SOCIEDADE

Mudanças no CTB entram em vigor; especialistas dizem que conta será paga com vidas

Alterações entram em vigor a partir de hoje com regras que, para especialistas, estimulam a irresponsabilidade ao dirigir e favorecem a impunidade. Para os críticos, a conta das mudanças será paga em vidas, num país que tem um dos tráfegos mais violentos do mundo

Sarah Teófilo
postado em 12/04/2021 06:00 / atualizado em 12/04/2021 13:30
 (crédito: Minervino Júnior)
(crédito: Minervino Júnior)

Aprovadas no ano passado, no Congresso, e sancionadas pelo presidente Jair Bolsonaro em outubro, as alterações no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) entram em vigor a partir de hoje em meio ao receio de especialistas da área de que a maior flexibilização nas regras poderá causar um aumento de infrações nas ruas e estradas. O país está entre os com mais mortes no tráfego de veículos e pedestres. Para quem atua no setor, as mudanças promovem a insegurança e podem custar vidas.

Um dos alvos das maiores críticas é o aumento do limite de pontos que um condutor pode ter antes de ter a Carteira de Nacional de Habilitação (CNH) suspensa. Pelas regras antigas, era de 20 pontos e, agora, passará a ser de 40, no caso de cometimento de infrações leves, médias e graves. Mas, se o motorista cometer uma infração gravíssima, esse número cai para 30. E, se forem duas gravíssimas, volta para 20.

Coordenador do programa de mobilidade urbana do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Rafael Calabria afirma que essa alteração é, “de longe, a mais grave”, porque tem um impacto na impunidade do trânsito. “Flexibiliza para comportamentos imprudentes. Nosso trânsito é muito inseguro, é um dos que mais matam e existe uma dificuldade enorme de fiscalização”, observa.

Calabria salienta que, tecnicamente, as alterações são absurdas e giram em torno do afrouxamento de regras que envolvem a segurança de todos, e não a simplificação burocrática.

Pelo código que deixou de valer hoje, os condutores podem cometer até quatro infrações graves sem ter a carteira suspensa, mas com a mudança, esse número dobra, ampliando a possibilidade de irregularidades. Não respeitar o limite de velocidade está entre os cinco principais fatores de risco de mortes e lesões no trânsito, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU).

 

código trânsito
código trânsito (foto: CB/D.A Press )

 

Velocidade e mortes 


Coordenador da Iniciativa Bloomberg de Segurança Viária Global no Brasil, Dante Rosado frisa que a questão da velocidade é muito importante de ser observada, pois é uma das principais causas de mortes.

“Ter CNH suspensa é um elemento que colabora para que as pessoas evitem comportamento de risco. A mudança estimula que os condutores cometam mais infrações, que podem causar mais mortes”, explica.

Segundo Rosado, há pessoas que alegam que a mudança na pontuação é positiva porque entendem que algumas infrações têm a pontuação inadequada no CTB, e que esse novo limite corrige isso. Para ele, seria mais interessante revisar a pontuação de algumas violações, definindo pontos apenas para aquelas associadas ao risco de sinistros graves em vez de ampliar o número de pontos.

“Infelizmente, houve um retrocesso que não deveria ter sido admitido. Mudanças que promovem a insegurança deveriam ser rechaçadas”, afirma.

Coordenador de incidência legislativa da União dos Ciclistas do Brasil (UCB), Milvo Rossarola diz que a lei que entra em vigor hoje foi apelidada de “PL (projeto de lei) da morte” justamente por não promover ações por um trânsito mais seguro. “Priorizou a morte, a impunidade, não priorizou a vida. É um retrocesso total e absoluto. Tínhamos oportunidade de fazer avanço e, em vez disso, voltamos 30, 40 anos”, afirma. A UCB propôs oito emendas em relação aos ciclistas e conseguiu a inclusão de três.

Presidente da Frente Parlamentar em Defesa do Trânsito Seguro na Câmara, o deputado Hugo Leal (PSD-RJ), defende que o código feito ainda na década de 90 trouxe muitas inovações, mas acabou não sendo executado. “Eu prefiro, por exemplo, essa modificação de ampliação dos pontos, mas que seja efetivo, do que ter um código excepcional, mas que não é exequível”, justifica.

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