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Educação sexual: diálogos contra a gravidez na adolescência

Última reportagem da série mostra como educação sexual e planejamento de vida têm contribuído na formação de jovens. Especialistas cobram política pública

Ana Raquel Lelles - Estado de Minas
postado em 31/10/2022 16:48 / atualizado em 17/07/2023 10:53
Podcast 'Antes da Hora' -  (crédito: Reprodução/Spotfy)
Podcast 'Antes da Hora' - (crédito: Reprodução/Spotfy)

Educação sexual, planejamento de vida e diálogo sobre autoestima e autocuidado com o jovem são formas de combater a gravidez na adolescência, explicam especialistas. Nesta última reportagem da série especial "Antes da Hora", do Estado de Minas, mostramos como a educação e o diálogo são a base dessa luta e também contribuem para a formação fomentar o desejo de crescer na vida de jovens.

A média de idade para a vida sexual no Brasil é de 14 anos. "Nada impede da garota engravide na primeira relação", afirma a ginecologista e obstetra Ligia Santos, que é assessora da Área Técnica da Saúde da População Negra da Prefeitura de São Paulo. Este foi o caso da jornalista e escritora Renata Veneri, que engravidou do primeiro namorado aos 14 anos. A história dela foi o foco do quarto episódio do podcast "Antes da Hora".

A médica explica que os jovens têm acesso a preservativos e outros métodos contraceptivos. Mas, a falta de negociação com o parceiro faz com que, muitas vezes, o adolescente tenha uma relação sexual sem proteção, o que pode resultar em uma gravidez ou infecções. "A questão da educação sexual não é só usar camisinha. É mostrar para o jovem que ele pode fazer escolhas", afirma.

Especialistas dizem que a principal solução para essa questão sociocultural seria trabalhar a autoestima e amor próprio do jovem. Assim, teriam mais argumentos para resistir às pressões externas e negociar uma relação sexual segura. Para fazer isso, deve-se conversar abertamente com o adolescênte: sem tabus, julgamentos ou imposições.

"O diálogo faz com que o adolescente tenha mais noção do limite. No caso das meninas, já que a gente foca a questão reprodutiva nas meninas, você empodera a mulher para saber a forma com que ela quer lidar com a gravidez ou não", diz a médica. Ela explica que a educação sexual também incentiva a garota a procurar anticoncepcionais, como pílulas ou o DIU, que é colocado gratuitamente pelo Sistema de Saúde Único (SUS) para garotas a partir dos 14 anos ou quando a menstruação se regulariza.

'Alfabetização de emoções'

A estratégia do diálogo como forma de combater a gravidez na adolescência tem resultados em São Paulo com o trabalho da ‘Casa do Adolescênte’, organizado pela ginecologista Albertina Duarte. A médica conta que de 1998 até 2022, a gestação jovem caiu 69%.

 

O colégio Dr. Edélzio, lar do projeto Bebê a Bordo, em Sergipe
O colégio Dr. Edélzio, lar do projeto Bebê a Bordo, em Sergipe (foto: Ana Raquel Lelles/EM/D.A Press)

Ela defende o que chama de "alfabetização de emoções", que é a educação sexual dos jovens e o empoderamento por meio do autoconhecimento e amor próprio. A médica completa que o governo deve criar medidas para promover este diálogo. "Seja nas escolas ou nos espaços de saúde, temos que discutir a ‘vacinação’ contra a baixa estima, agressões e outras violências", disse.

A ginecologista Ligia Santos diz que a sociedade deveria pressionar os políticos que estão no poder para criar esse espaço de conversa com adolescentes. "O governo tem que se apropriar dessa responsabilidade e tem que treinar. Saúde não é só não ficar doente, é bem-estar. Bem-estar é um conjunto de família e governo. O governo vai fazer a parte dele, com treinamento de pessoas e leis, mas nada impede a família de participar também", comenta.

"Minha mãe não estudava por causa do meu pai"

A gestação no Brasil está concentrada nas cortes mais baixas, conforme Júnia Quiroga, assistente representante do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA). Cerca de 40% dos nascidos vivos brasileiros em 2021 eram filhos de mães de até 24 anos, sendo que o percentual de até 19 anos foi de 14% dos bebês. O problema é que muitas dessas gestações não são planejadas, conforme explica Júnia Quiroga, representante do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) no Brasil.

