Politização do combate à pandemia da covid-19

Correio Braziliense
postado em 06/03/2021 22:00 / atualizado em 07/03/2021 00:07
 (crédito: Breno Esaki/Agência Saúde DF)
(crédito: Breno Esaki/Agência Saúde DF)

Além de induzir parte da sociedade brasileira a minimizar a crise sanitária vivida, a negação dos fatos comprovados pela ciência criou uma politização do combate à pandemia. “Criou-se um ambiente onde você acreditar ou não acreditar na pandemia passa a ser uma opção política. Basta ver a briga do presidente Jair Bolsonaro com o governador de São Paulo, João Doria”, aponta o diretor-geral do Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário (Cepedisa) e professor titular do Departamento de Política, Gestão e Saúde da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), Fernando Aith.

O resultado do descompasso, combinado com os efeitos da politização, trouxe um novo agravamento da pandemia, como revela estudo divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), no início do mês. “Se União, estados, Distrito Federal e municípios estivessem trabalhando de forma coesa, com objetivos e estratégias alinhados, o Brasil estaria em outra situação, com ações coordenadas nacionalmente”, comenta o coordenador-geral de pesquisa em questões regionais, urbanas e ambientais do Ipea, Bolívar Pêgo.

Os impactos negativos, no entanto, não podem ser atribuídos exclusivamente à esfera federal, uma vez que “estados e municípios também passaram a ceder diante da pressão de vários segmentos econômicos pela reabertura”, ressalta o técnico do Ipea. A desarticulação interfederativa, de acordo com a análise, fez com que o país se transformasse em “verdadeiro laboratório de testagem das estratégias protocolares”, cujos efeitos trouxeram prejuízos, especialmente para as camadas mais vulneráveis da sociedade.

Diante dos erros e suas consequências, o Brasil obteve o pior desempenho no enfrentamento à covid entre um grupo de 98 países mais afetados pela pandemia no mundo. A análise foi feita pelo centro de debates e estudos, Lowy Institute, da Austrália, baseando-se em indicadores como taxa de contágio, oferta de testes, realização de diagnóstico, total de casos e mortes pela doença e proporção populacional.

De zero a 100, a nota mais baixa foi a brasileira: 4,3. A Nova Zelândia, que obteve a melhor colocação, pontuou 94,4. “Juntos, esses indicadores apontam quão bem ou mal os países administraram a pandemia”, diz o relatório, que compilou dados ao longo de nove meses, a partir do centésimo caso confirmado no país.

"Gripezinha"

A má administração traduzida em números pelo Lowy Institute foi exemplificada de outra maneira pela organização não governamental Human Rights Watch. No relatório anual, que destaca questões raciais, ambientais, socioeconômicas e culturais com o objetivo de revisar os direitos humanos ao redor do mundo, a instituição enumera ações e condutas do líder brasileiro que influenciaram no resultado negativo do enfrentamento ao novo coronavírus.

“O presidente Bolsonaro minimizou a covid-19, a qual chamou de gripezinha; recusou-se a adotar medidas para proteger a si mesmo e as pessoas ao seu redor; disseminou informações equivocadas; e tentou impedir os governos estaduais de imporem medidas de distanciamento social”, descreve o texto.

Além disso, o relatório cita a tentativa de restrição de dados públicos sobre a situação da covid, movimentação que culminou na criação de um consórcio de imprensa para acompanhar a evolução. A ONG relembra que o mandatário “demitiu seu ministro da Saúde por defender as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), e seu substituto deixou o cargo no ministério em razão da defesa do presidente de um medicamento sem eficácia comprovada para tratar a covid-19”. (BL, MEC e ST)

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