COMUNIDADE LGBTQIA+

LGBTFobia: homem relata rotina de oito anos de agressões de vizinho

Conselheiro tutelar na Bahia, Alex decidiu denunciar idoso após o agressor tentar atropelá-lo e ameaçá-lo com um facão

Há cerca de oitos anos, o bairro de Cabula VI, em Salvador, não é mais considerado um lar seguro para o conselheiro tutelar Alex Fábio Brito, 33 anos. Desde 2013, a chegada de um novo vizinho na rua em que mora, um idoso de 65 anos na época, transformou o dia a dia de Alex. “Em qualquer lugar que ele me vê, começa a gritar dizendo ‘viadinho’ ou que eu ‘dava’. Já teve situações que desisti de fazer compras porque ele estava no mercado e começava a me atacar. Constrangedor”, conta.

Homoafetivo, Alex afirma que sempre soube que a situação se referia a um crime de LGBTFobia, mas que não denunciou o agressor por este ser idoso. “A própria família dele, três filhas, falava pra eu relevar porque ele era velho”, diz. No entanto, a situação só piorou. Em 16 de maio, o conselheiro tutelar registrou o primeiro boletim de ocorrência após o idoso tentar atropelá-lo e ameaçá-lo com um facão.

“Eu estava com uma amiga entregando cestas básicas, um trabalho social que faço, ele passou com o carro e me viu. Eu estava com uma criança de 1 ano no colo e mesmo assim ele voltou e tentou me atropelar”, lembra. Com a tentativa frustrada, o idoso saiu do carro com um facão e tentou acertar Alex. Veja o vídeo da situação (a filmagem está pixelada para preservar a identidade dos envolvidos):

O vídeo foi entregue à 11ª Delegacia de Policia de Tancredo Neves, local no qual foi registrado o boletim de ocorrência. Em 18 de maio, dois dias após a primeira denúncia, Alex sofreu uma nova agressão, desta vez do neto do idoso. Ele estava em frente a sua casa com o irmão quando o homem se aproximou, o xingou e deu um murro no rosto dele. “Eu comecei a filmar a agressão, ele derrubou meu celular e o colocou no bolso. Até hoje eu não sei onde meu telefone está”, afirma.

Narrativa de vizinhos e falta de preparo de delegacia dificulta investigação

Um novo boletim de ocorrência foi registrado, em 18 de maio, na mesma delegacia do primeiro registro, no entanto o processo ainda não teve prosseguimento. Na segunda-feira (31/5), o delegado Luis Henrique Costa ouviu, novamente, Alex e testemunhas sobre o caso, mas os agressores ainda não foram intimados.

Para Alex, a falta de uma delegacia especializada em crimes de LGBTFobia prejudica a celeridade nas investigações de denúncias como a dele. “Os policiais perguntam se não foi apenas uma briga de vizinhos, duvidam do que falamos. O delegado disse que ele chamava amigos de ‘viadinho’ mas que não era homofóbico”, revela. “A família do agressor insiste na narrativa de que foi apenas uma briga, porque sabem que o crime de LGBTFobia é inafiançável, como o de racismo”, diz.

Enquanto o processo judicial não avança, Alex tem evitado a circulação no bairro. Ele afirma que instalou câmeras de segurança na frente da casa para verificar se a família está na rua quando precisa sair. Além disso, ele sempre está acompanhado e informa, constantemente, a família sobre o paradeiro.

“Sempre falo onde estou e que se eu demorar é para verem o que aconteceu.Alguns falam pra eu sair daqui mas não deixar meus pais sozinhos. Não sabemos o que essas pessoas ruins podem fazer”, desabafa.

Denúncia promoveu rede de apoio à Alex

Apesar do momento de tensão, o conselheiro tutelar tem recebido apoio de amigos, colegas de trabalho e instituições governamentais do estado. “A Defensoria Pública e o Ministério Público estão acompanhando e cobrando a ação da polícia. O CPDD (Centro de Promoção e Defesa dos Direitos LGBT) da Bahia também me ofereceu apoio psicológico”, conta.

Ele também recebeu diversas mensagens de apoio nas redes sociais, após convocar amigos a realizarem um ato de resistência contra a LGBTFobia, evento que ocorreu na sede do CPDD em 17 de maio. “Quis reunir quem amo no Dia Mundial contra a LGBTFobia para dizer um basta a esta violência”, conta.

Alex Fabio/Divulgação - Ato de resistência contra a LGBTFobia reuniu amigos e colegas de trabalho de Alex no Centro de Promoção de Diretos LGBT da Bahia

O caso também chegou até a Assembleia Legislativa da Bahia, no qual deputados estaduais ofereceram apoio ao conselheiro. Agora, ele aproveita a visibilidade para promover melhorias para a comunidade LGBTQIA+ do estado. “Estou reunindo material e fazendo contatos para pedir ajuda aos deputados na criação de delegacias especializadas neste tipo de crime”, conta. “Estou confiante que a justiça será feita”, conclui.