Desafios para o país e o mundo

Sistema de produção alimentar precisa ser revisto visando ao benefício da saúde humana e à preservação do planeta

Maria Eduarda Cardim
postado em 10/02/2022 00:01
 (crédito: Reprodução/Youtube)
(crédito: Reprodução/Youtube)

O caminho do alimento até a mesa do consumidor envolve muitas etapas, que vão desde a produção, o processamento e a distribuição da comida até o consumo. No Brasil, essa trajetória, também conhecida como sistema alimentar, enfrenta grandes desafios, que ficaram ainda mais evidentes durante a pandemia de covid-19. Entre os principais problemas estão um sistema agrícola em crescente desequilíbrio, o consumo de ultraprocessados e a insegurança alimentar vivida por grande parte da população brasileira.

A conclusão foi apresentada pela nutricionista e coordenadora do Programa de Alimentação Saudável e Sustentável do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Janine Coutinho, no Correio Talks Live — Sistemas Alimentares e Desenvolvimento Sustentável. Na avaliação da especialista, a forma convencional de produzir os alimentos tem sido responsável também pelo impacto nas mudanças climáticas. "Essa forma de produzir e consumir alimentos está adoecendo a população e o nosso planeta também", afirmou.

Os efeitos da forma hegemônica da produção de alimentos são vistos em nível global. Dados do Observatório do Clima, de 2019, mostram que 44% das emissões de gases do efeito estufa são provenientes do uso da terra. Solo este cada vez mais usado para a produção das commodities brasileiras. "As bases dos produtos ultraprocessados são açúcar, soja, trigo, milho, que são commodities produzidas nas grandes monoculturas", explicou Janine.

Ela alertou que o consumo de produtos ultraprocessados está relacionado com ganho de peso, diabetes, doenças cardiovasculares, depressão e outras doenças. "As evidências de todos os malefícios do consumo desses produtos são muito robustas", pontuou. Por isso, a nutricionista vê a taxação de ultraprocessados com uma boa proposta para barrar o consumo desses produtos no país.

"Existem estudos em outros países mostrando o efeito positivo da taxação. Então, em princípio, acho que essa é uma boa proposta para ser pensada e elaborada como um projeto de lei", avaliou.

Insegurança alimentar

Ainda que o agronegócio bata recordes de produção, o Brasil vive uma situação catastrófica em relação à segurança alimentar. Dados de uma pesquisa conduzida pela Rede Penssan apontaram que 116 milhões de brasileiros vivem em algum nível de insegurança. "O problema é mais grave nas áreas rurais. A fome atinge 14,3% dos agricultores familiares, sendo que 65,2% desta categoria apresenta algum nível de insegurança alimentar", ressaltou Janine.

Paradoxalmente, a insegurança alimentar presente em 55,2% dos domicílios brasileiros aumenta as chances de que as crianças que vivem nesses lares desenvolvam obesidade, por exemplo. "Pesquisas indicam que uma criança que tem privação de alimentos, é desnutrida, é uma criança que tem mais chance de desenvolver obesidade e doenças crônicas quando adulta", afirmou.

Equilíbrio

A busca por um equilíbrio dos sistemas alimentares passa por diversas áreas e, por isso, o Idec, em conjunto com alguns especialistas, lançará em breve o documento Agenda para ação, que traz recomendações nas diversas dimensões do sistema alimentar. Na primeira dimensão, o Idec propõe a criação de modelos de negócios que priorizem as necessidades de abastecimento do mercado interno e valorizem a agricultura familiar.

Na segunda dimensão, que aborda o abastecimento e a demanda, o instituto sugere a desoneração tributária para produção e comercialização de alimentos básicos in natura e a criação de uma política nacional de abastecimento alimentar, articulada com estados e municípios. Na terceira dimensão, o foco deve ser no sistema de produção agroecológico, garantindo alimentos que permitam a regeneração dos recursos naturais e também em uma política nacional de redução do uso de agrotóxicos.

Na quarta dimensão, o objetivo é promover a saúde, com a coibição de publicidade de alimentos, taxação de bebidas açucaradas e proteção da venda de ultraprocessados no ambiente escolar. "Ações de educação alimentar e nutricional são fundamentais, mas não são suficientes e precisam estar articuladas com medidas regulatórias", pontuou Janine. Na última e quinta dimensão, o instituto diz que é preciso retomar e fortalecer a governança de Segurança Alimentar e Nutricional.

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