Depois da cena de pessoas, no Rio de Janeiro, disputando sebo de carne e ossos na caçamba de um caminhão que recolhe restos dos açougues da cidade, outra imagem que evidencia o avanço da fome e da pobreza extrema no país correu as redes sociais nas últimas horas: a de um grupo de pessoas revolvendo a caçamba de um caminhão que recolhe lixo, em Fortaleza. A cena foi flagrada no bairro Cocó — de classe alta — pelo motorista de aplicativo, André Queiroz, que a publicou. De acordo com a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan), relativos a 2020, calcula-se que 19 milhões de brasileiros estejam em situação de fome — 9 milhões a mais que os dados coletados em 2018.
Um funcionário de um supermercado próximo, que preferiu não se identificar, afirmou que a cena acontece todas as semanas e reúne até mesmo crianças em busca de alimentos jogados fora. “É isso aí que você vê no vídeo. Dá pena ver essas pessoas nessa situação humilhante. São idosos e até crianças, algumas vezes. As crianças chegam a entrar no caminhão. Os próprios lixeiros ficam sensibilizados. Alguns chegam ajudar”, disse.
Esse mesmo funcionário explicou, ainda, que os catadores de comida começaram a ser mais frequentes desde o início da pandemia. Antes, segundo ele, eram mais comuns aqueles que buscavam material reciclável, como papelão, caixa e plástico. “Hoje, o que vemos aqui é gente atrás de se alimentar. Eles pegam tudo: hortaliças murchas, mortadela, pão vencido e frutas machucadas ou já podres. Uma cena de cortar o coração”, acrescentou.
Para o professor de Políticas Públicas do Ibmec Brasília, Eduardo Galvão, cenas como a do Rio de Janeiro e a de Fortaleza são reflexo de uma recessão econômica que já se prenunciava no início da pandemia. “Houve outros fatores que agravaram essa situação, como, por exemplo, a inflação, a perda do poder de compra, relacionado ao aumento da gasolina e ao aumento do custo da energia elétrica, , que encarecem os produtos”, explicou.
O padre Julio Lancelotti, conhecido por seu trabalho com a população de rua, afirmou que essa situação não é nova, mas piorou. “Acredito que não chegamos ainda ao fundo do poço. A situação ainda tende a piorar e o número de pessoas que vão se alimentar do lixo será cada vez maior, comprando ossos, buscando carcaças. Uma forma de superação será garantir uma renda básica para todos”, propôs.
De acordo com estudo realizado, em abril deste, ano pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede Penssam) mostrou que menos da metade dos lares no país (44,8%) têm seus moradores em situação de insegurança alimentar.
*Estagiária sob a supervisão de Fabio Grecchi
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