COVID-19

Covid-19: internações em UTI têm aumento de infectados mais jovens

Segundo especialistas, o aumento pode ser explicado por uma série de fatores, como a circulação de novas variantes, o aumento de casos, atingindo agora os jovens, e a maior exposição dos mais novos ao vírus

Sarah Teófilo
Maria Eduarda Cardim
postado em 09/03/2021 14:36
 (crédito: Breno Esaki/Divulgação/Agência Saúde)
(crédito: Breno Esaki/Divulgação/Agência Saúde)

Com aumento de casos de covid-19 e um novo recorde de óbitos da doença — 1.910, registrado na última quarta-feira (3/3) —, o Brasil vive um descontrole no âmbito da pandemia, que preocupa não só o país, como o mundo. Neste cenário, autoridades têm relatado uma mudança no perfil de internações: mais jovens (abaixo dos 60 anos) infectados estão sendo vistos com mais frequência nos leitos de unidade de terapia intensiva (UTIs). Não há, ainda, uma questão única e certa para justificar a mudança, mas alguns motivos são apresentados, como a circulação de novas variantes, o aumento de casos, atingindo agora os jovens, e a maior exposição dos mais novos ao vírus.

O coordenador do Pronto-Atendimento e da Cardiologia do Hospital Sírio-Libanês em Brasília, Carlos Rassi, atende pacientes com covid-19 em leitos de enfermaria e UTI, e avalia que houve, realmente, um ligeiro aumento de jovens entre pacientes nas UTIs. “A representatividade é um pouco maior de pacientes jovens do que foi na primeira onda”, disse. Vários motivos explicam a mudança, segundo ele.

“Não acho que seja uma coisa isolada. É possível que um somatório de fatores esteja ocorrendo”, diz, apontando o fato de os idosos estarem sendo vacinados, a explosão do número de casos (que faz com que a doença vá acometendo pacientes de faixas etárias que antes não eram muito atingidas) e a circulação das novas variantes.

Diretor científico da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, José Davi Urbaez também fala em algumas explicações para o aumento de internação de pessoas mais jovens (abaixo dos 60 anos) em UTIs. “Vírus está diretamente ligado ao movimento das pessoas. E a população que mais se movimenta são os mais jovens, que são também os economicamente ativos. Então, somando a uma taxa de transmissibilidade mais alta, você ampliou muito a base dos infectados”, afirma.

De acordo com ele, se houvesse uma mobilidade igual em todas as faixas etárias, haveria mais idosos sendo vítimas. O médico ressalta que o país está em uma linha altíssima de transmissão, sem controle da pandemia, as pessoas circulam com muita intensidade e se expõem mais. Outra suposição é a possibilidade de que essas pessoas, que se expõem mais ao vírus, possam estar com uma carga viral mais alta, o que agrava o quadro da doença, visto que quanto maior a carga viral, mais dificuldade o corpo tem para combater o vírus.

Urbaez pontua que o Brasil, além de não ter implementado medidas rígidas de circulação, como um verdadeiro ‘lockdown’, não possui uma vacinação como forma de controle de pandemia. “Estamos usando as poucas vacinas que temos para proteger os mais velhos, os trabalhadores da Saúde. Mas não é uma vacinação para controlar a pandemia”, afirma. O último ponto que, segundo o médico, ajuda a entender esse aumento de internações dos mais jovens é uma maior circulação de variantes. Ele ressalta, entretanto, que não é o ponto principal. “É muito simples culpar a variante, como se estivéssemos fazendo tudo certo e a variante estragou tudo. A variante ocorreu justamente pela circulação descontrolada das pessoas”, frisa.

Médica intensivista do Hospital Santa Marta, em Brasília, Adele Vasconcelos afirma que há uma alta demanda de pacientes mais jovens nos últimos 15 dias nas UTIs, demandando uma força-tarefa de toda a equipe. "Não chegamos a ver isso na primeira onda", diz. Para ela, o fato se explica por vários motivos, como o surgimento de variantes com maior transmissibilidade, as festas de fim de ano e o Carnaval, além do fato de as pessoas mais novas, abaixo dos 60 anos, terem voltado a trabalhar presencialmente.

"Isso só significa para nós que precisamos insistir na prevenção da doença. É explicar para as pessoas para que entendam que o jovem também pega a doença, também fica grave. Não é uma doença que escolhe quem vai ficar grave, que atinge só os velhos de forma. Qualquer pessoa pode ter a doença grave. Então, é evitar aglomerações, praticar distanciamento social, usar máscara, lavar as mãos. Tem que se educar", pontua.

