisa tomar duas doses. As pessoas que estão tomando a primeira dose ainda podem se infectar e morrer. Então, nós precisamos manter todas as medidas de isolamento e o uso de máscara”, afirma o infectologista Leandro Machado.

O ritmo lento de imunização e a falta de vacinas não ajudam. Até o momento, apesar das promessas de novas contratações, o governo tem acordo firmado com o Instituto Butantan, com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e com a iniciativa internacional Covax Facility. “As vacinas têm mostrado, em alguns países, um efeito importante nesses grupos que estão sendo vacinados, com a queda no número de óbitos. Então, elas podem ter uma contribuição importante, mas ainda é muito cedo para ver isso no Brasil”, ressalta Jonas Brant.

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Anvisa vistoria fábricas

As fábricas de duas vacinas contra o novo coronavírus serão inspecionadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no início de março. O órgão anunciou, no sábado, que vai vistoriar as instalações de produção da Coxavin, desenvolvida por um laboratório indiano, e da Sputnik V, criada na Rússia, mas em fabricação no Brasil.

Nenhum dos dois imunizantes tem pedido para uso emergencial ou aplicação em massa no país. No entanto, a inspeção das fábricas antes do pedido formal acelera o processo de análise e de aprovação para a aplicação no Brasil.

Em relação à Coxavin, a Anvisa anunciou que a inspeção será feita entre 1º e 5 de março na instalação da Precisa Farmacêutica, representante do laboratório indiano Bharat Biotech no país. A vistoria na fábrica da União Química, parceira brasileira do Instituto Gamaleya, da Rússia, está marcada para o período de 8 a 12 de março. A fábrica da União Química fica em Guarulhos (SP).

Caso as fábricas estejam de acordo com os padrões da Anvisa, receberão o Certificado de Boas Práticas de Fabricação (CBPF). No último dia 8, a Pfizer/Biontech, pediu o CBPF para três locais de fabricação. O laboratório tem outras quatro fábricas certificadas pela Anvisa.

Atualmente, além da Pfizer, os produtores de três vacinas — AstraZeneca, Janssen e CoronaVac — têm fábricas aprovadas pela Anvisa. No entanto, somente as vacinas da AstraZeneca e CoronaVac estão com o uso emergencial liberado pelo órgão. Entre o fim de janeiro e o início de fevereiro, os produtores da AstraZeneca e da vacina da Pfizer pediram o registro definitivo à agência. (Agência Brasil)

Aglomeração em praias e bares

 (crédito: Prefeitura do Rio/Twitter)
crédito: Prefeitura do Rio/Twitter

Apesar da proibição de realização de folia em quase todo o país, entre sexta-feira e ontem, muitos brasileiros esqueceram o perigo e se arriscaram em praias, aproveitando o feriado de carnaval, mesmo com o número de mortos por coronavírus subindo. Ontem, banhistas ocuparam a praia do Leblon, no Rio de Janeiro. Em Pipa, no Rio Grande do Norte, além da areia, moradores locais e turistas tomaram as ruas. Em ambos os casos, a maioria dos presentes não usava máscara.

Também ontem, a população ocupou a areia de Capão Canoa, no litoral Norte do Rio Grande do Sul, pelo segundo dia seguido. A Praia do Rosa, em Imbituba (SC), é outra que ficou lotada. Na maioria dos casos, os presentes eram jovens e não usavam máscaras.

As aglomerações também desrespeitam uma série de decretos de prefeitos e governadores. Para se ter uma ideia, mais de 20 estados brasileiros cancelaram o feriado, de acordo com o Fórum de Governadores. A decisão dos administradores públicos foi motivada pelo aumento do número de infectados pelo novo coronavírus e do número de mortes em decorrência da doença.

Na capital carioca, a prefeitura publicou um decreto, no último dia 5, proibindo a realização e concretização de blocos de carnaval ou escolas de samba entre os dias 12 e 22 de fevereiro. Também ficou proibida a entrada de ônibus ou outros veículos fretados na região, com exceção daqueles que atendem a serviços de hotéis (com hóspedes que comprovarem reserva) e transporte regular de funcionários de empresas.

Em setembro do ano passado, a Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa) decidiu por não realizar o tradicional desfile das escolas de samba em 2021. Para tanto, a celebração foi remarcada para julho, com confirmação a depender do cenário pandêmico, mas foi novamente desmarcada por decisão do prefeito, Eduardo Paes (DEM). Já em São Paulo, o governador João Doria (PSDB) confirmou, no fim de janeiro, o cancelamento do feriado de carnaval em todo o estado.

Recomendação

Na ocasião, o secretário estadual de Desenvolvimento Regional, Marco Vinholi, informou que as prefeituras têm autonomia para tomar a decisão, mas orientou que seguissem a recomendação do governo estadual. O prefeito Bruno Covas (PSDB) atendeu a orientação e cancelou o feriado na capital paulista. Salvador (BA) também suspendeu a folia baiana enquanto não existirem condições sanitárias adequadas. A capital baiana adota o posicionamento anti-festa desde 27 de novembro. A prefeitura de Recife anunciou, na última terça-feira, o cancelamento do feriado. Em 17 de dezembro, o governo de Pernambuco já havia decretado o cancelamento em todo o estado.

O infectologista Eliseu Alves Waldman, do Departamento de Epidemiologia na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) lembra que as aglomerações e compras de fim de ano tiveram resultados ruins para o combate ao covid-19.

“Espero que as pessoas fiquem em casa e que tenham juízo, pois estamos com um número maior (de mortes) do que na primeira onda, 1,4 mil óbitos por dia. Lembrando que há variantes com maior capacidade de transmissão. Máscara nas aglomerações não vai evitar o aumento nos números de casos e de mortes. Então, minha recomendação é de que evitem a todo custo aglomerações”, recomenda.

Mesmo que o país já tenha começado a vacinar a população, Waldman é categórico: “Ainda há riscos”. Segundo ele, há falta de vacina no Brasil e um percentual pequeno da população foi vacinada. “Então, precisamos manter todos os cuidados”, pontua o especialista.

* Estagiárias sob a supervisão de Simone Kafruni

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