Dor de cabeça, dores musculares e fadiga estão entre os principais efeitos colaterais experimentados por algumas pessoas após receberem a vacina contra a covid-19, segundo os estudos até agora.
Mas até que ponto esses sintomas relativamente menores são causados pelos ingredientes das vacinas e não pela autossugestão?
Segundo um estudo da equipe do Centro Médico Diaconisa Beth Israel (BIDMC, na sigla em inglês) de Boston, associado à Faculdade de Medicina Harvard, nos Estados Unidos, até 76% dos efeitos colaterais mais comuns provocados pelas vacinas ocorrem devido ao chamado "efeito nocebo", e não à vacina propriamente dita.
O efeito nocebo é o outro lado do conhecido efeito placebo: o surgimento de sintomas secundários ou a piora de um problema médico, produzida quando o paciente recebe um tratamento que ele acredita que provocará esses efeitos colaterais, embora, na verdade, não esteja sendo administrada nenhuma substância farmacológica.
Ou seja, o efeito nocebo faz com que o paciente sofra certos sintomas somente porque sabe que pode vir a senti-los.
Esse efeito nem sempre está relacionado às próprias expectativas ou experiências negativas de cada pessoa.
Na verdade, nós podemos incorporar esse conhecimento de forma inconsciente quando vemos uma experiência ou reação negativa de outra pessoa, segundo explica à BBC News Mundo (o serviço em espanhol da BBC) Yvonne Nestoriuc, professora do Departamento de Psicologia Clínica da Universidade Helmut Schmidt, em Hamburgo, na Alemanha.
E, embora seja independente da ação farmacológica do medicamento, esse efeito pode também interagir com ela.
"Ele pode causar reações adversas novas não relacionadas ao efeito do medicamento, mas também pode fazer com que as reações adversas se intensifiquem", explica ela.
"De forma que, se você sofre uma reação local típica de uma vacina, como um inchaço ou vermelhidão no braço (na zona da injeção), isso pode ser explicado pela vacina em si, mas pode ser mais pronunciado devido às expectativas e experiências negativas anteriores", acrescenta a pesquisadora, que não participou do estudo.
Ansiedade e expectativas negativas
Depois de analisar os dados de 12 testes clínicos sobre vacinas contra a covid-19, que contaram com a participação de cerca de 22 mil pessoas, os pesquisadores atribuíram ao efeito nocebo 76% de todos os eventos adversos depois da aplicação da primeira dose e cerca de 52% após a segunda entre o público pesquisado.
Cabe esclarecer que o estudo concentrou-se nos efeitos colaterais menores e não nas raríssimas ocorrências de coágulos ou inflamações cardíacas.
Embora o efeito nocebo seja geralmente pouco conhecido, os principais fatores por trás dele são a ansiedade e o temor causado pela vacina, mas também a associação equivocada de diversos tipos de mal-estar à aplicação do imunizante.
"É necessário pesquisar muito mais a respeito, mas, se você tiver expectativas negativas e sentir-se ansioso pela vacina, é mais provável que você experimente efeitos colaterais", afirmou à BBC News Mundo Julia Haas, médica do BIDMC e coautora do estudo publicado na revista JAMA Open Network.
Como evitar o efeito nocebo
Sejam eles ou não produto da nossa imaginação - já que não há forma de distinguir a sua origem sem um exame clínico -, é importante tratar adequadamente os sintomas, descansando em caso de fadiga ou tomando um medicamento para aliviar dores de cabeça ou musculares.
Ou seja, "você deve tratá-los da mesma forma que os trataria se fossem provocados pelos produtos farmacêuticos", explica Ted Kaptchuk, especialista em pesquisas sobre o efeito placebo da Universidade Harvard e principal autor do estudo.
Haas acrescenta que, se também levarmos em conta que esses sintomas podem não ser resultado da vacina, mas sim parte das sensações de mal-estar que nos acometem de vez em quando, "poderemos lidar com eles de forma diferente para que não sejam tão preocupantes".
Mas existe algo que podemos fazer para evitar ou minimizar o efeito nocebo?
Há quem acredite que os profissionais da saúde deveriam fornecer menos informações negativas, de forma que o paciente não receba tantos elementos para antecipar-se aos efeitos adversos que possam surgir. Mas Kaptchuk e Haas defendem exatamente o contrário.
"Para começar, informar aos pacientes sobre os potenciais efeitos negativos é uma obrigação legal na maioria dos países do mundo e reduzir essa confiança é pior que comunicar os efeitos adversos", argumenta Kaptchuk.
Segundo ele, evidências indicam que ter conhecimento sobre o efeito nocebo que um tratamento pode provocar (no caso, a vacina contra a covid-19) pode ajudar a reduzir a ansiedade e, por fim, o próprio efeito.
Por isso, os pesquisadores sugerem a inclusão de informações sobre o possível efeito nocebo nos próprios panfletos ou informativos que contêm orientações sobre a vacina e seus efeitos secundários.
"É sempre melhor que os médicos forneçam informações mais honestas e em maior quantidade", afirma Haas.
"Se o público souber do que se trata, poderá reduzir a ansiedade e a preocupação com a vacina."
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