EDUCAÇÃO

Corte de verba deixa as universidades na penúria; UnB sem investimento

Redução de quase R$ 4 bilhões no Orçamento para 2021 leva instituições federais de ensino a restringir projetos de pesquisa e de assistência a estudantes carentes, entre outras atividades. A maioria já trabalhava com caixa apertado antes da pandemia

» João Vitor Tavarez* » Pedro Ícaro*
postado em 10/05/2021 06:00
 (crédito: Vinicius Cardoso/Esp. CB/D.A Press - 5/7/19)
(crédito: Vinicius Cardoso/Esp. CB/D.A Press - 5/7/19)

Após tensa negociação com o Congresso, a lei orçamentária de 2021 foi sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro, com veto de quase R$ 30 bilhões à proposta aprovada pelos parlamentares — entre cortes de emendas do Legislativo e despesas discricionárias — aquelas não obrigatórias, que o governo tem liberdade para realizar ou não. Um dos setores afetados foi a Educação, que sofreu uma redução de R$ 3,9 bilhões, o que vai apertar ainda mais o caixa de universidades e institutos federais de ensino, que já operavam com a corda no pescoço e, agora, podem ter alguns programas estudantis afetados.

Em relação ao ano passado, a redução de recursos às universidades chegou a 18% — uma queda de R$ 1,2 bilhão, segundo a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes). Além disso, foram bloqueados 13,8% do orçamento aprovado neste ano, com o congelamento de R$ 2,7 bilhões (o que representa 29,4% do total bloqueado no Orçamento, o maior percentual entre os órgãos). Neste caso, os recursos podem ser, eventualmente, desbloqueados e executados ao longo do ano. Neste cenário, apenas 40% dos recursos estão disponíveis, e os outros 60% estão condicionados a uma aprovação futura do Congresso Nacional.

As despesas discricionárias nas universidades envolvem, por exemplo, contratos como limpeza, segurança, portaria, contas de água, energia e telefonia, além do investimento em assistência estudantil e ações afirmativas.

Conforme a Andifes, a redução de verba ameaça a permanência de estudantes mais vulneráveis nas instituições de ensino. O presidente da Andifes e reitor da Universidade Federal de Goiás (UFG), Edward Madureira, já afirmou que os cortes podem provocar redução de pesquisas, atividades de ensino e ações de enfrentamento à pandemia.

Em evento na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), em 26 de abril, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, disse que o governo teve de escolher entre investir em pesquisa ou dar comida aos brasileiros. “Fomos obrigados a cortar parte do nosso orçamento, porque uma necessidade de guerra nos obrigou”, afirmou. Ao todo, o Brasil tem 69 universidades federais.

Na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o orçamento discricionário passou de R$ 639 milhões, em 2011, para R$ 299 milhões em 2021. A instituição garante que programas de auxílios estudantis não serão afetados, mas anunciou que pode fechar as portas em julho.

No último dia 29, a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e outras cinco universidades e institutos federais do estado promoveram um ato virtual em defesa da recomposição orçamentária das Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes). Houve outro ato, no último dia 5, feito pela UFPE, a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e o Instituto Federal de Pernambuco (IFPE).

De acordo com o reitor da UFPE, Alfredo Gomes, o impacto do corte será grande. “Podemos já não ter condições de pagar a assistência estudantil, especialmente o auxílio covid, a partir de junho”, afirmou. O reitor da UFRPE, Marcelo Carneiro Leão, disse que “a situação inviabiliza o funcionamento das universidades e dos institutos públicos”.

Estudantes também estão preocupados. Pedro Gonçalves, 22 anos, que cursa jornalismo na Universidade Federal do Tocantins (UFT), diz que, antes, recebia quatro auxílios estudantis — alimentação, moradia, apoio pedagógico e de saúde. Hoje, recebe apenas dois, saúde e alimentação. “Não é suficiente. Eu me mantenho por meio das bolsas que a UFT oferece. Se não fossem os benefícios e o meu estágio, não sei como estaria me sustentando, pois eu mesmo pago as despesas”, afirma.

Na região Sul, a Universidade de Santa Catarina (UFSC) reclama que “a redução no orçamento de custeio e, principalmente, de capital das instituições de ensino ao longo dos últimos anos tem sido recorrente”. Ao Correio, a universidade afirmou que, em 2015, foram destinados R$ 56 milhões para investimentos, mas o valor caiu para R$ 5 milhões no ano passado, uma redução de 91%.

“Isso nos impactou como um todo, pois já vínhamos operando com um orçamento defasado. E é preocupante, porque alguns investimentos acadêmicos, como pesquisa e infraestrutura da universidade, vão ficando para trás”, diz o secretário de Planejamento e Orçamento da UFSC, Fernando Richartz.

No Nordeste, a Universidade Federal da Bahia (UFBA) estima que os cortes serão de R$ 26,8 milhões, o que representa 16,4% a menos do que o orçamento anterior.

“Esse corte nos obrigará a diminuir a oferta de auxílios, tanto para ingresso quanto para permanência, impactando estudantes em situação de vulnerabilidade”, afirma a pró-reitora de Assistência Estudantil e Ações Afirmativas da UFBA, Cássia Maciel.

* Estagiários sob supervisão de Odail Figueiredo

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

UnB: sem investimento

No Centro-Oeste, o relatório de orçamento do Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT) aponta decréscimo no caixa de custeio das despesas da instituição. Já a Universidade de Brasília (UnB) informou que foi atingida por um corte de 100% dos recursos para investimento e de 4,6% dos recursos na fonte do Tesouro para o pagamento de despesas de custeio ou despesas discricionárias.

A UnB pontuou que trabalha para alocar os recursos de modo a trazer o mínimo impacto possível para as atividades acadêmicas e administrativas. A instituição informou, ainda, que busca, junto à Andifes e ao Congresso Nacional, “construir alternativas para recomposição do orçamento de 2021 para níveis compatíveis com leis orçamentárias (LOAs) anteriores, com pelo menos a devida atualização dos valores da inflação”.

O Instituto Federal de Brasília (IFB), por sua vez, informou que o caixa funcionou com apenas 5,5% do orçamento nos primeiros quatro meses do ano — o que levou o priorizar algumas despesas correntes (como água e energia) em detrimento de outras. O instituto informou que, graças às emendas da bancada federal, conseguiu reverter o corte de 2021, mas que os valores não estão liberados em sua totalidade.

Em nota, o Ministério da Educação (MEC) afirmou que o bloqueio de 13,8% para universidades e institutos federais “reflete exatamente o mesmo percentual aplicado sobre o total de despesas discricionárias, sem emendas discricionárias, sancionado e publicado na LOA 2021”. Em relação aos outros bloqueios, a pasta disse que “foram realizadas análises estimadas das despesas que possuem execução mais significativa apenas no segundo semestre, a fim de reduzir os impactos da execução dos programas no primeiro semestre” e que trabalha com Ministério da Economia para que as dotações sejam desbloqueadas.

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação