Carregar o smartphone na mão, até mesmo em trajetos curtos, tornou-se um comportamento quase automático em ambientes urbanos. Esse gesto, aparentemente simples, está cada vez mais associado a padrões de ansiedade, necessidade de hiperconectividade e mudanças na forma como a mente organiza a atenção.
Por que o hábito de levar o celular na mão é tão comum
Uma das explicações mais citadas por especialistas é a sensação de segurança psicológica que o smartphone oferece. Ter o aparelho ao alcance imediato pode transmitir a ideia de estar preparado para qualquer contato, emergência ou interação social, funcionando como um objeto de conforto em meio ao fluxo intenso da cidade.
Do ponto de vista psicológico, esse comportamento se relaciona a fenômenos como o FOMO (medo de perder algo importante) e a nomofobia, o desconforto diante da possibilidade de ficar sem o telefone. Em 2025, esses quadros são observados tanto em adolescentes quanto em adultos, especialmente entre quem depende do celular para trabalho, estudo ou socialização diária.
A discussão ganhou voz nas redes sociais, e o especialista Rafael Gratta, no vídeo abaixo publicado no seu perfil @rafaelgrattap, explicou sobre a necessidade de sempre chegar o celular:
@rafaelgrattap A disponibilidade e recompensa intermitente do celular torna ele um grande “sugador” da sua energia e atenção. Não é que seja ruim, mas vamos usar as redes sociais de forma consciente e orientada aos nossos objetivos e felicidade. Mais Foco Menos Ansiedade 🙏🏽 #saúdemental #ansiedade #dopamina #celular ♬ som original – Rafael Gratta
Como o celular atua como filtro social no dia a dia
Outro elemento relevante é o papel do celular como filtro social. Em trajetos a pé, filas ou transportes públicos, muitas pessoas mantêm o smartphone na mão para evitar contato visual, conversas inesperadas ou situações interpretadas como desconfortáveis, usando a tela como proteção simbólica.
Assim, o aparelho funciona como uma espécie de “escudo” social, normalizando um tipo de isolamento silencioso em espaços compartilhados. Para alguns, isso reduz o estresse de interações indesejadas; para outros, pode aumentar a sensação de solidão e dificultar a construção de vínculos presenciais significativos.
Como a hiperconectividade altera a atenção ao caminhar
A palavra-chave principal nesse contexto é hiperconectividade, que descreve a conexão constante com fluxos digitais de informação. Pesquisas em psicologia cognitiva indicam que o consumo contínuo de notificações, mensagens curtas e conteúdos rápidos treina o cérebro a buscar estímulos breves e frequentes, reduzindo a tolerância ao tédio (Rosen et al., 2013).
Estudos internacionais em comportamento digital mostram uma redução significativa na duração da atenção focada. Em vez de minutos dedicados a uma mesma tarefa, o tempo médio se aproxima de segundos, interrompido por checagens constantes de aplicativos e redes sociais, o que afeta até atividades simples como caminhar e observar o entorno.
Principais mudanças na atenção associadas ao uso do smartphone
Essas transformações da atenção se manifestam em situações cotidianas, especialmente quando o celular está sempre à mão. A mente passa a alternar entre o ambiente físico e o digital, criando um estado de alerta contínuo que impacta a concentração e a percepção de riscos ao se deslocar pela cidade.
- Dificuldade em manter foco contínuo em atividades simples, como caminhar, conversar ou esperar;
- Aumento da multitarefa, alternando rapidamente entre o ambiente físico e a tela;
- Sensação de urgência constante diante de alertas sonoros ou visuais;
- Queda na percepção do entorno, com menor atenção a sinais de trânsito, obstáculos e outras pessoas.
De que forma levar o celular na mão muda a forma de caminhar
Pesquisas sobre marcha humana mostram que caminhar com o smartphone na mão, especialmente quando está em uso, altera o ritmo natural do corpo. Estudos com pedestres indicam que, ao digitar mensagens ou consultar aplicativos durante o deslocamento, as pessoas tendem a reduzir a velocidade, encurtar os passos e desviar mais da trajetória prevista.
