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Fim do regime da indústria química vai fechar 80 mil postos de trabalho

Empresas acreditam que Congresso reverterá esse desastre, que pode ainda resultar em aumento de preços de produtos essenciais, como medicamentos

Correio Braziliense
postado em 13/05/2021 12:11
Ciro Marino:
Ciro Marino: "Sem capacidade para competir, a indústria importará bens estratégicos" - (crédito: Fabio Risnic/Abiquim)

O fim do Regime Especial da Indústria Química (REIQ), previsto pela Medida Provisória 1.034/2021, levará o país a exportar empregos em vez de criá-los aqui, no entender do presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Ciro Marino. “Sem capacidade para competir, a indústria importará bens estratégicos e, assim, o Brasil garantirá empregos em outros países, mesmo tendo mais de 14 milhões de desempregados”, diz, ao participar do Correio Talks — Por que o setor químico é estratégico para o país?. Para ele, falta visão sobre a importância da indústria química brasileira, que reponde por mais de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) do setor industrial. “Estamos falando de um setor estratégico.” A perspectiva é de que o Congresso reverta a decisão do Executivo, que, se mantida, entrará em vigor a partir de julho.
De acordo com dados da Abiquim, o fim do benefício tributário, embora insuficiente para aumentar a competitividade da indústria química, poderá provocar o fechamento de mais de 80 mil postos de trabalho e ainda elevar o risco de desabastecimento de itens importantes no combate à pandemia da covid-19, como máscaras, insumos para vacinas, seringas, kits de intubação e oxigênio. O setor está na base do setor produtivo, é responsável pela fabricação de insumos e matérias-primas para os demais ramos do parque fabril.
Marino destaca ainda que, em vez de ter ganhos com o fim do incentivo, o governo perderá arrecadação. Pelos cálculos do Ministério da Economia, a previsão é de que, com a extinção do REIQ, R$ 1,2 bilhão entre nos cofres públicos todos os anos. Contudo, como se espera redução no volume de produção da indústria química da ordem de R$ 1,7 bilhão anual, as perdas em tributos chegará a R$ 500 milhões. “Portanto, estamos falando de uma medida deficitária”, afirma.
Mas não é só. Ao fazer uma comparação entre a tributação da indústria química nacional e com a estrangeira, o executivo destaca que a carga de impostos sobre os produtos nacionais é de 40% e 45%, a depender dos estados em que as fábricas estão instaladas. Já as empresas de outros países são taxadas de 20% a 25%. Ele reforça que, com o REIQ, a redução de PIS-Cofins “é pequena”, passando uma alíquota média de 9% para 3,65%. “Não resolve, mas atenua os problemas”, acrescenta.

Diagnóstico errado

Na avaliação do presidente da Abiquim, a equipe econômica está fazendo um “diagnóstico errado” da realidade da indústria brasileira e da baixa competitividade do país em relação a outras economias quando defende a abertura comercial. “A indústria química brasileira é competitiva do portão para dentro”, resume. De acordo com Marino, apesar da carga tributária pesada e do custo elevado de insumos no país, principalmente da energia elétrica e do gás natural, que tornam “gigantesca a assimetria com os fabricantes internacionais”, o setor químico do país ainda consegue ser o 6ª do mundo, com faturamento próximo de US$ 110 bilhões por ano.
Para o presidente da Abiquim, o diagnóstico dos integrantes do governo é de que a indústria brasileira não é competitiva o suficiente porque não tem sido exposta à concorrência internacional. Entretanto, as autoridades esquecem de incluir, nessa conta, as dificuldades que os empresários enfrentam para investir no Brasil e de todas as mazelas da má infraestrutura e do peso da carga tributária. “Há um ano e meio temos conversado com o governo, que não tem conseguido encontrar um argumento de convencimento e ver a importância de todas as cadeias. Quando explicamos para o Legislativo, temos mais recepção para debater sobre esse tema”, compara.
O Brasil, na avaliação de Marino, precisa de uma estratégia voltada para o desenvolvimento econômico, e isso passa pela indústria química, que tem destaque nos países ricos. Aqui, a competição acaba sendo desleal. “Estamos em uma posição infinitamente melhor do que a da Índia e, se conseguíssemos avançar, eliminando as travas, certamente estaríamos em uma situação melhor ainda”, afirma.
Marino destaca que a indústria química é fundamental, porque está presente em praticamente todas as cadeias produtivas, além de se destacar por ser um dos setores em que a remuneração é elevada. Ao reforçar a importância do setor e criticar o fim do REIQ, ele destaca que os incentivos concedidos pelos Estados Unidos ao setor são 15 vezes maiores do que os do governo brasileiro. “Todos os países grandes têm incentivo à indústria química, porque ela é estratégica e é a base das demais cadeias”, pontua.

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