A pandemia da covid-19 continua, dia após dia, somando notificações de perdas de vidas e uma fila de pessoas infectadas à procura por atendimento hospitalar no Brasil. Com mais 3.693 mortes por covid-19 e 93.317 infecções registradas ontem, o país acumula 348.718 óbitos e 13.373.174 casos confirmados, de acordo com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass). É nesse cenário que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou não ter “vara de condão” para resolver a falta de vacinas em alguns municípios, que chegaram a paralisar a imunização contra o novo coronavírus. Ele atribuiu o problema à desorganização de governadores e prefeitos na distribuição das doses, aos atrasos na importação e à escassez global de fármacos.
“O Ministério (da Saúde) não tem vara de condão para resolver todos os problemas. A gente trabalha todos os dias para trazer alternativas para a população. Se, eventualmente, há um problema com um município, é porque essa logística precisa ser mais bem coordenada. A pasta atua em parceria com as secretarias estaduais e municipais de Saúde”, afirmou, ontem, quando foi questionado sobre a paralisação da imunização em algumas capitais.
Pouco mais da metade das doses distribuídas aos estados e municípios chegou aos brasileiros. O motivo: medo de que não haja garantia do reforço, fazendo com que os gestores locais não sigam a recomendação de liberar todo o estoque. Dos 47,5 milhões de doses entregues pelo ministério, 29,2 milhões foram aplicadas, segundo dados do Painel Covid-19 – Estatísticas do Coronavírus.
O ministro visitou as instalações da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), responsável por produzir a vacina de Oxford/AstraZeneca. Antes de ouvir as perguntas dos jornalistas, o ministro, para exemplificar a carência de imunizantes, citou o atraso nas entregas aos países que aderiram ao consórcio Covax Facility, da Organização Mundial da Saúde (OMS). “Há atrasos na entrega dessas vacinas porque é um problema mundial. Isso não é algo só do Brasil”, disse.
O Brasil recebeu pouco mais de um milhão de doses do Covax quando o esperado, para março, eram 2,9 milhões de unidades — uma redução de dois terços em relação àquilo que estava programado. A defasagem, no entanto, não foi corrigida no cronograma do ministério, atualizado pela última vez em 19 de março.
Queiroga admitiu que as mudanças no cronograma de entrega do ministério independem da vontade do governo brasileiro. Para solucionar a questão a curto prazo, a pasta conta com apoio do Itamaraty nas negociações diplomáticas. “Temos conversado diariamente com os embaixadores da China, da Índia e de outras indústrias farmacêuticas que produzem vacina para trazer uma solução dentro de um prazo mais rápido possível”, indicou.
Questionado pelo Correio sobre as atualizações nas previsões de recebimento de vacinas, o ministério respondeu que ainda não sabe se manterá as mudanças nos números à medida que os imunizantes forem chegando, pois, nos últimos meses, as frequentes projeções para baixo na quantidade disponível frustraram as expectativas.
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Brasil perde Ismael Ivo, um mestre da dança
Um dos grandes nomes da dança brasileira, o coreógrafo Ismael Ivo morreu na última quinta-feira, aos 66 anos, por complicações causadas pela covid-19. Sua importância pode ser medida pelo fato de ser classificado pela crítica especializada alemã como o Nijinsky negro — uma referência ao mestre russo do balé clássico, do começo do século passado. Seu reconhecimento começou em 1979, quando venceu o Concurso Nacional de Dança, mas foi na companhia de dança do americano Alvin Ailey que a carreira decolou. Ivo foi o primeiro diretor negro do Balé da Cidade de São Paulo.
Fiocruz produz IFA a partir de maio
Para solucionar o gargalo nos atrasos das vacinas, a autonomia de produção inteiramente nacional é peça-chave. Por isso, o Instituto Bio-Manguinhos, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), se prepara para começar a produzir o ingrediente farmacêutico ativo (IFA) da vacina de Oxford/AstraZeneca em território nacional. A expectativa é de que produza os primeiros lotes já em maio, mas, como o processo é longo e demorado, a produção de uma vacina totalmente feita no país só deve ser entregue ao Ministério da Saúde entre setembro e outubro próximos.