Júnia diz que a mudança na perspectiva de futuro dessas mães afeta diretamente a decisão de continuar ou não os estudos, trazendo consequências nas perspectivas socioeconômica da família. Caso a adolescente seja de classe social baixa, a criança pode entrar num ciclo de pobreza, que é quando os pais não conseguem dispor de ferramentas para os filhos ascenderem de classe social e ter melhor qualidade de vida.

Nascimentos de mães adolescentes (2021)*

O Centro de Excelência Dr. Edelzio Vieira de Melo, em Santa Rosa de Lima (SE), oferece aos estudantes aulas de projeto de vida, disciplina do Ensino Médio Integral para a qual os professores recebem qualificação especial. A professora Nadja Rezende diz que a iniciativa é valorizada pelos alunos, que sempre fazem questão de participar.

"Minha mãe não estudava por causa do meu pai"

"É uma disciplina em que os professores ajudam a entender quem é você. O primeiro passo é entender quem você é, para depois ir para o projeto profissional. Se um aluno já tem a ideia do profissional, que ele tenha as bases, as teorias para concretizar. Se ele não tiver, que ele tenha força para sonhar. Mas não só sonhar, mas que ele tenha as ferramentas para fazer o sonho se tornar realidade", explica Nadja.

Quando criança, a estudante Édila Araújo, hoje aos 18 anos, frequentou o colégio Dr. Edélzio com a mãe, que engravidou antes de concluir os estudos. Atualmente, elas têm um diálogo aberto dentro de casa, o que facilitou as escolhas de vida de Édila e abriu caminho para a jovem seguir seus planos de cursar uma universidade. Crescer na sala de aula com a mãe estudando deu mais forças para a jovem. "Antigamente, minha mãe não estudava por causa do meu pai, que não queria que ela estudasse. Eu via o esforço que ela fazia."

Professores são referência de diálogo

O colégio de Santa Rosa de Lima é a casa do projeto Bebê a Bordo, criado em 2019 pela professora Gleide Leandro e que acolhe mães adolescentes e os filhos para a sala de aula. Iniciativa que tem evitado casos de evasão escolar. Além disso, a escola é um ponto de referência e segurança para outros estudantes que querem um futuro mais próspero do que o dos seus pais. Édila não pensa em ser mãe por enquanto e casos como o dela entre as alunas do Dr. Edélzio têm sido mais comuns.

O professor Alex de Jesus, que dá aulas de biologia na escola da cidade, afirma que conversas sobre sexualidade não devem ser feitas para gerar medo nos jovens. "As pessoas têm essa cultura de falar que vai pegar uma doença e morrer. Mas é melhor sempre conversar e explicar do que os jovens fazerem a coisa errada", diz.

Aluna do terceiro ano do Dr. Edélzio, Emily Félix é uma das estudantes que elogiam o diálogo mantido na escola com os professores. "Acho essa liberdade tão ‘um máximo’, porque eu vejo que em outros lugares não tem isso. É só uma relação professor e aluno. Aqui a gente tem essa relação de amizade", comenta. Ela e um grupo de colegas está com um projeto para que a escola distribua nos banheiros absorventes e preservativos.

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  • A professora Nadja Rezende, do Centro de Excelência Dr. Edélzio Vieira de Melo
    A professora Nadja Rezende, do Centro de Excelência Dr. Edélzio Vieira de Melo Foto: Ana Raquel Lelles/EM/D.A Press
  • O colégio Dr. Edélzio, lar do projeto Bebê a Bordo, em Sergipe
    O colégio Dr. Edélzio, lar do projeto Bebê a Bordo, em Sergipe Foto: Ana Raquel Lelles/EM/D.A Press
  • O colégio Dr. Edélzio, lar do projeto Bebê a Bordo, em Sergipe
    O colégio Dr. Edélzio, lar do projeto Bebê a Bordo, em Sergipe Foto: Ana Raquel Lelles/EM/D.A Press
  • Dados preliminares
    Dados preliminares Foto: Ministério da Saúde
  • Podcast 'Antes da Hora'
    Podcast 'Antes da Hora' Foto: Reprodução/Spotfy
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