PROPILENOGLICOL

Substância que matou cães tem uso investigado em produtos para humanos

Ao Estado de Minas, Anvisa confirmou ter identificado fábricas voltadas para consumo humano que teriam comprado composto de lotes apontados como contaminados

Clara Mariz - Estado de Minas
postado em 13/09/2022 23:34
 (crédito: Gladyston/EM/D.A Press)
(crédito: Gladyston/EM/D.A Press)

Indústrias que podem fabricar produtos destinados ao consumo de seres humanos foram notificadas por suspeita de comprar propilenoglicol que estaria contaminado com monoetilenoglicol, substância tóxica para pessoas e animais. A Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) confirma que identificou empresas que teriam recebidos lotes do composto apontado como contaminado, que pode ter já matado cerca de 50 cães em todo o território nacional.

Em nota exclusiva enviada ao Estado de Minas, a agência informou que a investigação ainda está em curso e visa determinar se as fabricantes receberam, de fato, a substância, e se os produtos destinados a uso humano foram produzidos com a matéria-prima contaminada.

"A Anvisa enviou notificações às empresas, solicitando informações e documentos que comprovem a destinação dada ao propilenoglicol dos lotes contaminados. A Agência também solicitou às vigilâncias sanitárias locais o apoio para este levantamento", diz comuniocado oficial.

Resolução do órgão já proibiu a comercialização, distribuição, manipulação e uso de dois lotes do propilenoglicol, vendidos pela indústria Tecno Clean Industrial Ltda., que tem filial em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A medida também determinou o recolhimento dos lotes AD5035C22 e AD4055C21 da substância.

No texto, a Anvisa explica que as medidas foram tomadas após investigações conduzidas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) identificarem o uso do composto contaminado nos casos de intoxicação de cachorros que ingeriram petiscos da fabricante Bassar Pet Food.

  • 07/09/2022 Crédito: Arquivo Pessoal. 20 tutores relatam mortes de cachorros em São Paulo após comerem petiscos da marca Bassar; Procon notifica empresa. Arquivo Pessoal

Fonte de contaminação

Na tarde desta terça-feira (13/9) a reportagem tentou contato com a Tecno Clean Industrial para que se manifestasse sobre o assunto, mas foi informada de que o expediente na fábrica já havia sido encerrado. Já na última quinta-feira (8/9), o Estado de Minas esteve na filial da empresa para tentar contato com algum responsável. Porém, a indústria não quis gravar entrevista e se posicionou por meio de declaração, que foi entregue pelo porteiro do complexo industrial onde está instalada.

Conforme o texto, o produto apontado como contaminado foi comprado de uma terceira fabricante, de São Paulo. “Cumpre salientar que a Tecno Clean Industrial Ltda. não fabrica propilenoglicol, apenas tendo comprado da empresa A & D Química Comércio Eireli, que é importador, e revendeu ao mercado nacional como apenas distribuidor”, afirmou a empresa.

Procurada, a Prefeitura de Contagem informou que, a pedido da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), esteve na filial da empresa instalada no município, onde constatou que o local não fabrica propilenoglicol, alvo da investigação. A administração acrescentou que não foram identificadas irregularidades no local.

Propilenoglicol

De acordo com o Mapa, o propilenoglicol está aprovado para uso, sendo seguro para as espécies animais de produção e de companhia, não sendo indicado apenas para gatos. O composto também é aprovado para emprego ns indústrias farmacêuticos e alimentícia voltadas para humanos, o que amplia a preocupação com a possível contaminação de alimentos e remédios.

No caso dos alimentos para consumo animal, o composto é usado como umectante. Já na indústria para uso humano o químico serve como espessante e conservante.

Animais contaminados

Na última atualização da Polícia Civil de Minas, 54 cães morreram em 11 estados brasileiros após a ingestão de petiscos supostamente contaminados da empresa Bassar Pet Food. Em nota, a corporação afirmou que 15 cachorros morreram em Minas Gerais. Doze casos ocorreram em Belo Horizonte, um em Piumhi, e os outros dois em Uberlândia.

  • Mallu (foto) morreu em 6 de setembro após comer petisco contaminado. Cerca de 50 cães morreram após ingerirem petiscos supostamente contaminados por monoetilienoglicol Arquivo Pessoal)
  • 07/09/2022 Crédito: Arquivo Pessoal. 20 tutores relatam mortes de cachorros em São Paulo após comerem petiscos da marca Bassar; Procon notifica empresa. Nick. Arquivo Pessoal
  • Zeca, buldogue francês de oito anos, morreu no início de agosto em São Paulo: intoxicação ocorre principalmente em cães de pequeno porte Arquivo Pessoal
  • 07/09/2022 Crédito: Arquivo Pessoal. 20 tutores relatam mortes de cachorros em São Paulo após comerem petiscos da marca Bassar; Procon notifica empresa. Vira-lata Mel segue internada desde o dia 27 de agosto Arquivo Pessoal
  • 07/09/2022 Crédito: Arquivo Pessoal. 20 tutores relatam mortes de cachorros em São Paulo após comerem petiscos da marca Bassar; Procon notifica empresa. Arquivo Pessoal

A princípio, dois produtos haviam sido identificados com suspeita de contaminação: o Every Day sabor fígado (lote 3554) e o Dental Care (lote 3467). Entre os principais sintomas identificados nos relatos estão convulsões, vômito, diarreia e prostração.

Em nota, a Bassar anunciou um recall de seus produtos. A fabricante solicitou aos consumidores que entreguem no local de venda os itens que já tenham adquirido anteriormente. A empresa confirmou o uso do propilenoglicol e informou que “investigações oficiais” ainda estão sendo feitas em todo o processo de produção e maquinários de sua planta fabril.

Na última sexta-feira (2/9) a perícia da Polícia Civil de Minas Gerais confirmou que um dos produtos da empresa estava contaminado com a substância tóxica. A corporação ainda não informou o resultado dos demais testes ou qual produto testou positivo para contaminação por monoetilenoglicol.

Caso Backer

A intoxicação dos cães por monoetilenoglicol tem paralelo com das contaminações de 29 pessoas, parte delas pela mesma substância, em caso que veio a público nos primeiros dias de 2020. Na época, dez pessoas morreram por complicações renais após consumirem a cerveja Belohorizontina, da cervejaria Backer. Foi indentificado nesse episódio ainda a contaminação pelo dietilenoglicol, também tóxico.

Quando ingerido, o monoetilenoglicol pode provocar intoxicação, com sintomas como insuficiência renal e problemas neurológicos. Na fábrica de cerveja, a substância contaminada era usada para agilizar o processo de resfriamento da bebida, mas não deveria ter contato direto com o líquido.

Segundo as investigações, a contaminação das cervejas por monoetilenoglicol e dietilenoglicol ocorreu devido a um vazamento no tanque da fábrica. Em outubro daquele mesmo ano, 11 pessoas foram denunciadas pelo Ministério Público.

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