Ontem, o diretor do Bio-Manguinhos, Maurício Zuma, afirmou que as estruturas para a fabricação da matéria base “estão prestes a ficarem concluídas, com todos os equipamentos montados, qualificados e aguardando a visita da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que será na última semana de abril”. Na ocasião, os técnicos da autarquia farão a inspeção do local, a fim de fornecer as certificações das condições técnico-operacionais para que o Bio-Manguinhos possa começar o processo de produção.
A expectativa é de que, a partir do próximo mês, o IFA comece a ser fabricado no Brasil. No entanto, Zuma alertou que a fabricação leva tempo para ser concluída. “A produção de um lote leva, pelo menos, 45 dias e, depois, tem todo o processo de controle de qualidade e caracterização. Teremos que produzir alguns lotes para validação. É um processo longo”, explicou.
Além disso, para a vacina com IFA nacional poder ser aplicada, a Fiocruz precisa, ainda, pedir uma alteração no registro da vacina de Oxford/AstraZeneca junto à Anvisa. Segundo Zuma, a mudança é necessária, pois o registro definitivo obtido pela fundação é da vacina com IFA produzido na China.
Por isso, enquanto a vacina 100% não chega, a Fiocruz mantém o Plano Nacional de Imunização (PNI) a partir do material importado, aumentando a produção para 20 milhões de doses mensais, a partir de maio.
Ao comentar o projeto que permite às empresas comprar vacinas, mas sem repassá-las ao Sistema Único de Saúde (SUS), o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse que “desde que haja vacina suficiente, nós temos condição de imunizar toda a sociedade”. Já a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade, ponderou que, em relação às razões epidemiológicas, sua posição é pelo fortalecimento do SUS. “Há uma importância da priorização dentro de uma visão de proteção tanto individual, dos setores mais vulneráveis, quanto coletiva”, disse, acrescentando que não se opõe à contribuição privada, desde que, nesse momento, esteja disponível para todos. (BL e MEC)
“A produção de um lote leva, pelo menos, 45 dias e, depois, tem todo processo de controle de qualidade e caracterização.
É um processo longo
Maurício Zuma, diretor da Bio-Manguinhos
Protocolo para vaga em UTI
A Associação Médica Brasileira (AMB) lançou, ontem, com outras entidades que representam profissionais de diversas especialidades, um protocolo de recomendações para triagem de pacientes em cenário de falta de leitos de unidades de terapia intensiva (UTIs). São critérios para que os médicos possam definir melhor como otimizar os recursos no tratamento de pacientes com covid-19 em estado crítico. Segundo César Fernandes, presidente da entidade, o principal objetivo é “reduzir o maior número de mortes possível”.
O documento estabelece, de forma transparente, critérios éticos e técnicos. Uma das responsáveis pelo protocolo, a médica intensivista Lara Kretzer, explicou que um dos aspectos a ser considerado entre os pacientes que vão receber o tratamento intensivo está a possibilidade de recuperação. Ou seja, aquele paciente que tiver mais chances de sobreviver à doença e aos métodos de tratamento terá prioridade. É levada em conta também a gravidade dos quadros de saúde e doenças em estágio avançado que possam reduzir as possibilidades de sobrevivência. A idade não é critérios de decisão.
Os pacientes que não tiverem prioridade em casos onde há falta de recursos, segundo os protocolos, devem continuar a receber os tratamentos disponíveis, inclusive aqueles que tragam conforto caso a morte seja inevitável. As decisões devem, de acordo com as recomendações, ser anotadas nos prontuários de forma transparente.
As recomendações vêm em um período que, para as entidades, é visto como crítico. “Atingimos um patamar em que o atendimento à população não é adequado, digno e não chega a todos, como a gente vê nessas filas”, ressaltou a presidente da Associação de Medicina Intensiva Brasileira, Suzana Lobo.
A fisioterapeuta intensivista Natally Ramos, que trabalha nos hospitais São Camilo e Metropolitano, em São Paulo, explicou que as novas regulações ajudam os profissionais a direcionar os casos de cada paciente. “É fundamental nesse momento, pois estamos superlotados e carentes até mesmo de medicações fundamentais, como sedativos. A triagem não serve apenas para pacientes com covid-19, mas para outras patologias que necessitam de atenção”, explicou. (Colaborou Fernanda Strickland, estagiária sob a supervisão de Fabio Grecchi)