Mesmo quando o aparelho não está sendo usado ativamente, apenas segurá-lo já interfere no balanceio dos braços. Esse movimento contribui para o equilíbrio corporal, para a estabilidade e para a eficiência da caminhada, de modo que sua restrição pode modificar a postura, o gasto de energia e o padrão de locomoção em espaços urbanos cheios.
Quais efeitos na marcha e na segurança dos pedestres
Alguns efeitos observados em quem anda com o celular na mão incluem alterações na coordenação motora e aumento de pequenos incidentes diários. Em ambientes movimentados, esse comportamento individual pode se ampliar, afetando o fluxo coletivo de pessoas e a segurança nas travessias.
- Redução da velocidade de marcha, especialmente em vias movimentadas;
- Menor oscilação dos braços, afetando o equilíbrio natural;
- Desvios frequentes da rota, com zigue-zagues ou paradas bruscas;
- Aumento de riscos de esbarrões, tropeços e distrações perto de cruzamentos.
Qual é a relação entre ansiedade dependência e uso constante do smartphone
Manter o celular permanentemente à vista costuma estar associado a um vínculo emocional intenso com o dispositivo. Pesquisas recentes com jovens adultos identificam correlação entre uso intensivo, altos níveis de nomofobia e sintomas de ansiedade, como inquietação, dificuldade de relaxar e necessidade de checar o aparelho repetidas vezes ao dia.
A dependência tecnológica não se resume ao tempo de tela, mas à função que o smartphone cumpre na regulação do humor e da sensação de controle. Para muitas pessoas, o aparelho funciona como uma “âncora” de previsibilidade em meio a rotinas aceleradas, o que pode dificultar momentos de descanso, prejudicar o sono e fragmentar conversas presenciais.

Como o estado de alerta digital afeta o bem-estar mental
Relatórios recentes em saúde mental destacam que a hiperconectividade pode manter o cérebro em estado de alerta prolongado. A expectativa de novas mensagens, chamadas ou atualizações reduz as oportunidades de pausa mental, mantendo a mente sempre parcialmente ligada ao fluxo digital.
Essa vigilância constante interfere na percepção de tempo livre, na capacidade de relaxamento profundo e na qualidade das interações face a face. Com menos intervalos de silêncio e introspecção, torna-se mais difícil reconhecer sinais de cansaço, ansiedade e sobrecarga associados ao uso contínuo do smartphone.
Como incentivar um uso mais consciente do celular ao caminhar
Especialistas em comportamento digital sugerem estratégias simples para diminuir a dependência sem abandonar os benefícios do smartphone. O foco principal é recuperar espaços de atenção plena no dia a dia, especialmente em atividades rotineiras, como caminhar até o trabalho, ir ao mercado ou circular pela cidade.
Entre as medidas mais mencionadas estão ações práticas que ajudam a criar novas rotinas com o aparelho. Essas escolhas não exigem abandono total da tecnologia, mas propõem um uso mais intencional e alinhado à saúde física e mental.
- Guardar o celular no bolso ou na bolsa durante trajetos curtos, evitando segurá-lo sem necessidade;
- Revisar notificações e manter ativas apenas as realmente importantes, reduzindo interrupções constantes;
- Estabelecer momentos sem tela em passeios, refeições, encontros ou pausas no trabalho;
- Praticar caminhadas conscientes, observando paisagens, sons, respiração e postura corporal.
Como criar novos hábitos e equilibrar tecnologia e presença
Algumas pessoas também adotam pequenos acordos pessoais, como checar o celular somente em pontos específicos do trajeto ou após determinados intervalos de tempo. Outros preferem usar recursos do próprio sistema operacional, como relatórios semanais de uso, modos de concentração e limites de tempo para aplicativos mais consumidos.
Ao longo do tempo, essas práticas podem contribuir para uma relação mais equilibrada com a tecnologia. Caminhar sem o smartphone na mão deixa de ser um gesto incomum e volta a ser um momento simples de contato com o ambiente, com o próprio corpo e com o ritmo real da cidade, fortalecendo a sensação de presença e autonomia.
Referências bibliográficas
- ROSEN, L. D.; LIM, A.; CARRIER, L.; CHEEVER, N. An empirical examination of the influences of media multitasking on attention and task performance. Computers in Human Behavior, v. 29, p. 159–168, 2013.










