EDUCAÇÃO

Frei David: "Não queremos ser superiores ao branco, queremos igualdade"

Fundador da ONG Educafro esclarece, em entrevista ao Correio, que não existe racismo reverso e afirma que o motivo para a evasão de jovens negros das universidades é a falta de assistência, como fornecimento de moradia e alimentação

Pedro Ícaro*
postado em 14/05/2021 18:51 / atualizado em 14/05/2021 18:56
 (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)
(crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)

Todo jovem formado é uma potência para melhorar o Brasil. Se você não investe em moradia e alimentação dos pobres (nas universidades), você acaba se tornando um criminoso. É o que afirma o frei David Raimundo dos Santos, fundador da organização não governamental Educafro, em entrevista ao CB.Poder desta sexta-feira (14/5). O programa é uma parceria entre o Correio Braziliense e a TV Brasília.

O presidente da ONG que já garantiu o acesso de mais de 60 mil negros no ensino superior explica que o sistema de cotas é um avanço para a rede superior de ensino. Mas ressalta que, mais necessário mais do que colocar uma pessoa negra dentro da universidade, é preciso dar assistência a ela para que permaneça na universidade.

“Antes da pandemia, de cada 100 jovens negros que entraram nas universidades com cotas 30 já haviam abandonado. E, humilhados, voltaram para suas favelas, para os seus bairros pobres, muito tristes e comunicando: ‘Infelizmente me deram a vaga, mas não me deram condições de viver’ [...] Estou denunciando aqui irmãos da União, (o presidente Jair) Bolsonaro, irmãos do MEC (Ministério da Educação). Olha só, vocês estão prostituindo os jovens rapazes e moças das universidades federais porque vocês não garantem bolsa-moradia e bolsa-alimentação. Isso é crime contra o Reino de Deus”, afirma.

Segundo o IBGE, no quarto trimestre de 2020, a taxa de desemprego de pessoas pretas foi de 17,2% enquanto a de pessoas brancas chegou a 11,5%. A taxa de desemprego média global foi de 13,9% no mesmo período, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua). O frei David Raimundo comentou os números.

“Isso se chama decisão política. Há decisão política para pegar R$ 3 bilhões e conceder para deputados comprarem tratores ou outras coisas. Tudo bem se você permite essas brechas, mas, por favor, deputados que pegaram essas emendas, por que não investem essas emendas para ajudar esse povo desempregado? No Brasil falta gerência, falta alguém com visão de futuro e de investimento para colher lá atrás e colher bons frutos”, diz.

"Racismo reverso não existe"

Para maior inclusão de pessoas negras, grandes empresas têm realizado processos seletivos especificamente para esse público, destinando vagas exclusivas a elas. Porém, lembra o frei, essa iniciativa é mal vista por alguns, principalmente pessoas brancas, que se sentem excluídas e denominam a ação como racismo reverso.

“O nome disso é uma coisa que ninguém gosta de ouvir, chama-se privilégio de ser branco na sociedade brasileira. Todos os brancos estão acostumados a ver a sociedade funcionar em função deles. Quando alguém mexe com um pequeno botão, de centenas de botões, incomoda", pontua . Ele cita, como exemplo, o episódio envolvendo a rede de lojas Magazine Luiza. "Já tinha feito uns 80 processos de seleção de trainee e em 100% dos processos de trainee só entravam brancos. Vendo aquilo, porque nós denunciamos, Magazine Luiza decidiu fazer um processo com negros, um (processo seletivo) de 80 que foram feitos só com brancos e ninguém nunca chiou. Quando faz um com negros tem essa chiadeira. [...] O que nós queremos não é ser superior ao branco, o que nós querermos é igualdade”, finaliza.

*Estagiário sob a supervisão de Andreia Castro

 

 

O presidente da ONG que já garantiu o acesso de mais de 60 mil negros no ensino superior explica que o sistema de cotas é um avanço para a rede superior de ensino. Mas ressalta que, mais necessário mais do que colocar uma pessoa negra dentro da universidade, é preciso dar assistência a ela para que permaneça na universidade.

“Antes da pandemia, de cada 100 jovens negros que entraram nas universidades com cotas 30 já haviam abandonado. E, humilhados, voltaram para suas favelas, para os seus bairros pobres, muito tristes e comunicando: ‘Infelizmente me deram a vaga, mas não me deram condições de viver’ [...] Estou denunciando aqui irmãos da União, (o presidente Jair) Bolsonaro, irmãos do MEC (Ministério da Educação). Olha só, vocês estão prostituindo os jovens rapazes e moças das universidades federais porque vocês não garantem bolsa-moradia e bolsa-alimentação. Isso é crime contra o Reino de Deus”, afirma.

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