Governo finalmente fecha com a Pfizer

Bolsonaro e ministros têm reunião com a farmacêutica para a compra de vacinas, após meses em queda de braço com a empresa, que ofereceu imunizante em agosto passado. Mudança de postura deve-se ao consórcio que estados e municípios articulam para obter imunizantes

Correio Braziliense
postado em 08/03/2021 22:56
 (crédito: Marcos Correa/PR)
(crédito: Marcos Correa/PR)

Depois de muita relutância e acusações à farmacêutica de querer jogar para o governo federal o ônus das eventuais ações judiciais relativas a efeitos colaterais, o Palácio do Planalto acertou um acordo com a Pfizer para obtenção de 14 milhões de doses da vacina contra a covid-19. De acordo com o ministro da Economia, Paulo Guedes, os imunizantes serão entregues até o mês de junho, sendo que uma remessa com 5 milhões de doses chegaria ao país antes desse prazo. A assinatura do contrato, contudo, ainda não aconteceu. A vacina é a única que possui registro definitivo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

De acordo com os dados colhidos pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), que são reproduzidos pelo Ministério da Saúde, pela primeira vez o número de mortos pela covid-19, em 24 horas, ficou abaixo de mil: 987 óbitos. O total de vidas perdidas no Brasil, porém, está em 266.398, com uma taxa de mortalidade de 126,8 por 100 mil habitantes. A taxa de letalidade no país é de 2,4%.

Depois de reunião com a cúpula mundial do laboratório, ontem, que contou com presença do presidente Jair Bolsonaro, de ministros e do CEO do laboratório, Albert Bourla, Guedes afirmou que “a vacinação em massa é a primeira prioridade do governo”. Ele acrescentou, ainda, que o governo está empenhado em “vacinar e manter a economia em movimento”.

“A solução para o Brasil é vacinar para manter imunidade da população e preservar sinais vitais da economia. O presidente da Pfizer disse que o Brasil é muito importante, são 200 milhões de brasileiros. Ele se comprometeu a olhar para essa expansão potencial e vai olhar com carinho futuros aumentos na produção do Brasil”, disse o ministro da Economia, acrescentando que a Pfizer informou ao governo brasileiro que vai aumentar a produção diária de 1,5 milhão para 5 milhões de doses.

Segundo Guedes, houve “problemas de escala” na negociação com a Pfizer. “Os dois lados demoraram um pouco com as negociações, mas temos que olhar pra frente”, completou. A decisão do governo brasileiro pela compra da vacina da Pfizer só veio semana passada, depois de meses rejeitando propostas feitas pela empresa, que foi o primeiro dos grandes laboratórios a procurar o Ministério da Saúde para oferecer o fármaco, em 2020.

Em agosto passado, o governo federal recusou uma oferta de aquisição de 70 milhões de doses do imunizante. E, em dezembro passado, em reunião com governadores, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, chegou a dizer que “se houver demanda e houver preço, nós vamos comprar” –– em resposta ao governador João Doria, sujeitando a aquisição de imunizantes à quantidade e ao valor a ser cobrado pelas doses.

A mudança de postura do governo federal deve-se ao fato de que o presidente Jair Bolsonaro ordenou a Pazuello que negocie todos os contratos possíveis para a obtenção de vacinas, antes que estados e municípios consigam formar consórcios entre eles para a obtenção de imunizantes. Ele teria sido “taxativo” na ordem que deu ao ministro, pois não admite que o governo federal perca a primazia na compra de fármacos. Nos últimos dias, Pazuello negociou contratos com a Pfizer, a Johnson & Johnson e a Moderna, que ainda não se materializaram em medicamentos.

Doses a menos
Paralelamente à reunião com a Pfizer, Pazuello garantiu que o país terá disponível entre 25 milhões e 28 milhões de dose de vacinas até o fim de março. Esse volume de imunizantes inclui as produções da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), por meio da Bio-Manguinhos, e do Instituto Butantan. O número é menor do que os 30 milhões de doses anunciados no último sábado. Quase que diariamente o governo vem reduzindo as previsões de ofertas de vacina.

A afirmação de Pazuello foi dada depois de encontro com governadores e integrantes da Fiocruz, no Rio de Janeiro. Segundo o ministro, a fundação e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estão acertando os últimos detalhes para regulamentar o processo de produção da fundação.

A meta é que a Fiocruz produza 1 milhão de doses por dia da vacina desenvolvida pela AstraZeneca e a Universidade de Oxford nas próximas duas semanas. A instituição enfrentou problemas na produção.

No encontro, também foi discutida a necessidade de se fazer um esforço diplomático para destravar a importação de vacinas da Índia e de insumos da China. Segundo representantes da Fiocruz e o governador do Piauí, Wellingon Dias, representante do Fórum dos Governadores, há muitos entraves para que o Brasil receba os imunizantes e a matéria-prima necessária, o ingrediente farmacêutico ativo (IFA), para que as vacinas possam ser produzidas no país.

