Crime

Mãe e filhos são mantidos em cárcere por 17 anos no RJ

Luiz Antonio Silva aprisionou a família dentro de casa, em Guaratiba. Dois jovens adultos pareciam crianças de tão desnutridos

Fernanda Strickland
postado em 30/07/2022 06:00
Ao entrarem na casa onde a mulher e os filhos estavam cativos, encontraram as camas sujas em que ficavam amarrados e repletas de trapos -  (crédito: PMRJ/AFP)
Ao entrarem na casa onde a mulher e os filhos estavam cativos, encontraram as camas sujas em que ficavam amarrados e repletas de trapos - (crédito: PMRJ/AFP)

A Polícia Militar do Rio de Janeiro prendeu, na última quinta-feira, Luiz Antonio Santos Silva por manter, por 17 anos, a mulher e dois filhos em cárcere privado, numa casa em estado precário de conservação, em Guaratiba, Zona Oeste do Rio de Janeiro (RJ). As vítimas viviam em meio a sujeira e foram encontradas desnutridas e desidratadas. O homem era conhecido na vizinhança pelo apelido de "DJ", pois, habitualmente, colocava música em altos volumes para abafar as agressões físicas que praticava e, também, pedidos de socorro.

Os agentes do 27º BPM chegaram à casa por meio de uma denúncia anônima e resgataram a mãe e os filhos. Em depoimento aos investigadores da 43ª delegacia de Polícia Civil, a mulher de Luiz Antonio relatou que ele sempre a ameaçava e dizia que "se você for embora, só sai daqui morta".

No depoimento, a mulher pediu medida protetiva para ela e os dois filhos. Vivendo com o agressor há 23 anos, contou, ainda, que durante esses 17 anos em que foi mantida cativa, tentou se separar de Luiz Antonio várias vezes, mas a tortura psicológica e as agressões que praticava a deixavam com medo.

Ela disse também que os filhos, um rapaz de 19 e uma jovem de 22 anos, eram acorrentados e amarrados, e jamais frequentaram a escola por proibição de Luiz Antonio. Relatou, ainda, que chegavam a ficar três dias sem se alimentar.

Ao serem levados para atendimento no Hospital Municipal Rocha Faria, em Campo Grande — também na Zona Oeste carioca —, vizinhos ficaram chocados ao verem os dois, que, apesar de serem adultos, aparentavam serem crianças em torno dos 10 anos de idade. Além disso, estavam tão enfraquecidos que mal conseguiam se manter de pé.

"Vimos o estado das duas crianças que saíram daqui. Mais uma semana e acho que não iriam sobreviver. Ela (a mãe) está sem conseguir falar, se expressar, até pela fraqueza", disse uma mulher que acompanhou o resgate.

Advertências

A violência de Luiz Antonio contra a própria família era conhecida dos vizinhos, que, conforme disseram, alertaram o conselho tutelar para a situação dos jovens. Também denunciaram as condições em que os quatro viviam, mas as autoridades não tomaram qualquer providência.

Para tentar diminuir a brutalidade a que eram submetidos, a mulher e os dois filhos eram alimentados sem que Luiz Antonio soubesse. Mesmo assim continuavam famintos. "A menina pegou uma banana e comeu com casca e tudo. Ela estava com muita fome", disse um vizinho, que ofereceu a fruta no momento em que os jovens eram levados para o Rocha Faria.

Segundo outro homem que morava próximo, Luiz Antonio não era conhecido apenas por colocar a música em altos volumes, mas, também, por intimidar a vizinhança. "É um cara forte, fala grosso. Simplesmente ficava aí dentro, ligava o som alto. Tinha uma aparelhagem grande aí dentro, parece que para abafar o que estava acontecendo. Sabia que tinha duas crianças, mas nunca as vi. Fui vê-las com o Samu", contou.

Estado precário

A saúde da mulher e dos dois jovens é considerado delicado, embora estável. A Secretaria Municipal de Saúde, por meio de nota divulgada ontem, destacou que "os três pacientes apresentam quadro de desidratação e desnutrição grave". "Eles já foram estabilizados e estão recebendo todos os cuidados clínicos necessários, além do acompanhamento dos serviços social e de saúde mental", informou a pasta. Os três também estão sendo acompanhados por representantes dos serviços social e de saúde mental do município.

Se for considerado culpado pela Justiça, Luiz Antonio responderá por sequestro ou cárcere privado, crime de tortura, vias de fato e maus-tratos. O inquérito sobre o caso deve ser encerrado em 10 dias.

 

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