Tragédia

Federação Israelita condena ataques em escolas no Espírito Santo

Adolescente autor dos atentados em Aracruz responderá por ato infracional análogo a quatro homicídios qualificados

Fernanda Strickland
postado em 27/11/2022 06:00
Professora Flávia Amboss Merçon Leonardo, 38 anos, morreu ontem. As outras vítimas são Selena Zagrillo, 12 anos, Maria da Penha Banhos, 48 anos, e Cybelle Bezerra, 45 -  (crédito: Reprodução / TV Gazeta)
Professora Flávia Amboss Merçon Leonardo, 38 anos, morreu ontem. As outras vítimas são Selena Zagrillo, 12 anos, Maria da Penha Banhos, 48 anos, e Cybelle Bezerra, 45 - (crédito: Reprodução / TV Gazeta)

A Federação Israelita do Estado do Rio de Janeiro (Fierj) divulgou, no sábado (26/11), uma nota de pesar às vítimas, citando que "o discurso de ódio, a apologia ao nazismo e o recrutamento de jovens em células nazistas devem ser combatidos pelo Estado brasileiro, pois não estamos tratando de fatos isolados".

O pai do autor do atentado afirmou que o adolescente fez "algo terrível" e que vai pedir desculpas às famílias das vítimas em "momento oportuno". "Meu filho cometeu algo terrível, que nunca poderia ao menos imaginar", comentou ele, que é tenente da Polícia Militar capixaba. O governo confirmou que o jovem usou no ataque duas armas pertencentes ao pai, uma delas de propriedade da PM.

O oficial havia publicado nas redes sociais uma foto da capa do livro Minha Luta, em que Adolf Hitler expôs suas ideias antissemitas. A publicação gerou debates com pessoas associando o pai à ação do filho, já que o adolescente portava uma peça com emblemas nazistas. Ele não quis comentar como o filho teve acesso à sua arma e ao carro da família e pediu para que a dor dele fosse respeitada.

Para a Fierj, é necessário um planejamento de ações e recursos para apoiar investigações que venham desmantelar as células nazistas, identificar quem as financia e punir os responsáveis. "Para tanto, precisam trabalhar, conjuntamente, as autoridades de segurança dos três entes federados, Ministério Público e Judiciário", diz o texto. "Apologia ao nazismo, no Brasil, é crime e deve ser tratada como tal. O atentado de Aracruz não pode ficar impune e nem ser esquecido", finaliza a nota, assinada por Alberto David Klein, presidente da Fierj.

Professora é a quarta vítima morta 

A Secretaria Estadual da Educação do Espírito Santo confirmou, ontem, a morte de mais uma vítima dos ataques a escolas do distrito de Coqueiral, no município de Aracruz, na sexta-feira. Com isso, subiu para quatro o número de mortos nos atentados. A Polícia Civil do Espírito Santo divulgou que o autor dos disparos, um jovem de 16 anos, deverá responder por ato infracional correspondente aos crimes de 9 tentativas de homicídio qualificada e quatro homicídios qualificados, todos com o agravante de por motivo fútil e com impossibilidade de defesa da vítima.

Ainda de acordo com a polícia, o suspeito foi encaminhado ao Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo, em Cariacica, na Grande Vitória. As armas apreendidas foram encaminhadas para o setor do Departamento de Criminalística, juntamente com as munições.

A quarta vítima é a professora Flávia Amboss Merçon Leonardo, de 38 anos. A identidade foi anunciada pelo governador do estado, Renato Casagrande. Na postagem, ele manifestou solidariedade aos familiares e amigos da docente. Além de Flávia, morreram nos ataques a estudante Selena Zagrillo, 12 anos, e as professoras Maria da Penha Pereira de Melo Banhos, 48 anos, conhecida como Peinha, e Cybelle Passos Bezerra, 45 anos.

Uma das vítimas do atentado, de 58 anos, passou por cirurgia no Hospital Estadual de Urgência Emergência da capital do estado e permanece estável. Ainda havia outras cinco internadas até o fechamento desta edição, duas em estado grave. Uma delas é um garoto de 14 anos, que teve perfurações na barriga, a outra, uma adolescente, também de 14, que levou um tiro na cabeça e está entubada.

A apuração da Polícia Civil do estado mostrou que o autor do ataque usou a arma do pai, um policial militar. "Segundo informações preliminares, obtidas por imagens, o criminoso estava sozinho e arrombou um cadeado para entrar na primeira escola. Próxima ao acesso dos professores. Ele teve acesso direto à sala, no momento do intervalo, e assim surpreendeu e vitimou os professores", afirmou o secretário de Segurança Pública e Defesa Social do Estado, coronel Márcio Celante.

Professora da Escola Estadual Primo Bitti, Flávia Amboss Merçon Leonardo estava internada no Hospital Estadual Dr. Jayme dos Santos Neves, na Serra. A confirmação da morte ocorreu ontem à tarde. Ela deixa três filhos.

Comoção

Desde a noite da sexta-feira, flores e velas são deixadas na porta da Escola Primo Bitti, primeiro local invadido pelo atirador, no pacato bairro de Coqueiral de Aracruz. Os sentimentos de tristeza e indignação eram um lugar comum entre os presentes e a comunidade ao longo do sábado. Logo na chegada à cidade, era possível ver a fila de carros que se formava em frente à capela que abrigava o velório da estudante Selena Sagrillo. Entre os muitos presentes, chamou a atenção a quantidade de adolescentes vestindo roupas pretas e acompanhados de seus pais.

Uma delas, Maria Eduarda Oliveira, 11 anos, era amiga e colega de classe e contou como tudo ocorreu. "Eu estava em uma sala embaixo de onde o assassino estava. Ouvi o barulho dos tiros, olhei e vi o assassino. Uma das coordenadoras que estava comigo também foi ver o que era e voltou correndo, com cara de assustada, e levou a gente com pressa para um clube vizinho da escola. Fiquei com muito medo e não quero mais voltar", comentou ao lado da mãe, Renata Curto, 47 anos.

Os ataques

O atirador chegou à Escola Estadual de Ensino Médio Primo Bitti, onde estudou até junho, por volta das 9h30 de sexta-feira. Segundo imagens das câmeras de segurança, ele usava uma roupa camuflada, um capuz e uma máscara de caveira. Armado com uma pistola, o adolescente tinha carregadores de munição e, ao invadir a escola, atirou várias vezes, no pátio. Depois, dirigiu-se à sala dos professores, onde fez mais disparos.

Em seguida, o atirador entrou em um Renault Duster dourado e foi em direção a uma segunda escola, desta vez particular. No local, ele se dirigiu ao segundo andar do prédio, entrou em uma das salas de aula e começou a atirar em alunos que estavam próximos à entrada.

O atirador deixou o local no mesmo carro, que estava com a placa parcialmente encoberta, mas com os números finais aparentes. Foi por meio deles que a polícia encontrou a placa completa e o endereço do autor. Ele foi preso em casa quatro horas depois dos ataques. 

 

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