Revisar o celular a cada poucos minutos se tornou um gesto comum no dia a dia. Mesmo sem notificações novas, muitas pessoas desbloqueiam a tela quase no automático, em casa, no trabalho ou no transporte público. A psicologia tem se dedicado a entender esse comportamento, que vai além de um simples hábito tecnológico e pode envolver ansiedade, necessidade de contato constante e até medo de ficar desconectado, como indicam estudos sobre redes sociais de Kuss e Griffiths (2017).
O que significa checar o celular a cada 5 minutos
Para a psicologia, revisar o celular o tempo todo costuma indicar uma combinação de fatores emocionais e comportamentais. Em alguns casos, há um medo de perder informações importantes; em outros, a busca é por estímulos rápidos que aliviem o tédio ou a tensão, sinalizando uma dificuldade de lidar com o vazio e com momentos de pausa.
Uma das explicações mais citadas é o chamado medo de desconexão, conhecido como nomofobia, um receio desproporcional de ficar sem acesso ao aparelho, à internet ou aos aplicativos que organizam a rotina. Em situações mais intensas, a pessoa pode apresentar irritabilidade, queda de concentração e até sintomas físicos, como sudorese e taquicardia, quando percebe que está sem o celular ou sem sinal.
Para aprofundarmos no tema, trouxemos o vídeo do especialista Rafael Gratta:
@rafaelgrattap A disponibilidade e recompensa intermitente do celular torna ele um grande “sugador” da sua energia e atenção. Não é que seja ruim, mas vamos usar as redes sociais de forma consciente e orientada aos nossos objetivos e felicidade. Mais Foco Menos Ansiedade 🙏🏽 #saúdemental #ansiedade #dopamina #celular ♬ som original – Rafael Gratta
Por que o smartphone parece uma extensão da identidade
O smartphone deixou de ser apenas um aparelho para fazer ligações e passou a concentrar funções de agenda, câmera, banco, entretenimento e redes sociais. Assim, é compreendido não só como ferramenta de trabalho, mas também como companhia, fonte de informação e espaço de interação social, gerando sensação de segurança quando está por perto e desconforto quando não está à mão.
Em contextos clínicos, muitos pacientes relatam que “se sentem nus” sem o celular, o que mostra como o aparelho se integra à identidade e ao senso de controle do cotidiano. Pesquisas sobre sites de redes sociais indicam que a forma de construir e manter a autoimagem on-line reforça a ideia de que o celular é uma extensão do self, pois é por meio dele que se acessam curtidas, comentários e sinais de aprovação social.
Por que o cérebro se acostuma a olhar o smartphone o tempo todo
Cada sinal sonoro, vibração ou ícone de notificação funciona como um pequeno convite ao cérebro. Quando chega uma mensagem ou um “like”, ocorre liberação de substâncias ligadas ao sistema de recompensa, reforçando o comportamento de desbloquear o aparelho repetidamente, até que a simples expectativa de algo novo já basta para acionar o gesto automático de conferir o celular.
Além disso, muitas pessoas utilizam o smartphone como forma de evitar situações desconfortáveis, como filas, ambientes silenciosos, conversas difíceis ou pensamentos desagradáveis. Nesses momentos, o aparelho age como um “amortecedor emocional” ou uma “muleta emocional”, reduzindo a chance de desenvolver estratégias internas de autorregulação, como respiração, reflexão ou diálogo, e aproximando esse uso de um padrão de dependência comportamental.
Alguns dos fatores emocionais mais comuns que alimentam esse padrão podem ser observados em situações do dia a dia e ajudam a entender por que o gesto de pegar o celular se torna quase automático:
- Aborrecimento: o celular entra como resposta rápida ao tédio.
- Ansiedade: olhar a tela reduz, por alguns instantes, a inquietação interna.
- Rotina: o gesto se repete tanto que vira reflexo, sem decisão consciente.
Como diferenciar dependência, uso excessivo e vício em aplicativos
Especialistas diferenciam uso intenso de dependência: passar muitas horas por dia com o celular em mãos não significa, por si só, um quadro de vício. O sinal de alerta aparece quando a pessoa sente mal-estar ao ficar sem o aparelho, perde o foco em atividades importantes ou deixa de cumprir responsabilidades porque não consegue se desconectar das telas.
Estudos recentes destacam que, na maioria dos casos, a dependência não é do aparelho em si, mas dos aplicativos, como redes sociais, jogos on-line e serviços de mensagens, projetados para manter atenção com rolagem infinita e conteúdos personalizados. Kuss e Griffiths (2017) mostram que, quando essas plataformas são usadas compulsivamente para suprir necessidades de afeto, reconhecimento e distração de problemas pessoais, o padrão pode se aproximar de outras dependências comportamentais, especialmente quando surgem prejuízos no sono, no estudo, no trabalho e nas relações presenciais.
- Pensamentos frequentes sobre o que está acontecendo no celular.
- Dificuldade de ficar desconectado, mesmo por períodos curtos.
- Uso do aparelho para lidar com tristeza, solidão ou irritação.
- Prejuízo no sono, nos estudos, no trabalho ou nas relações presenciais.

Por que esse comportamento de checar o celular se tornou tão comum hoje
O aumento do hábito de conferir o celular a todo momento está ligado a mudanças culturais e tecnológicas das últimas décadas. Crianças e adolescentes entram em contato com telas cada vez mais cedo, muitas vezes entre 10 e 14 anos ou antes, tornando o smartphone um elemento central de socialização, lazer e construção de identidade, enquanto atividades sem tela se tornam menos frequentes.
Outro fator é a cultura da imediatidade: mensagens são respondidas em segundos, notícias chegam em tempo real e muitos serviços funcionam 24 horas por dia. Sem uma educação emocional que ajude a lidar com frustrações e silêncios, períodos offline passam a ser vistos como estranhos ou incômodos, e o celular vira um recurso constante de fuga e preenchimento de qualquer intervalo.
- Entrada precoce no mundo digital e menos tempo em atividades sem tela.
- Pressão social para estar sempre acessível e atualizado.
- Pouca discussão sobre limites saudáveis no uso da tecnologia.
- Famílias que também passam muitas horas conectadas, reforçando o modelo.
Como usar o celular com equilíbrio sem ser controlado por ele
Diante desse cenário, psicólogos e educadores destacam a importância de estabelecer limites claros e desenvolver uma relação mais consciente com o smartphone. Pausas planejadas, horários específicos para checar mensagens e momentos do dia sem tela — como durante refeições ou antes de dormir — podem reduzir a necessidade de olhar o aparelho a todo instante e fortalecer a percepção de autonomia diante da tecnologia.
Outro ponto relevante é o acompanhamento familiar, especialmente na infância e adolescência, com conversas francas sobre redes, acordos de tempo de tela e valorização de atividades off-line como fatores de proteção. Em casos de sofrimento intenso ou prejuízos significativos, o acompanhamento psicológico pode ajudar a identificar as necessidades psicológicas por trás das checagens constantes e construir estratégias mais saudáveis de relação com o mundo digital, baseadas em intervenções psicoeducativas e técnicas de autorregulação emocional.
Referências bibliográficas
BILLIEUX, J. et al. Can disordered mobile phone use be considered a behavioral addiction? Current Addiction Reports, [s. l.], v. 2, n. 2, p. 156-162, 2015.
KUSS, D. J.; GRIFFITHS, M. D. Social networking sites and addiction. International Journal of Environmental Research and Public Health, 2017.