Há a possibilidade de o Brasil recorrer ao Reino Unido, aos Estados Unidos e à Coreia do Sul para importar vacinas e insumos, como forma de reduzir a dependência da China e da Índia. Espera-se, ainda, que o país receba, de imediato, 2,8 milhões de doses de imunizantes da Covishield, desenvolvida pela Universidade de Oxford e pela AstraZeneca, por meio do consórcio Covax Facility, administrado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

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Lotes semanais da CoronaVac

O governador do Ceará, Camilo Santana, afirmou que o Ministério da Saúde prevê envios semanais de lotes da vacina da CoronaVac para os estados. Após reunião, ontem, com o ministro Eduardo Pazuello, a presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Nísia Trindade, e 22 governadores, ele disse que foi solicitada maior rapidez na aquisição e distribuição de vacinas às regiões. No Twitter, o governador afirmou que Pazuello garantiu “que os estados receberão novo lote da CoronaVac/Butantan na próxima quarta (amanhã)”. O ministro teria informado ainda que o novo cronograma de vacinação da Saúde “prevê envios semanais de lotes de vacinas”. Já a Fiocruz afirmou que o novo lote do imunizante da AstraZeneca deve ser remetido aos estados até 24 de março. Segundo Santana, a fundação afirmou que dará entrada hoje com a documentação na Anvisa para o registro definitivo da vacina para produção no Brasil.

Internações em UTI têm novo perfil

 (crédito: Michael Dantas/AFP)
crédito: Michael Dantas/AFP

Com o descontrole dos casos de covid-19, o Brasil vive uma mudança no perfil de internações: mais jovens (abaixo dos 60 anos) com a infecção estão sendo vistos nos leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTIs). Não há, ainda, uma questão única e certa para justificar essa alteração, mas alguns motivos apontados são a circulação de novas variantes, o aumento de casos e a maior exposição dos mais novos ao vírus.

Para o diretor científico da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, José Davi Urbaez, o vírus está diretamente ligado ao movimento das pessoas. “E a população que mais se movimenta é a mais jovem, que é também a economicamente ativa. Então, somando a uma taxa de transmissibilidade mais alta, você ampliou muito a base dos infectados”, afirmou.

Ele observou que o Brasil, além de não ter implementado um verdadeiro ‘lockdown’, não tem uma vacinação capaz de controlar a pandemia. “Estamos usando as poucas vacinas que temos para proteger os mais velhos, os trabalhadores da saúde. Mas não é uma vacinação para controlar a pandemia”, observou.

Junção de fatores
O coordenador do pronto-atendimento e da cardiologia do Hospital Sírio-Libanês em Brasília, Carlos Rassi, que atende pacientes com covid-19 em leitos de enfermaria e UTI, avalia que houve, realmente, um aumento de jovens entre pacientes nas unidades intensivas. “Realmente, é um pouco maior de pacientes jovens do que foi na primeira onda”, disse, acrescentando que o fato de os idosos estarem sendo vacinados, a explosão do número de casos e a circulação das novas variantes estariam mudando o perfil do internado.

Médica intensivista do Hospital Santa Marta, em Brasília, Adele Vasconcelos afirma que há uma alta presença de pacientes mais jovens nos últimos 15 dias nas UTIs, demandando o envolvimento de toda a equipe. “Não chegamos a ver isso na primeira onda”, diz. Além das variantes, para ela, as festas de fim de ano e o carnaval, além do fato de as pessoas terem voltado a trabalhar presencialmente, estariam por trás da mudança da faixa etária nas UTIs.

“Significa que precisamos insistir na prevenção da doença e explicar para as pessoas que o jovem também pega a doença, também fica grave. Não é uma doença que escolhe quem vai ficar grave, que atinge só os velhos. Qualquer pessoa pode ter. Tem que se educar”, observou.

 

Infectados ficam mais tempo

Além de um aumento no número de pacientes mais jovens (abaixo dos 60 anos) com covid-19 nas Unidades de Terapia Intensiva, autoridades e especialistas apontam um aumento no tempo de internação –– o que ajuda a explicar, também, a alta taxa de ocupação de UTIs que temos visto em vários estados brasileiros. Na última quarta-feira, o ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde e atual coordenador-executivo do Centro de Contingência da covid-19 em São Paulo, João Gabbardo, sugeriu que o aumento da taxa de ocupação se dá justamente pela maior quantidade de pessoas de uma faixa etária mais baixa.

“Essas pessoas conseguem resistir mais ao enfrentamento do vírus e, por consequência, ficam mais tempo internadas. Os leitos não estão rodando na mesma velocidade, e isso está ocasionando em um acúmulo de pacientes”, afirmou.

O diretor científico da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, José Davi Urbaez, afirma que a pessoa com menos de 60 anos têm mais “reserva fisiológica” para combater o vírus. Assim, o organismo consegue contornar os ataques sofridos pelo agente infeccioso, chegando a um esgotamento completo mais tardiamente –– diferentemente dos idosos, que não têm mais essa reserva.

Urbaez ressalta que se tem visto nas UTIs um aumento de cerca de cinco dias no tempo de uma internação. Segundo o médico, essa observação é inicial e pode estar relacionada ao fato de haver poucos leitos disponíveis e à demora para conseguir uma vaga. Com isso, desenvolve um quadro mais grave antes de entrar na unidade e, por isso, permanece mais tempo.

O secretário de Saúde do estado de São Paulo, Jean Gorinchteyn, disse que a pandemia retornou com “uma velocidade e uma característica clínica diferente” da primeira onda. Ele destaca que são pacientes mais jovens, muitos sem qualquer comorbidade, que chegam às unidades com uma gravidade nas condições clínicas. Conforme ressaltou, se antes 40% desses pacientes ocupavam as UTIs, e 60% estavam nas enfermarias, esse cenário se inverteu.

O tempo de permanência nas unidades também preocupa, visto que, conforme Gorinchteyn, essas pessoas mais novas passam mais tempo internadas. “Tínhamos antes média de sete a 10 dias de internação. Agora, está em 14 a 17 dias de internação, no mínimo”, explicou.

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