Vacinação de idosos

O início da vacinação de idosos é apontado como ponto influenciador da redução no registro de casos e internações de idosos com mais de 85 anos em Pernambuco. Ao comparar o registro de casos de síndrome respiratória aguda grave (SRAG) das semanas epidemiológicas 4 (24 a 30 de janeiro) e 8 (21 a 27 de fevereiro), enquanto houve redução de 25% de infecções de idosos com mais de 85 anos, os casos de SRAG na faixa etária de 20 a 59 anos aumentaram 38%.

O secretário estadual de Saúde de Pernambuco, André Longo, explicou que, com exceção da faixa etária acima dos 85 anos, todas as outras estão com tendência de crescimento dos casos graves. Na faixa etária entre 60 e 84 anos, por exemplo, o aumento foi de 10% — ainda assim, bem menor que a alta para os pacientes entre 20 e 59 anos. No caso de solicitações por leitos de UTI, houve um aumento de pedido de vagas de 10% na última semana de fevereiro, em relação à anterior, mas com redução também de 10% das solicitações para idosos acima de 85.

Outros estados

Já no Sul do país, no Paraná, dados da Secretaria Estadual de Saúde mostram que quando o país atingiu o primeiro pico da doença, em julho do ano passado, 14,7% das internações em UTIs eram de pessoas mais novas entre 21 e 50 anos, enquanto pacientes acima de 71 anos representavam 43% do total das internações. Em fevereiro deste ano, o cenário mostra uma mudança, com uma redução da proporção de pacientes acima de 71 anos nas UTIs (34,8% do total dos internados), enquanto a proporção de pacientes mais jovens aumentou, representando 19,8% do total de internados nas UTIs.

No Rio Grande do Sul (RS), o governador Eduardo Leite (PSDB) falou sobre a percepção da mudança no perfil ao visitar dois grandes hospitais de Porto Alegre. “O contágio é altíssimo, como nunca. E o vírus, com as variantes, (está) mais agressivo. Para cada conjunto de 10 leitos são demandados cerca de 50 profissionais na equipe. Os hospitais se esforçam para abrir espaços, mas têm limites. A atenção demandada pelos pacientes covid exige absurdamente mais das equipes que o normal. Estão exaustos”, escreveu na rede social Twitter.

A Secretaria de Estado da Saúde (SES) do Amazonas aponta que se comparados os dois períodos de crescimento da curva de casos na unidade da federação, compreendendo o período de 13 de março a 30 de maio de 2020 e 13 de dezembro a 2 de fevereiro deste ano, houve um aumento na proporção de internações em leitos de UTI de homens na faixa etária de 20 a 59 anos. Atualmente, mais da metade dos homens que precisaram de internação é desta faixa etária. No ano passado, entretanto, mais de 60% dos homens que necessitavam de internação em UTI tinham 60 anos ou mais. No caso das mulheres, a faixa etária de 60 anos ou mais correspondeu a 57% das internações em 2020, enquanto neste ano o número reduziu para 51%.

Em São Paulo (SP), o assunto também foi amplamente falado no decorrer da semana. Na sexta-feira (5), o coordenador do Centro de Contigência da covid-19, Paulo Menezes, confirmou que o estado observou “um aumento importante de novas infecções principalmente entre os adultos jovens”.

No mundo

Líder técnica de resposta à covid-19 na Organização Mundial da Saúde (OMS), Maria Van Kerkhove disse, também, na última sexta-feira, em resposta ao Correio, que foi observado também em outros países um padrão de pequena mudança na faixa etária de pacientes internados “quando há ondas adicionais da infecção”. A epidemiologista pontuou que quando há relaxamento nas medidas restritivas, o primeiro grupo a sair de casa são os mais jovens, visto que são os indivíduos que voltam ao trabalho presencial, por exemplo. Com isso, há um aumento de casos e de hospitalizações.

Ela também ressaltou a relação do aumento de casos com as variantes. Segundo Maria, dentre as três variantes que estão sendo rastreadas pela OMS, está a amazonense que, conforme ressaltou, é associada ao aumento de transmissibilidade. Isso impacta diretamente no aumento de casos e no aumento de hospitalizações.

 

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